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Tem estudante que faz crítica – a nova campanha publicitária do Uniceuma é preconceituosa e equivocada

É fato que vivemos em uma ‘civilização da imagem’ e ela tem o poder de nos manipular. Alguns estudiosos dizem que nunca teremos certeza de que aquilo que compreendemos de uma imagem corresponde às intenções do autor, mas nem por isso devemos nos proibir de interpretá-la, pois nela estão contidos códigos que podem zombar de nossa ingenuidade. Não existe imagem ‘natural’, toda imagem é artificial e modelada segundo certas intenções.

Sendo assim, aproveitamos para comentar a mais nova campanha publicitária do Centro Universitário do Maranhão – Uniceuma, que merece ressalvas por transmitir mensagem dúbia e tendenciosa e talvez não tenha um resultado positivo para a instituição. A referida campanha veiculada, sobretudo em out doors e na TV, apela para o sentido polivalente dos seus estudantes, com slogans do tipo: ‘Tem bailarina que faz Direito’, ‘Tem músico que faz Arquitetura’, ‘Tem fotógrafo que faz Administração’, ‘Tem artista plástica que faz Nutrição’, etc. sempre precedidos pela frase chave: ‘O Uniceuma tem o seu perfil’. Diante disso, nós do Grupo de Estudos da Imagem da Ufma, fazemos algumas observações:

Charge: Marrapá

Primeiro: Haja vista que a maioria das primeiras ocupações sugeridas são do campo artístico (bailarina, artista plástico, fotógrafo), parece ter sido intencional o uso dessas profissões. É certo que o capitalismo pós-moderno valoriza profissionais versáteis, que não se prendem uma só área de conhecimento, ou seja, pessoas interdisciplinadas. No entanto, neste caso a maioria de ‘artistas’ nos causou incômodo. Qual a verdadeira intenção da campanha ao sugerir que profissionais já estabelecidos no campo da arte, optem por um curso superior no Uniceuma? No nível subliminar a campanha parece afirmar o fracasso das profissões artísticas, o que tornaria conveniente e quase obrigatório ao profissional da arte ter uma segunda carreira, em outro campo de atividade, mesmo que este nada tenha a ver com o campo das humanidades e das sensibilidades. Parece ainda que só os ‘artistas’ fracassam e tem de recorrer a outras profissões. A campanha reforça a idéia de que ‘arte não dá dinheiro’ e que este tipo de profissão não tem como suprir as necessidades vitais. A arte deve permanecer como ‘passatempo’, ‘hobby’ ou ‘diletantismo’.

Segundo: Porque será que as profissões artísticas foram escolhidas para fazer esta comparação desmerecedora? É certo que vicemos em uma cidade que pouco conhece e valoriza a arte. Conhecemos um tanto de folclore, artesanato e manifestações populares – aliás, muito bem representadas – mas pouco sabemos de dança, de arte contemporânea, de cultura digital aplicada à arte. Ainda encaramos arte como coisa de ‘talento’, ‘dom divino’, ‘capricho pessoal’, nada que possa realmente alavancar a trajetória pessoal de um jovem. Ainda valorizamos as carreiras ‘tradicionais’ como direito, engenharia, medicina, mesmo sabendo que elas estão em plena decadência, com salários e condições de trabalho em queda vertiginosa há anos. A escolha do campo artístico para efetuar tal comparação carrega consigo um juízo de valor, qual seja, de que ‘arte’ ainda é menor que a ‘ciência’, que a carreira artística não tem seriedade e deve no máximo correr em paralelo com outra carreira ‘mais séria’.

Terceiro: Como foram feitas as escolhas específicas para comparar ou substituir cada profissão da arte por um curso superior do Uniceuma? Se é que em alguns casos há analogias e aproximações possíveis, em outros a regra parece ter sido a gratuidade, senão vejamos: ‘Tem artista plástica que faz nutrição’. A arte pode ser vista como algum tipo de ‘alimentação’ da alma; tal profissional estará apto para desenvolver uma dieta para que o corpo se adéque aos cânones de beleza; ou ainda este profissional fará pratos visualmente mais atraentes, já que sabemos que se come primeiro com os olhos. ‘Tem músico que faz arquitetura’ – a música pode ser vista como uma construção sonora, e temos ainda a relação complexa entre a acústica e a arquitetura. Mas no caso de aproximar direito/balé ou fotografia/administração, fica patente a gratuidade da comparação.

Concluímos alertando o Uniceuma de que campanhas publicitárias traduzem a posição ideológica e social de uma empresa, podendo tanto ajudar quanto atrapalhar seus negócios. Isso é mais grave quando se sabe que o Uniceuma tem entre seus cursos o de Propaganda e Marketing, onde se deve estudar todas as implicações de uma campanha. Comerciais mal planejados podem passar mensagens equivocadas, neste caso, referente ao valor das profissões. Nenhuma atividade é superior a outra, cada uma tem seu papel na formação e desenvolvimento da sociedade.

Grupo de Estudos da Imagem/Licenciatura em Artes Visuais/Ufma (Anacleta Santos, André Brandão, Celiane Louzeiro, Fernando Nascimento, Saulo Simões, Coord. Eugenio Araújo).

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