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Rachado e sem discurso, PT patina na oposição a Bolsonaro

A presidente do PT, Gleisi Hoffmann Foto: Jorge William / Agencia O Globo

BRASÍLIA — Sem os microfones do Congresso, a prometida oposição implacável do PT ao governo Jair Bolsonaro se limitou às redes sociais nas duas primeiras semanas de governo. Internamente, petistas admitem que o partido está sem discurso, não consegue empolgar a militância e precisa virar a página da bandeira “Lula, livre”, mas ainda não sabe como reagir à estratégia de Bolsonaro e aliados de colocar a legenda como principal inimiga do país.

As redes sociais têm sido a trincheira petista na oposição a Bolsonaro. Na internet, eles têm compartilhado críticas feitas às primeiras iniciativas do presidente e seus ministros, em especial as declarações polêmicas e os recuos. Mas os “memes” têm ressonância limitada e não dão projeção ao partido, avaliam petistas. Um líder da legenda diz que “o PT sumiu do noticiário” e advoga que o partido precisa com urgência traçar uma narrativa para continuar protagonista da oposição.

Na semana passada, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, voltou às páginas de jornais, mas criticada por líderes de outros partidos de esquerda e até correligionários. Ela foi à posse de Nicolás Maduro, na Venezuela, na última quinta-feira, sob a alegação de “mostrar que a posição agressiva do governo Bolsonaro contra a Venezuela tem forte oposição no Brasil e contraria nossa tradição diplomática”. Dominado pelos opositores a Maduro, o Parlamento venezuelano não reconheceu a legitimidade da sua reeleição. A Organização dos Estados Americanos (OEA) também não reconhecerá o governo Maduro.

Para parte do partido, a ida de Gleisi à posse foi “um desastre”. Um dirigente histórico da legenda diz que “o PT vai ter de discutir se quer manter o radicalismo como linha de frente”.

Mais Haddad
Para o deputado federal reeleito Reginaldo Lopes, o petista mais votado em Minas Gerais para a Câmara e outro crítico à presença do PT na posse de Maduro, o partido tem de voltar a atenção à vida real da população:

— O PT precisa debater os temas que interessam ao povo brasileiro e largar de polarizar as bobagens ditas pela família Bolsonaro, porque elas se perdem no tempo e espaço por serem tão ridículas e inaceitáveis no século XXI. Paulo Guedes só pensa no mercado financeiro. Essa bobagem sobre Previdência de capitalização é o fim do mundo para os pobres e trabalhadores de renda pequena, ou seja, para 80% do povo brasileiro.

A reforma da Previdência, no entanto, é considerada a principal medida para reequilibrar as contas públicas e fazer o ajuste fiscal.

A direção do partido se reunirá na segunda-feira. Depois de ter boicotado a posse de Bolsonaro, uma decisão que também causou polêmica e não foi unânime internamente, o PT pretende traçar uma linha de atuação contra o governo.

Uma das cobranças internas é por uma atuação mais forte do candidato derrotado do partido à Presidência, Fernando Haddad, como porta-voz da oposição. Ele também tem usado as redes sociais como canal para disparar críticas a Bolsonaro. Mas o PT quer que ele saia de casa. Uma ala do partido defende que Haddad viaje o país no esforço de reaproximação com segmentos da sociedade que se afastaram da legenda nos últimos anos, como os evangélicos.

O partido quer formular também um “pacote” de iniciativas contra Bolsonaro para a volta do Congresso. Os parlamentares pretendem explorar o que identificam como maior potencial de desgaste para o governo. Um dos focos são as denúncias contra Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL), filho do presidente. Relatório do Conselho de Controle de Atividades (Coaf) aponta movimentação de R$ 1,2 milhão numa conta bancária dele durante um ano. Na época, ele recebia salário de R$ 23 mil. As transações foram consideradas atípicas. Queiroz alegou que o dinheiro vinha da compra e venda de carros.

O ritmo lento de oposição no início do governo Bolsonaro é atribuído por alguns petistas ao ex-presidente Lula. Segundo parlamentares, quem o visitou voltou com a orientação de “observar” os primeiros atos do novo presidente para “modular” as críticas. Lula teria se mostrado preocupado com as sinalizações de que Bolsonaro vai manter o discurso anti-PT como pilar de seu governo.

Contexto: escândalos de Temer deram fôlego
Depois de sofrer em 2016 o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff e a maior derrota eleitoral da sua história nas eleições municipais, quando perdeu 60% das prefeituras que comandava, o PT soube se reestruturar na oposição ao governo Michel Temer. Depois desse vendaval político, que culminou com a prisão do ex-presidente Lula, em abril passado, o partido conseguiu se recuperar.

Em 2018, colocou o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad no segundo turno da eleição presidencial, elegeu a maior bancada para a Câmara, com 56 deputados, e manteve uma cidadela no Nordeste, onde governa Bahia, Ceará, Rio Grande do Norte e Piauí. Esse resultado manteve o PT na liderança da esquerda brasileira e pode ser atribuído à eficácia da oposição petista ao governo Temer. Com a narrativa de que o impeachment de Dilma foi um golpe e o slogan “Fora, Temer”, o partido soube se aproveitar da impopularidade do ex-presidente. A oposição foi facilitada pelos escândalos que tragaram o governo Temer.

Se a eleição de Jair Bolsonaro significou um abalo para o sistema político tradicional, o PT pode dizer que sofreu menos escoriações do que o PSDB, o partido com quem polarizou a política nacional desde 1994. Esse passado de eficácia na oposição é um alento para os petistas no enfrentamento político ao novo governo. Mas há motivos também para o PT temer o futuro. O principal é o crescente ostracismo de Lula, encarcerado em Curitiba.

Neste começo do governo Bolsonaro, outro problema é a desunião interna. Com 47 milhões de votos, Haddad saiu com credenciais para se tornar o principal líder do partido. Mas a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, que tem o apoio de Lula, não quer abrir espaços. (O Globo)

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