Fechar
Buscar no Site

Um rigor diferenciado

Por: Chico Viana (médico e vereador de São Luís)

O que está ocorrendo em São Luís com a rede de emergência pública municipal é mais que estarrecedor, como definiu o vereador Gutemberg Araújo, é inacreditável.

Já se sabe que os hospitais são carentes, locupletados, enfim estão longe de serem instituições-modelo, diria mesmo que funcionam no limite entre o razoável e o impossível de alcançarem seus objetivos, mas funcionam, eis a questão.

Nesta precariedade, porém vão cumprindo sua obrigação, que é de devolver a saúde ao cidadão que, em tempos de crise, não necessita de muito para tal. Sem exageros posso afirmar que a maioria dos casos dos que procuram os hospitais de emergência, uma equipe de saúde e medicamentos, não tantos assim, resolveria em uma barraca de lona, ou debaixo de uma mangueira. Claro que ninguém quer isso, não se aceita, nem espera que chegue a isso, mas serve para deixar patente que, em situação de extrema gravidade, a hotelaria e outros meios assessórios, nem por isso dispensáveis, possam se sobrepor em função do objetivo maior, tratar doentes.

Agora vejam os leitores.

O Ministério Público Estadual, por meio da Procuradoria dos Direitos da Saúde decidiu interditar o Hospital da Criança que divide com o Hospital Materno-Infantil a responsabilidade do atendimento médico de emergência da capital, ainda provendo todo interior do Estado, já que Pronto-Socorro Pediátrico mesmo, funcionando 24 horas por dia, nem um dos 216 municípios restantes dispõe. O hospital já atendeu este ano 20.440 pacientes, 5.000 pacientes mês. Ainda no período, internou 815 pacientes, dos quais, pasmem, 291 provenientes do interior do estado.

Os motivos? Nenhum relacionado ao envolvimento direto de profissionais, ou a carência de meios para viabilizar o atendimento. Começa por odores estranhos, passa por acomodação do lixo, apontam canos oxidados, piso rachado, problemas com instalação elétrica, drenagem, deficiência de local para vestuário de funcionários e bem, bom, chega até a falta de tampa de bueiro e mato em volta do hospital. Repetindo, não se fala em falta de medicamento, de profissionais de saúde, de alimentos, enfim, aventaram a parte cosmética, necessária sim, mas não imprescindível, para uma casa de saúde. Mesmo assim, foi interditada.

A Secretaria informa que 90% dos defeitos apontados pelo Ministério Público em visitas anteriores, já haviam sido solucionados, e estes que a Vigilância do Estado tão ciosa e prontamente apontou agora, poderiam ser resolvido com o hospital funcionando.

Na década de 80, por exemplo, fui Diretor do Hospital Geral, recebido do governo anterior, este sim, em estado de sucata, faltava tudo, até ratos comiam dedos de pacientes em coma. Uma calamidade! Pois bem, foi feita uma reforma que só preservou as duas centenárias paredes ligadas por óleo de balela com quase dois metros de largura, que delimitavam o prédio. Mudou-se tudo. Assoalho de sequer um dia. Será que estas deficiências apontadas pela autoridade, não poderiam ser sanadas com o hospital funcionando? Claro que poderia.

A gente pode parecer paranoico, mas alguma coisa de estranho está acontecendo nisso tudo. Leio nos jornais que, o atendimento médico de emergência em hospitais particulares chega até oito horas de espera. Tenho conhecimento também que o Centro Médico Maranhense e o Hospital Aliança, deixaram de atender crianças. A UDI e o Hospital São Domingos, pelo que me informaram, nunca atenderam emergência nesta faixa etária. Então, meu Deus como é que pode simplesmente interditar um hospital único e vital, com uma facilidade com que se tranca uma porta? Para onde estes doentes irão ou foram?

Estranho, muito estranho, esta mania que já virou rotina de intolerância com hospitais do município, e a completa omissão quando outros hospitais igualmente únicos e imprescindíveis, como o Hospital Getúlio Vargas para aidéticos e tuberculosos, o PAM Diamante com sua demanda de 800 pacientes /dia, o PAM da Cidade Operária, o Hospital da Vila Luizão, hoje reduzido a uns poucos e aleatórios atendimentos ambulatoriais, fecham. O próprio Hospital do Ipem que está reformado e equipado com o que há de mais moderno no ramo, e só ficou assim depois de ser afanado dos seus legítimos donos, os Servidores, por meio de um arrendamento fajuto. Muito estranho, repito o alheamento das autoridades sobre casos tão graves.

Situação difícil, amigos. Não seria tão difícil assim se as motivações fossem técnicas e se fosse tomado como referência o mal maior. E que o problema da saúde fosse tratado por quem entende de doença.

Só falta agora, interditarem os ‘socorrões’, aí talvez a sociedade protetora dos animais nos socorra, afinal homem também é bicho. Ou pelo menos está sendo tratado como tal.

O conteúdo deste blog é livre e seus editores não têm ressalvas na reprodução do conteúdo em outros canais, desde que dados os devidos créditos.

mais / Postagens