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Presente de Grego

Por Abdon Marinho

Convencionou-se dizer tratar-se de um presente grego, aqueles que, embora agrade ao destinatário, revela-se danosos no momento seguinte. Tem por origem a mitológica Guerra de Tróia, narrada por diversos autores da antiguidade, tendo-a, uns como evento mitológico, outros como histórico. Na parte que nos interessa para o texto, diz-se que os gregos fingindo uma retirada do cerco à Tróia, deixaram-lhes um enorme e lindo cavalo em madeira, que os troianos entenderam tratar-se de um presente, levando-o para dentro dos muros da cidadela. O cavalo, na verdade, escondia diversos guerreiros gregos e, uma vez dentro da cidade, trataram de facilitar o acesso dos demais soltados e travar uma batalha intramuros, vencida pelos gregos.

Manifestantes exibem faixa com mensagem cobrando rotatória e acostamento para ônibus

A mídia do Maranhão, numa das maiores e mais caras campanhas publicitárias da história do estado e do Brasil, não cessa de vender os feitos da governadora que deixa o cargo em 31 de dezembro, Roseana Sarney. Sua excelência, apenas para efeitos comparativos, tem mais divulgação no atual momento que Helena, pivô da guerra entre gregos e troianos em mais de 3 mil anos. Seus feitos são cantados em prosa e versos em TV’s, rádios, internet e capas de jornais. Falam das inúmeras rodovias, que dizem ligar todos as sedes dos municípios (sabemos que não é verdade); das dezenas de hospitais (alguns funcionam, outros, não, parte em construção); obras de infraestrutura na capital, viadutos, pontes e elevados (quase nenhum com recursos próprios do estado, grande parte mal feitos); mas vamos em frente.

Outro dia tive que ir ao fórum em São José de Ribamar, como consequência, me atrasei na chegada ao escritório. Além do atraso causado por ter ido ao fórum, outra coisa motivou meu retardo: na volta havia um protesto de moradores do bairro Araçagy contra as obras de duplicação da Avenida dos Holandeses.

Enquanto esperava a desobstrução da pista fiquei sabendo que os moradores protestavam, com razão, contra a forma como a obra está sendo feita. Dizem que enquanto faltam pistas, sobram postes e canteiros, há, ainda, a notícia de que elevado projetado não será feito como estava no projeto original, além é claro do sumiço de diversos outros mecanismos de mobilidade, como baias para ônibus, a largura das pistas (em muitos lugares não permitem a passagem de dois carros simultâneos, etc).

Os moradores acordaram que entregarão “gato por lebre”, como diz o dito popular. Essa a razão de protestarem contra uma obra importante, necessária e urgente para a Ilha de São Luís.

Pego esse exemplo apenas para sintetizar o que vem acontecendo no Maranhão. A obra de duplicação da Avenida dos Holandeses é, pelo volume de serviços apresentados, uma das mais caras que tenho notícia. São menos de 3 km que custarão a bagatela de R$ 30 milhões de reais. Denuncio o valor absurdo da obra desde que colocaram as placas avisando sua execução. Agora, quando se aproxima o momento da entrega, comprovo que tinha razão: a exceção das pistas para ciclistas, a obra não apresenta qualquer diferencial capaz de justificar tanta gastança; as pistas de rolamento, como disse, são estreitas, se um ônibus ou veiculo maior parar, outro veículo não conseguirá passar sem esforço, isso é certo acontecerá inúmeras vezes por conta de outra sentida ausência: não construíram pontos de recuos para as paradas de ônibus; a camada asfáltica está é longe de atender ao mínimo de 12 centímetros de que trata a norma técnica; como a compactação foi mal feita, assim como todo o serviço de construção a pista já apresenta alguns pontos de defeitos, que embora, corrigidos para inauguração, ressurgirão em seguida.

Pois é, na obra falta qualidade e sobram postes a enfear a obra.

Ora, se o prolongamento da Avenida dos Holandeses que é via mais cara da ilha, com a quantidade de recursos alocados para a obra, fazem um serviço de amadores, dá para imaginar o que estão fazendo pelo resto do estado.

Não percamos de vista que estamos na capital, e essa via é percorrida pelas maiores autoridades do públicas quando se dirigem para suas propriedades de campo, costeira ou

para pegarem seus aviões e helicópteros particulares no aeroporto de Paço do Lumiar. Assim, custo a acreditar que não percebam o quanto a obra é mal arranjada, mal feita e feia. Apenas para fazer um comparativo histórico, a obra que mais se assemelha a essa foi a obra de urbanização do bairro Cidade Operária, feita com mais qualidade, mas com os mesmos defeitos, pistas estreitas e canteiros largos. As separam, os trinta anos entre uma e outra.

Usei a obra da Holandeses como exemplo, mas o vício das obras mal feitas contamina outras, aqui mesmo na capital. A Via Expressa, que prometem entregar por esses dias, possui inúmeros defeitos, inclusive nas pontes, onde os desníveis são um risco; a IV Centenário, segundo os engenheiros que consultei, é um acinte à engenharia, entre outros defeitos, a alça que desce na Avenida dos Franceses, só tem solução para uso, se for derrubada e reconstruída.

Dizia outro dia a um amigo que não me preocupo quando Roseana pega o violão e começa tirar um som, quando faz isso – não conheço seu talento musical –, o máximo que pode sair é uma ou outra nota desafinada, um erro de letra, já, quando se mete com obras, não tenham dúvidas, o risco é bem maior, tanto para os usuários quanto para as finanças públicas.

Como já disse reiteradas vezes, e agora repito, em pese a importância destas obras para as populações envolvidas, a forma como são executadas e fiscalizadas pelo poder público, faz com que não passem de presentes de grego para o futuro governo.

Abdon Marinho é advogado.

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