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Há 32 anos Boeing da Vasp era sequestrado para ser jogado contra Sarney no Planalto

Há 32 anos, o saudoso piloto e herói Fernando Murilo de Lima e Silva (falecido no último dia 26, em Búzios (RJ), do Boeing 737-300 da Vasp — voo 375 —, saiu de Confins (MG) e pretendia seguir para o destino final, o Aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro: setembro de 1988.

O desempregado Raimundo Nonato Alves da Conceição, de 28 anos, ex-funcionário da Construtora Mendes Júnior, arranjou um culpado para suas desditas: o então presidente José Sarney. Decidiu sequestrar o Boeing e jogá-lo no Palácio do Planalto, com o objetivo de matar o presidente da República.

O maranhense Raimundo Nonato – que trabalhava em garimpos no Pará – entrou no avião em Belo Horizonte. Cento e cinco pessoas estavam no voo. O comandante do Boeing era Fernando Murilo de Lima e Silva e Salvador Evangelista, o Vângelis, era o copiloto.

De repente, Raimundo Nonato exigiu que a cabine fosse aberta. Como não foi, atirou e acertou uma orelha do comissário Ronaldo Dias. Insistiu que a cabine deveria ser aberta e, como não foi, atirou de novo e acertou a perna do piloto Gilberto Renhe, piloto extra da Vasp que estava de “carona” no voo. Com o tiroteio, a cabine foi aberta. Raimundo Nonato ordenou: “Vamos para Brasília. Tenho um acerto com Sarney!”

O piloto Murilo acionou o transponder e informou o código internacional de sequestro. “E ainda avisei bem baixinho que o desejo dele era jogar o avião sobre o Palácio do Planalto”, relata. Salvador Evangelista, de 34 anos, pegou o microfone para responder à torre de comando e Raimundo Nonato, pensando que estava armado, matou-o. Vângelis deixou uma filha.

Ao sobrevoar Brasília, percebendo nuvens, Murilo informou a Raimundo Nonato que não havia como aterrissar. O sequestrador sugeriu que o piloto pousasse o avião em Anápolis e, depois, Goiânia.

“Foi aí que mostrei para ele o marcador de combustível e falei que o avião ir parar de funcionar e a gente ia cair. Ele nem quis saber. Eu continuei sobrevoando a pista de Goiânia e aí ele soltou: ‘Vamos para São Paulo’. Comecei a ficar desesperado porque se a gente mal tinha combustível para ali perto, que diria São Paulo”, afirma Murilo.

Ao perceber que o colega estava morto, “o comandante Murilo fez uma ação que foi crucial para o desfecho da história. Ele tirou o avião do piloto automático e executou um tonneau (manobra em que o avião dá uma volta completa ao redor de seu eixo longitudinal) para ver se o sequestrador perdia o equilíbrio”. Raimundo Nonato continuava de pé. “Foi então que decidi partir para uma manobra mais arriscada, o parafuso (o avião perde a sustentação e cai de bico, girando as asas como um pião; a aeronave gira descendo).

Um dos motores havia parado e eu pensei, como vou morrer mesmo, vou arriscar. Parti para o tudo ou nada. Já que vou morrer, vou morrer brigando porque, pelo visto, ele não ia me deixar pousar”, acrescenta o piloto. O sequestrador caiu e Murilo aproveitou para aterrissar no Aeroporto Santa Genoveva, em Goiânia.

O sequestrador dizia só se entregar a Tamanini (foto), cuja voz ouvia na Rádio Nacional.

As manobras do piloto Murilo foram tão extraordinárias — inéditas — que até hoje não são reconhecidas pela Boeing. “Mesmo com testemunhas dentro e fora do avião, a empresa nunca homologou o feito”. “Isso nunca tinha acontecido na aviação comercial. Eles alegam que é praticamente impossível um Boeing executar isso”, afirmou Ivan Sant’Anna, autor de livro sobre acidentes de aviões.

Com uma pistola nas mãos, Raimundo Nonato continuou a ameaçar a tripulação, mas decidiu embarcar num Bandeirante da Aeronáutica. O comandante seguiu junto como refém. “Você não vai me trair, né?”, disse o maranhense. Murilo redarguiu: “Não vou. Vai dar tudo certo”.

Um pouco antes – a íntegra da conversa do sequestrador com a torre e o piloto foi divulgada no jornal Folha de S.Paulo do dia 30 de agosto de 1988 – o repórter Irineu Tamanini, da Rádio Nacional e que cobria as atividades da Presidência da República e estava no Comitê de Imprensa do Palácio do Planalto – o sequestrador admitiu se entregar mas só faria isso ao repórter Tamanini. O sequestrador conhecia o repórter porque no garimpo ele escutava o dia inteiro a Rádio Nacional. O repórter não foi avisado do pedido e ficou sabendo apenas no dia seguinte ao ler a Folha de S.Paulo.

Raimundo foi alvejado por um atirador de elite.

Murilo estava ajudando Raimundo Nonato a subir no avião quando escutou um tiro. Um atirador de elite acertou o sequestrador. O piloto saiu correndo e, sentindo-se traído, Raimundo Nonato atirou e acertou uma de suas pernas.

Na época o Hospital Santa Genoveva (dirigido pelo médico Francisco Ludovico), agora fechado, era uma das principais referências em medicina em Goiânia e também ficava próximo do aeroporto. Os feridos — Murilo, Gilberto Renhe, Ronaldo Dias e Raimundo Nonato — foram levados para lá.

Médicos do Santa Genoveva examinaram Raimundo Nonato e disseram que, apesar de ter recebido três tiros, não corria risco de morte. Mas, de repente, morreu o homem que sonhava vingar-se do presidente Sarney. Ivan Sant’Anna diz que “a morte foi tão inesperada e estranha que nenhum legista de Goiás quis dar o atestado de óbito. Tiveram que chamar um legista de fora, o Badan Palhares”. (Do Diário do Poder)

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