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Qual é o limite de um protesto?

OSMAR GOMES DOS SANTOS
Juiz de Direito na Comarca da Ilha de São Luís (MA). Membro das Academias Ludovicense de Letras, Maranhense de Letras Jurídicas, da Academia Literária do Maranhão (Alma) e da Academia Matinhense de Ciências, Artes e Letras (Amcal)

Na última década, o Brasil viveu momentos de grande fervor social. Manifestações, sob as mais diversas bandeiras, tomaram as ruas de várias cidades. Algumas pacíficas; outras, porém, assumiram contornos que em nada se alinham ao espírito democrático.

Enfrentamos os chamados black blocs e, mais recentemente, os autointitulados patriotas que atacaram a Praça dos Três Poderes. Entre esses extremos, também ocorreram episódios de menor proporção, mas igualmente destoantes das leis e dos costumes.

A Constituição Federal assegura a liberdade de manifestação do pensamento, da opinião e de reunião. Esses direitos fundamentais são repetidos diariamente, de norte a sul do país. Contudo, encontram limites quando o direito individual de protestar colide com o interesse coletivo.

O protesto ocorrido esta semana em São Luís, ao menos em parte, entra para as páginas de um capítulo sombrio, que tenta subverter a ordem. Protestar por justiça a um trabalhador brutalmente assassinado é legítimo. Mas tal manifestação não pode romper a linha do razoável, sujeitando-se a interesses escusos.

A grande maioria nas ruas era formada por trabalhadores ordeiros. Outros, entretanto, ultrapassaram os limites: atearam fogo em avenidas, incendiaram material de agentes de trânsito, atiraram pedras e tentaram derrubar o chamado “pardal”, equipamento que registra infrações de tráfego.

Que relação existe entre manifestar indignação por um direito e, ao mesmo tempo, fechar ruas, depredar patrimônio público e impedir o ir e vir de milhares de pessoas?

É possível afirmar que chegamos a um ponto-limite. A violência, disseminada por toda a sociedade, está presente no cotidiano dos que se deslocam a pé, de moto, carro ou ônibus. Com ela, instala-se uma sensação de insegurança generalizada.

Ainda assim, a resposta a esse estado de violência precisa estar dentro dos limites da lei. Nenhum protesto permanece legítimo quando ultrapassa a fronteira do bom senso e do respeito ao direito alheio — o direito à paz, ao trabalho, ao lazer, ao ir e vir. Quando imponho o meu direito pela força, colocando em xeque valores coletivos, extrapolo a legalidade e, muitas vezes, passo a compartilhar a mesma conduta daqueles a quem acuso.

Isso não significa, porém, que devamos aceitar tudo passivamente, baixar a cabeça e nos conformar com a realidade. Absolutamente! Significa agir com ideias concretas para transformar a ordem social, contribuindo para uma mudança positiva do estado de coisas em que vivemos.

Somos seres sociais e só evoluímos porque aprendemos a compreender e a ajudar uns aos outros. A organização de ideias, pensamentos e atitudes foi o que nos impulsionou ao longo da história. Não é razoável regredirmos a um cenário de barbárie.

É preciso refletir: em que momento nos distanciamos tanto, a ponto de enxergar no outro um inimigo? Sob qual argumento?

O direito de protestar, de cobrar dos governantes e de se manifestar é legítimo, desde que se traduza em ações resolutivas, que tragam o problema para a mesa e debatam soluções possíveis.

Tudo o que se afaste dessa esfera, por mais clamor social que desperte, não deve prosperar. Importa, sim, exaltar aqueles que se comportaram corretamente, buscaram o diálogo e trataram o caso com a seriedade que ele exige.

Que esse espírito prevaleça. E que as respostas para a paz social que tanto almejamos sejam construídas coletivamente, com ordem, respeito e compromisso com todos.

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