Fechar
Buscar no Site

A inteligência mental masculina e o papel educativo da Lei Maria da Penha

DANILLO SOUSA E SEBASTIÃO UCHÔA
Advogados

A Lei Maria da Penha, marco histórico no combate à violência doméstica no Brasil, completou mais de quinze anos de vigência mantendo-se como uma das legislações mais avançadas do mundo no campo da proteção à mulher. No entanto, a cada estatística divulgada, percebemos que o problema da violência doméstica permanece enraizado. Isso nos obriga a olhar para além do texto legal: é preciso compreender a mente do homem, seus gatilhos emocionais e sua incapacidade, muitas vezes, de gerir conflitos sem recorrer à agressividade, quando nalgumas situações, tem seus gatilhos ocorridos para absoluta provocação dos momentos infrutíferos ocorridos na relação com a sua companheira, notadamente em estado de instintividade à razão propriamente dita.

A cultura brasileira ainda carrega resquícios de um machismo estrutural que naturaliza comportamentos de dominação, além do próprio patriarcalismo que resiste aos tempos modernos se não holísticos. Desde cedo, muitos homens são educados para reprimir sentimentos, enxergando vulnerabilidade como fraqueza. O resultado é um adulto incapaz de lidar com frustrações, inseguranças e rejeições — elementos que, não raramente, se convertem em explosões de violência no ambiente familiar, mais precisamente nas relações domésticas ou afetivas.

É justamente aí que entra a inteligência mental masculina. Mais do que um conceito abstrato, trata-se da habilidade prática de reconhecer emoções, controlar impulsos e compreender que diálogo não é sinal de rendição, mas de maturidade. Se o homem aprende a neutralizar seus próprios gatilhos emocionais — o ciúme exacerbado, a sensação de perda de controle, a incapacidade de lidar com um “não” —, a probabilidade de um episódio de violência diminui de forma expressiva. Contudo, não pode prescindir da tamanha importância de uma educação construtiva recíproca durante toda a trajetória da relação a dois, sobretudo.

Outro ponto crucial é entender que o homem não pode se resumir apenas ao papel de provedor financeiro da família. Embora o sustento material seja de fundamental importância, ele não esgota a função masculina dentro do lar. O homem precisa enxergar, com amor e consciência, que sua verdadeira missão é conduzir o caminho da prosperidade da família como um todo, e, prosperidade aqui não significa apenas dinheiro, mas saúde emocional, respeito, educação e crescimento coletivo. Entretanto, um caminho de via dupla em matéria de compreensão do casal nos altos e baixos da relação, constitui grande maturidade para o casamento durar anos pelo profundo respeito e dedicação recíproca que precisam cultivar entre si.

A própria Lei Maria da Penha já prevê mecanismos para estimular essa mudança de postura. O art. 8º estabelece que cabe ao poder público desenvolver programas educativos e campanhas que desconstroem padrões culturais de violência e incentivem a convivência familiar saudável. Ou seja, a legislação já reconhece que punir não é suficiente: é necessário prevenir e reeducar, tocando na raiz do problema.

Mais ainda, o art. 22, inciso VI da mencionada Lei, autoriza o juiz a determinar ao agressor a frequência em programas de recuperação e reeducação, um caminho diretamente relacionado àquilo que chamamos aqui de inteligência mental masculina. E não se trata de benevolência, mas de cumprir a lei em sua integralidade, entendendo que a reeducação é ferramenta de segurança coletiva, pois diminui a reincidência criminal na espécie em comento.

A jurisprudência também tem caminhado nesse diapasão. O Superior Tribunal de Justiça em decisão de Recurso Especial/DF, reconheceu a importância dos grupos reflexivos de homens agressores, apontando que tais iniciativas não apenas reduzem novos episódios de violência, como também ampliam a consciência masculina sobre seu papel no lar. É um indicativo de que o Judiciário começa a compreender que o processo penal, sozinho, não resolve: é preciso dialogar com a psiquê e a educação do homem, além de se promover e executar uma verdadeira justiça restaurativa em diversas formas de abordagem.

Quando o homem assume sua responsabilidade de forma integral — como provedor, mas também como exemplo de afeto, equilíbrio e respeito —, ele fortalece a base emocional da família e cria um ambiente menos propenso a conflitos. Ao contrário, quando se limita ao papel financeiro, negligenciando sua presença afetiva e seu equilíbrio mental, o lar se torna terreno fértil para ressentimentos, cobranças e, em casos extremos, violência.

Neutralizar os gatilhos que levam à violência é uma tarefa que exige coragem e inteligência mental. É compreender que ser homem é muito mais do que pagar as contas: é abrir caminho para que a família prospere em todas as dimensões, dentre elas, financeira, emocional e espiritual. No fundo, há contexto para reflexões recíprocas dentro da relação, já que prevenir a remediar, também constitui ato de inteligência mental de ambos os atores da relação, especialmente.

A Lei Maria da Penha deve seguir firme como instrumento de proteção pela prevenção, repressão qualificada e correção de comportamentos delitivos ou de abusos no âmbito das relações cíveis do casal. Mas a transformação verdadeira só virá quando os homens compreenderem que seu maior legado não está na força bruta nem no dinheiro que colocam sobre a mesa, mas na capacidade de construir, com amor e equilíbrio, um lar onde a prosperidade seja coletiva e duradoura.

Porque no fim, a verdadeira vitória da Lei Maria da Penha será quando ela se tornar menos necessária, fruto de uma sociedade onde os homens já tenham aprendido a ser plenamente humanos, rompa com um passado de formação deturpada combatendo os preconceitos dentro de si e ao mesmo tempo conquiste a companheira no sentido de também colaborar para o crescimento de ambos dentro da relação com a promoção de um vínculo familiar de paz e prosperidade. De modo a se refazer a história marcada pela violência contra a mulher ante os fatídicos acontecimentos em todo o país em que grande parte dos homens ainda resiste à mudança de paradigma de absurdos atávicos cometidos contra a mulher no cotidiano nacional. Oxalá que abençoe os lares brasileiros, independentemente da condição social de todos os envolvidos rumo a mudança de mentalidade já tardia, mas antes assim a nunca, AMÉM!

O conteúdo deste blog é livre e seus editores não têm ressalvas na reprodução do conteúdo em outros canais, desde que dados os devidos créditos.

mais / Postagens