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O Maranhão nunca teve voz

Por Nonato Reis

Em seu artigo “Esperança e protesto”, publicado no último domingo, no jornal O Estado do Maranhão, o ex-senador José Sarney lamenta o fato de “não termos mais uma voz forte para fazer a defesa de nossa gente”. O desabafo ocorreu na esteira do comunicado da Petrobras anunciando a sua desistência do projeto de construir uma refinaria de petróleo no município de Bacabeira. Sarney abre o texto dizendo que o Maranhão recebeu “apático” a notícia, que classificou como um ato de “discriminação, desprezo, ingratidão e injustiça”.

A propósito pergunto: desde quando o Maranhão teve voz, aguda ou grave, no cenário nacional? Nem mesmo no tempo em que, por obra de uma fatalidade, um de seus filhos, por coincidência o próprio José Sarney, assumiu o cargo de maior relevância da República a voz do Maranhão ecoou nos fóruns de decisão.

Para ser justo com Sarney devo abrir uma exceção. Foi ele quem teve a ideia, e por ela enfrentou duras resistências, de ligar o norte esquecido do país ao sul desenvolvido, por meio de uma trilha ferroviária. Só que neste caso o foco não era propriamente o Maranhão, e sim a integração do Brasil, o que torna a iniciativa ainda maior, porém extrapola o mérito desta tese.

Há décadas se especula a necessidade de implantar uma usina de petróleo nas vizinhanças de São Luís. No primeiro mandato de Roseana como governadora, o Maranhão enredou-se numa disputa acirrada com Ceará e Pernambuco para sediar a refinaria que a Petrobras pretendia implantar no Nordeste, como forma de descentralizar o mapa de refino do país. No final das contas, a voz de Pernambuco ecoou mais forte e a refinaria foi levada para lá.

Se ninguém ouve o Maranhão não é por falta de políticos de peso, mas de compromisso mesmo. Diferentemente das demais unidades federativas, somos o único Estado que, por mais de 20 anos, fez-se representar na prática por quatro senadores, todos alinhados politicamente. Sarney presidiu o Senado Federal em quatro oportunidades. Foi o político de maior influência no país com a primazia de dar conselhos e garantir a estabilidade de chefes da Nação. Graças a ele, Lula salvou-se de um impeachment certo, durante o primeiro mandato, na eclosão do mensalão petista.

E eu pergunto: o que o Maranhão ganhou com esse aparato político exponencial? Talvez seja mais fácil dizer o que perdeu. No governo José Reinaldo, o Estado foi escolhido por critério técnico para sediar uma grande empresa siderúrgica. Tal como a refinaria de Bacabeira formou-se uma enorme expectativa em torno do projeto, que teria o papel de empregar a mão de obra disponível no mercado e alavancar o Maranhão a um estágio de progresso. Tantas foram as trapalhadas e os conflitos de interesses que, no final das contas, os gringos acabaram batendo em retirada, deixando o Maranhão a ver navios.

Por que isso aconteceu? Em parte pela incapacidade do governo do Estado em lidar com um projeto de tal magnitude, mas principalmente por falta de unidade política, aquela coisa de reunir todas as forças e brigar por um objetivo comum. No Maranhão, ao contrário de outros estados, em que os atores brigam no varejo, mas se unem no atacado, a única voz que se consegue ouvir é a do interesse de grupos.

Infelizmente não há um olhar maior, voltado para o que de fato importa. Quando José Reinaldo, então governador, desertou do grupo Sarney, e decidiu peitá-lo, fizeram um escarcéu dos diabos em torno da aprovação, no Senado, de um empréstimo junto ao Banco Mundial em favor do Estado, para ser aplicado no combate à pobreza.

Por meses o plenário da Assembleia Legislativa daqui ferveu numa briga sem trégua, com partidários do governador acusando Sarney de “segurar” a apreciação da matéria e aliados deste tentando inocentá-lo. Só depois de muito bate-boca, ameaças e articulação de bastidores em Brasília o projeto recebeu finalmente o sinal verde do Senado. Quer dizer, perdeu-se um tempo precioso para viabilizar um empréstimo que tinha por objetivo erradicar parte da miséria que assola o Estado.

Sarney diz em seu artigo que pode não estar mais vivo, até que o sonho de uma planta de refino seja finalmente concretizado em terras maranhenses, mas faz uma exortação ao desprendimento e à conjugação de forças como meio de viabilizá-lo. “(…) se mantivermos a luta, classes empresariais, povo, governo, todos unidos, essa decisão será revertida e um dia vamos ver a refinaria do Maranhão”. Perfeito como tese.

Há cinco décadas o Maranhão falou quase que exclusivamente pela voz de Sarney, e foi como pregar no deserto, porque enquanto ele construía a sua gloriosa carreira política, o Estado imergia no obscurantismo, com índices absurdos de analfabetismo, desemprego e exclusão social. Quem sabe agora, sem esta “voz forte” que ele alardeia, mas com um discurso sólido em favor do bem comum, os interesses legítimos do Maranhão sejam finalmente levados a sério, e ouvido por quem de direito.

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