Supremo legado

OSMAR GOMES DOS SANTOS
Juiz de Direito na Comarca da Ilha de São Luís (MA). Membro das Academias Ludovicense de Letras, Maranhense de Letras Jurídicas, da Academia Literária do Maranhão (Alma) e da Academia Matinhense de Ciências, Artes e Letras (Amcal)
Um olhar reflexivo sobre a despedida de Luís Roberto Barroso do Supremo Tribunal Federal, e o legado de um homem que fez da justiça uma arte de equilíbrio e humanidade.
Na tarde de quinta-feira, 9 de outubro, o plenário do Supremo Tribunal Federal, situado na Praça dos Três Poderes, em Brasília, foi palco de um acontecimento incomum: a aposentadoria antecipada de um ministro da Corte.
Confirmando as especulações, com a voz embargada e dirigindo palavras a cada um de seus pares, Luís Roberto Barroso anunciou sua retirada, disposto a escrever novos capítulos nas páginas da democracia brasileira.
Antes, porém, que saia de cena, é justo rememorar uma trajetória digna de reconhecimento. Embora um juiz atuante e de posições firmes, presidiu a Corte com certa discrição, preservando o papel institucional do órgão e a serenidade que o cargo exige.
Natural de Vassouras (RJ), Barroso poderia permanecer no Supremo até 2033. Formou-se em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), onde é professor titular. Fez mestrado em Yale (EUA), doutorado na própria UERJ e pós-doutorado na Universidade de Harvard.
Atuou como docente em diversos países, com destaque para os Estados Unidos. Foi advogado e procurador de seu Estado natal. Em 2013, foi indicado pela então presidente Dilma Rousseff para o Supremo, assumindo a vaga deixada por Ayres Britto.
Desde então, conforme o regimento, presidiu também o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sendo diretamente responsável pelas eleições de 2020, quando defendeu de forma enfática a confiabilidade da urna eletrônica.
Com 65 anos, em 2023, assumiu a Presidência do STF e, por consequência, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), concluindo seu mandato há pouco mais de uma semana, ao transferir o comando das instituições ao ministro Edson Fachin.
Com claros sinais de quem cumpre o dever, repito: com a voz embargada, em todas as suas manifestações — tanto no plenário quanto nas entrevistas subsequentes — Barroso deixou uma mensagem republicana, reafirmando que a democracia deve prevalecer.
Em sua despedida, a um grupo de repórteres, falou sobre sua missão, que deve continuar em outras áreas, possivelmente como intelectual. Certamente, ainda tem muito a contribuir ao Brasil com seu vasto conhecimento.
De suas palavras, é possível depreender que pretende se dedicar a causas humanitárias, oferecendo seu contributo prático à concretização dos ideais constitucionais. Quiçá também às letras e à poesia, como costuma fazer.
Encerrar um ciclo com a serenidade de quem cumpriu sua missão é motivo de regozijo. Não é tarefa simples finalizar uma etapa em tempos tão conturbados — em que a política se vê, tantas vezes, judicializada — sem rancores ou arrependimentos.
Tal postura só é possível com sólido preparo técnico, profissional, mental e intelectual, aliado a uma forte dose de humanidade, que o distancia de qualquer apego, especialmente ao poder, a cargos ou posições.
O futuro pode parecer incerto, mas já revela o Norte: como ele próprio afirmou,
“É hora de seguir outros rumos, que nem sei se estão definidos.
Não tenho qualquer apego ao poder e gostaria de viver um pouco mais a vida que me resta, sem as obrigações e exigências públicas do cargo — com mais literatura e poesia.”
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