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Transferência de culpa

Editorial do Jornal Pequeno

Apenas pensar a possibilidade de que um advogado possa ter coagido seu cliente a confessar um crime que não cometeu, sacrifica todos os postulados da ética na Justiça, mais especificamente no exercício da advocacia. No caso da surpreendente “confissão” do vigilante João José Nascimento Gomes, assumindo a autoria do bárbaro assassinato do advogado Brunno Eduardo Matos Soares, parece que estamos diante da mais absurda e cruel trama forjada nos autos de um inquérito policial.

A ser verdade o que conta a imprensa sobre este caso, e que a todos até o momento parece incontestável, anteciparam a autoria do crime para alguém com muito menos capacidade de defesa, no fim de livrar da merecida prisão o verdadeiro assassino. Forjaram a confissão de um inocente para que alguém preso sob visível efeito de alucinógenos, o senhor Marão, encontrasse meios de driblar a Justiça e escapar aos rigores da lei. Pior é que não há, neste caso, sequer um conflito de interesses, mas pura e simplesmente uma inusitada transferência de culpa, quem sabe em nome da tradição familiar e da impunidade vocacionada àqueles que têm dinheiro e poder.

Nem é preciso ter acesso ao inquérito e, menos ainda, compulsar os autos. A crueldade deste ato, o de mandar deliberadamente um inocente para a cadeia, fere todos os ideais erigidos em nome da Justiça, extrapola toda lógica dos princípios jurídicos para se transformar num crime tão hediondo quanto o que o verdadeiro assassino cometeu. É, pelo menos à primeira vista, uma modalidade de corrupção que transcende o poder público e aniquilia todas as prerrogativas das instituições; algo que ofende a sociedade na mesma proporção do sinistro que no dia 5 de outubro ceifou a vida de Brunno Matos no momento da comemoração de uma vitória eleitoral.

Nem se trata de mera fraude processual; é mais que isso: é a figura tipificada do patrocínio infiel ou, mais ainda, do patrocínio criminoso, além de evidente traição ao dever profissional. Ademais, o advogado Adihah Martões Rodrigues Neto ainda recebeu de seu infeliz cliente a quantia de R$ 4.900!

E fica-se a pensar em quantos crimes como este possam ter sido cometidos em nome da Justiça, em quantos inocentes possam estar na prisão porque seus advogados tergiversaram, sucumbiram e amiudaram a nobreza de suas missões.

Até onde se sabe, João José Nascimento Gomes não está em filmagem nenhuma, nem existem testemunhas que o tenham visto matar. Um inquérito policial forjado pode induzir a erro a Justiça, fulminar a presunção de inocência e, por conseqüência, destruir vidas e eliminar direitos.

O Poder Judiciário do Maranhão, a OAB e o Ministério Público precisam cuidar de punir exemplarmente a atuação deste advogado, pois mesmo que João José Nascimento Gomes fosse culpado – e todos os fatos indicam que não o é – não teria direito o causídico de afogar a ética profissional e assassinar a lei.

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