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O Afeganistão é aqui?

Por Abdon Marinho

Examinei o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2014, produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (ISSN 1983-7364 ano 8 2014), um olhar superficial sobre os dados apontam para uma realidade bem pior a que já nos referimos aqui inúmeras vezes.

Vamos as dados.

Segundo o anuário o Brasil registrou 53.646 mortes violentas em 2013, incluindo vítimas de homicídios dolosos e ocorrências de latrocínios e lesões corporais seguidas de morte. Apenas para se ter uma ideia, toda União Europeia, reunindo 27 países, registrou pouco mais de 5 mil homicídios, os EUA, ficou abaixo dos 15 mil.

O Maranhão contribuiu com o índice disponibilizando 1.725 homicídios, 23,2 mortos/100 mil habitantes, 3,9% a mais que no ano anterior.

Trata-se de um número absurdamente alto para uma população na faixa dos 6 milhões de habitantes, sobretudo se comparamos com São Paulo que, com cerca de 40 milhões de habitantes, registrou 4.739 homicídios no mesmo período.

São dados aterradores, mas podem ser bem piores se fizermos uma análise mais apurada.

Vejamos. Sabemos que dos 1577 homicídios ocorridos ano passado no Maranhão, a região metropolitana de São Luís contribuiu com 983 vítimas. O que se quer dizer com isso é que uma coisa é você encontrar a um percentual tendo por base uma população de 6 milhões de habitantes, bem diferente é você pegar o número da população metropolitana, em torno 1.331.000 habitantes. Essa é a conta a ser feita, dividir o número de homicídios pela população residente. Feita a conta veremos que a violência na região metropolitana é uma das maiores taxas do mundo. Temos um homicídio para cada grupo de 1.354 habitantes.

Crescemos ouvindo que São Paulo era uma cidade violenta, considerando que a região metropolitana da capital paulista alcança mais 19 milhões de habitantes e o número de mortos em todo o Estado de São Paulo não chega a 5 mil, estão é longe de alcançar os índices da capital maranhense e seu entorno.

Embora o restante do Estado do Maranhão tenha registrado pouco mais de 700 homicídios (742), a situação no interior está longe de ser confortável, aumentaram substancialmente os assaltos a banco, o tráfico de drogas e os outros crimes menores, como o abigeato, assaltos a residências, prostituição, abuso sexual, etc. Muitos destes crimes sequer entram nas estatísticas da violência. Há um certo pudor em se buscar a proteção estatal quando se trata de certos crimes.

Especificamente sobre assaltos a bancos, as notícias sobre os mesmos são tão frequentes, que parece não haver uma semana em que não ocorra um, dois ou mais. Se , na maioria, não ocorre mortes nestes crimes, isso se deve a falta de reação popular e policial. As quadrilhas invadem as cidades e a população se esconde dentro de casa, só escuta de longe o barulho dos tiros e das explosões.

Não faz muitos dias explodiram pela segunda vez a agência bancária de Governador Archer, mais recente a de Lago Verde, Lago dos Rodrigues, e tantas outras que se perde as contas. As notícias que chegam dando conta de uma população tensa, nervosa e em pânico com tantas ações criminosas.

Outra modalidade de crime, o trafico de drogas, se espalha por todos os municípios do interior, não temos hoje, um município que não registre incidência de tráfico e vício, sobretudo entre os mais jovens, nem os povoados, até os mais distantes do interior ou vilas de pescadores, no litoral, registram abundância de vários tipos de drogas.

Outro dia alguém me alertou para o fato de gangues de motoqueiros estarem assaltando famílias que vão acampar as margens dos rios e outros acidentes geográficos. Assaltam e se embrenham no mato. As vítimas não têm, sequer, como reagir. Com isso os turistas já evitam fazer passeios em famílias ou em pequenos grupos.

Crimes como esses são facilitados por um policiamento deficiente. Na maioria dos municípios o contigente de pessoas encarregadas da segurança não chega a meia dúzia

de agentes. Pólos regionais e turísticos padecem da mesma falta de estrutura e efetivo policial e com isso se tornam irradiadores de crimes.

Conversando com a prefeita de Morros na região do Munin, fui alertado para um outro efeito danoso da falta de segurança. Ela dizia que está sendo procurada por diversas famílias que se recusam a mandar os seus filhos para continuar os estudos na sede do município por causa da violência. Pediam a ela buscasse parceria com o governo estadual para manter o ensino médio nos povoados sob pena de dezenas de jovens encerrarem seus estudos apenas com o ensino fundamental pois têm medo da violência na sede. Estamos falando de um município que não tem 20 mil habitantes, com uma sede que não tem dez mil, vejam onde chegamos.

Seguindo com a análise do anuário, um dado que também chama atenção é o fato do Estado do Maranhão ter reduzido os investimentos em segurança no ano de 2013, em comparação ao ano anterior, em mais de 11% (onze por cento) e não dispensar qualquer recurso para investimentos em informação e inteligência nos dois anos.

Como vemos, são coisas que não possuem explicação racional, não faz sentido não se ter investimentos em informação e inteligência assim como não tem qualquer lógica redução de gastos quando a violência parece fugir de qualquer controle. Isso apenas corrobora com o desmantelo que já imaginávamos existente no setor.

A questão da violência não será resolvida sem uma intervenção firme do Estado. É necessário que identifique as quadrilhas que estão atuando no Maranhão, que haja investimentos em informação e inteligência, que haja uma parceria do governo estadual com os municípios, nesta e todas as áreas, para uma ação conjunta. Sem isso, e mais outras medidas, que garantam um enfrentamento uniforme das causas e efeitos, não avançaremos muito.

Se agora, embora de forma imprópria, se pergunte se o Afeganistão é aqui, logo, logo, o Maranhão, e sobretudo, São Luís é que será sinônimo de violência e morticínios.

Abdon Marinho é advogado.

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