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O papel social das Academias de Letras

LUIZ GONZAGA MARTINS COELHO*

A Academia Maranhense de Ciências, Letras e Artes Militares (Amclam), fundada em 31 de maio de 2018, celebrou mais um marco histórico na última quinta-feira, 27, ao inaugurar sua primeira sede. A solenidade, prestigiada por confrades, autoridades civis, militares, acadêmicas e representantes da Igreja, foi muito mais que um ato protocolar: simbolizou a consolidação de um projeto concebido com dedicação e firmeza ao longo de sete anos.

Localizada na Rua Euclides Farias, nº 25, no bairro Cohama, ao lado da Igreja Menino Jesus de Praga, a nova sede representa uma conquista memorável da atual gestão, presidida pelo competente e incansável acadêmico Carlos Augusto Furtado Moreira. Apesar da pouca idade, a Amclam tornou-se um espaço vivo de pensamento, memória e convivência intelectual, destacando-se como uma das instituições culturais mais atuantes do Maranhão, graças ao comprometimento de seus membros e ao vigor que marca o cotidiano de seus trabalhos. Registre-se que, nesse curto período de existência, nossa Academia tem cumprido, com zelo, sua missão: presta mensalmente elogios aos seus patronos, lança obras, promove palestras, realiza saraus poéticos e diversas outras atividades culturais.

A cerimônia de inauguração teve início com o descerramento da placa e com a entronização da bênção apostólica ministrada pelo frei Francisco Ribeiro. Em seguida, os presentes foram brindados com uma conferência de rara profundidade abordando o tema “O Papel Social das Academias de Letras”, proferida pelo sócio-fundador Raimundo Ferreira Marques, que, no auge dos seus 87 anos, permanece exemplo de lucidez, sabedoria e refinado humanismo.

O conferencista reafirmou o valor das academias como espaços de reflexão, preservação da cultura e promoção da língua e do pensamento crítico. Mais que ambientes protocolares, defendeu que elas devem ultrapassar os próprios muros, levando conhecimento e sensibilidade a escolas, universidades, entidades culturais e à comunidade em geral, sem nenhuma restrição. Citando o professor Fritz Teixeira Sales, membro da Academia Paranaense de Letras e um dos organizadores da Universidade de Brasília, lembrou que:

“A finalidade das Academias de Letras é se dedicarem à literatura, às ciências e às artes. Seus membros devem ser pessoas interessadas no culto da língua pátria, no uso correto do vernáculo, no incentivo à leitura, na publicação de obras e no debate filosófico, sempre guiados pelo respeito à norma culta e pela valorização da educação”.

O professor Sales também advertia que as academias não podem se transformar em instituições estagnadas ou meramente ornamentais:

“A Academia de Letras não é um fim em si mesma. Quando se tornam fossilizadas e inoperantes, a responsabilidade cabe aos próprios acadêmicos”.

Concordo integralmente com tais assertivas — e foi inspirador perceber como o palestrante Raimundo Marques encarnou, em sua fala, justamente o contrário da estagnação: vitalidade intelectual, espírito público e compromisso com a memória e a cultura. Utilizando metáfora feliz, comparou o surgimento das borboletas ao ato de libertar-se do casulo, advertindo que o fardão ou a peregrineta jamais podem se transformar em abrigo para o comodismo inútil e silêncio incômodo de uma elite que, por vezes, permanece estática, ocupando uma cadeira apenas por vaidade. As Academias devem furar bolhas, romper casulos e integrar-se à comunidade a que pertencem. Eis onde nasce — e deve permanecer — o verdadeiro papel social das Academias de Letras, Artes e Ciências.

Não se concebem mais academias herméticas, fechadas, restritas a um tradicional “chá das cinco” entre intelectuais, como nos tempos de Machado de Assis e Joaquim Nabuco. As academias precisam exercer protagonismo, sair das sedes físicas e das salas de ar-condicionado para alcançar as ruas e escolas, levando estímulo à leitura, discutindo a importância do livro, despertando novos talentos e resgatando a cultura que fez de São Luís, no século XIX, a célebre Atenas Brasileira.

Após a conferência, o confrade Marques lançou a terceira edição de seu livro “Do Riacho ao Mar”, obra autobiográfica em que narra, com ternura e vigor, as travessuras da infância no povoado Barro Branco, em Buriti, até sua chegada à capital maranhense, onde exerceu funções de grande relevância, como a de corregedor do Ministério Público e presidente da Associação do Ministério Público do Estado do Maranhão (Ampem), já na condição de procurador de justiça.

Mais que celebrar uma conquista, a inauguração da sede da Amclam reafirma o papel essencial das academias de letras: manter vivo o patrimônio cultural, estimular a produção intelectual, promover o debate plural e servir de ponte entre o passado e o futuro. Academias não existem apenas para celebrar glórias nem para expor troféus e adornos culturais; existem para produzir sentidos, fortalecer identidades e inspirar novas gerações.

Que a nova sede seja, portanto, não apenas um endereço físico, mas um celeiro permanente de ideias, obras e encontros. E que a Amclam permaneça sendo farol, trincheira de cultura, espaço de debate qualificado, de pensamento crítico e de compromisso com o Maranhão — honrando sua missão com o mesmo entusiasmo que marcou sua fundação e que agora ilumina sua nova casa.

Por fim, registro meus sinceros parabéns ao presidente Carlos Augusto Furtado Moreira e a toda a Diretoria da Amclam. A conquista da sede própria não é apenas resultado de uma gestão eficiente, mas expressão de coragem, visão institucional e amor pela cultura maranhense, que tem honrado o legado de seu patrono Brigadeiro Feliciano Antônio Falcão, precursor da organização policial militar do Maranhão. Que esse gesto histórico inspire ainda mais trabalho, união e protagonismo, fortalecendo o papel da Amclam como guardiã da memória, da arte e do pensamento em nosso estado.

Viva a Amclam! Viva a Cultura!

*Promotor de Justiça, é acadêmico da Academia Maranhense de Ciências, Letras e Artes Militares (Amclam), titular da cadeira n 11 patroneada pelo escritor Josué Montello.

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