Cunha, Garotinho, Maluf: mudança na lei eleitoral pode antecipar fim da inelegibilidade de políticos de peso
Aprovada a toque de caixa pela Câmara, a minirreforma eleitoral poderá antecipar o retorno às urnas de políticos notórios que saíram de cena após serem condenados à inelegibilidade. Entre os possíveis beneficiados estão o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, pai de uma das autoras do projeto, a deputada Dani Cunha (União-RJ), além dos ex-governadores Anthony Garotinho (RJ), José Roberto Arruda (DF) e até mesmo Paulo Maluf (SP), de acordo com advogados eleitorais e especialistas da área consultados pelo GLOBO.
As mudanças, que mexem na Lei da Ficha Limpa e na da Inelegibilidade, foram aprovadas na semana passada pelos deputados e, para entrar em vigor, ainda precisam do aval do Senado. O texto abranda a penalização a políticos condenados ou que tiveram seu mandato cassado, pois muda o início da contagem do prazo de 8 anos para aqueles considerados inelegíveis, o que pode antecipar o fim da punição. Atualmente, políticos enquadrados por crimes comuns ficam inelegíveis durante o cumprimento da pena e por mais 8 anos seguintes. Além disso, o projeto limita a 12 anos o prazo máximo que a sanção pode ser aplicada, mesmo nos casos em que houver mais de uma condenação.
No caso de Garotinho, por exemplo, a lei atual o impede de concorrer nas urnas desde 2018, quando foi condenado por improbidade administrativa. Ele ficará proibido de se candidatar por mais oito anos, contados a partir do fim do processo (o chamado trânsito em julgado), o que ainda não ocorreu. O caso está relacionado a irregularidades cometidas quando ele foi secretário estadual, de 2005 a 2006. Como ainda há recursos pendentes na ação, não é possível estimar quantos anos mais ele ficaria inelegível.
Contagem antecipada
Pelas novas regras, contudo, o prazo de oito anos de inelegibilidade contaria a partir da condenação. Ou seja, Garotinho estaria apto a concorrer novamente a partir de maio de 2026. Rafael Faria, advogado do ex-governador, defende a revisão da lei que traz “maior senso de Justiça”.
— A versão atual deixa o agente público em tempo quase indeterminado sem poder concorrer a pleitos eleitorais — afirmou o defensor.
Já no caso de Cunha, o ex-deputado teve o mandato cassado pela Câmara em setembro de 2016, após mentir a uma CPI sobre contas secretas que ele mantinha na Suíça. Pelas regras atuais, o período de oito anos de inelegibilidade é calculado a partir de quando terminaria seu mandato na época, em 2018 — ou seja, fora das urnas até 2026.
Embora o político tenha conseguido concorrer a uma vaga na Câmara no ano passado com base em uma decisão liminar (provisória), a mudança na lei proposta por Dani Cunha antecipa essa contagem para a data da cassação, o que deixaria o caminho do pai livre para entrar nas disputas municipais do ano que vem. Procurado, o ex-parlamentar não quis comentar, mas tem dito a interlocutores que não tem intenção de se candidatar novamente. Em 2022, ele não obteve votos suficientes para retornar à Câmara.
Outro exemplo de político que pode ser reabilitado pela reforma, segundo especialistas, é o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda, que acumula condenações por improbidade na esteira da Operação Caixa de Pandora. A exemplo do caso de Garotinho, o prazo de inelegibilidade do político do DF só passará a contar a partir do fim do processo, o que ainda não ocorreu.
Com a aprovação da minirreforma, porém, o tempo máximo de inelegibilidade é de 12 anos, o que o deixaria livre para ser candidato a partir de 2026. Aliados afirmam, no entanto, que o ex-governador desistiu da vida pública e quer seguir na carreira acadêmica. Também procurado pela reportagem, ele preferiu não se manifestar sobre a mudança na lei que pode beneficiá-lo. No ano passado, Arruda tentou uma vaga de deputado federal, mas foi barrado pela Justiça Eleitoral.
Quem também ganharia a oportunidade de um retorno às urnas, caso queira, é Maluf. O ex-governador de São Paulo foi condenado em maio de 2017 por lavagem de dinheiro com pena de sete anos e nove meses pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Com a legislação vigente, Maluf ficaria inelegível por mais oito anos após o cumprimento da pena, ou seja, até 2032, aos 101 anos. Com a aprovação da minirreforma, ele estaria elegível em maio de 2025, apto a ser candidato nas eleições 2026, quando terá 95. A defesa do ex-governador não foi localizada.
Amplo alcance
Especialistas acreditam que a mudança pode ainda favorecer uma série de ex-prefeitos inelegíveis após condenações por improbidade administrativa. A definição de um prazo para que a punição seja aplicada é considerada positiva por advogados que atuam na área de direito eleitoral.
— Apesar de termos a reabilitação política de algumas figuras que já tiveram diversas condenações, é importante frisar que não se pode ter uma penalidade ilimitada — afirmou o advogado Cristiano Vilela.
Por outro lado, Roberto Livianu, presidente do Instituto Não Aceito Corrupção, afirma que as regras atuais já passaram por análises de constitucionalidade em várias ocasiões e estão corretas:
— Não existe isso da inelegibilidade não ter prazo. Não é por toda vida pública. No final das contas, essas regras já são bastante suaves. (O Globo)
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