Maranhão registra mais de sete mil acidentes de trabalho em dois anos

Subnotificação deixa vítimas de acidente no trabalho invisíveis
Pedro Lima, operador de máquinas da construção civil em São Luís, sofreu uma lesão no ombro durante o expediente, mas não teve o acidente registrado pela empresa. “Me mandaram direto para o INSS. Disseram que era melhor assim, mas no fim eu perdi o direito à estabilidade e ainda tive dificuldades para voltar pro mesmo cargo”, contou. Após mais de nove meses afastado, Pedro retornou ao serviço, mas acabou sendo demitido.
Casos como o dele são mais comuns do que se imagina. Mesmo com direitos garantidos por lei, muitos trabalhadores brasileiros seguem desprotegidos diante de acidentes ou doenças relacionadas ao ambiente de trabalho. A subnotificação desses episódios – quando não há registro formal da ocorrência – se tornou um problema silencioso e preocupante no país.
A professora do curso de Direito do Centro Universitário Estácio São Luís, Clayrtha Gonçalves, explicou que acidente de trabalho é caracterizado como aquele que ocorre durante o exercício da atividade profissional, causando lesão, doença ou morte. Ao ocorrer, o empregador deve prestar socorro imediato, comunicar o fato à Previdência Social por meio da CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho) e adotar medidas para evitar novos acidentes.
Esse documento é essencial para garantir o acesso a benefícios específicos, como reabilitação profissional, acompanhamento pelo INSS e estabilidade no emprego por 12 meses após o retorno.
“Caso não ofereça a assistência devida ou omita o registro, a empresa pode ser responsabilizada judicialmente, sendo sujeita a indenizações por danos morais, materiais e pensão vitalícia, além de multas administrativas”, reforçou Clayrtha.
De acordo com a professora, a subnotificação ocorre, muitas vezes, porque empresas podem tentar se esquivar de responsabilidades trabalhistas e previdenciárias. “Em vez de registrar o acidente como relacionado ao trabalho, orienta o empregado a procurar o INSS como se fosse uma doença comum”, explicou.
ESTATÍSTICAS
Entre 2021 e 2024, os dados sobre acidentes de trabalho no Brasil aumentaram. De acordo com o Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho, o país registrou mais de 612 mil acidentes de trabalho apenas em 2023.
No Maranhão, o crescimento também chama atenção. Em 2021, foram notificados 3.400 casos, o que representa um aumento de 28% em relação a 2020. Em 2022, esse número subiu para 4.100. São Luís lidera o ranking estadual, com 1.900 ocorrências, seguida por Imperatriz (281), Balsas (136), São José de Ribamar (109) e Timon (86).
A construção civil, setor em que Pedro atuava, lidera o número de processos trabalhistas por acidentes no estado. Em 2022, foram registradas 29 ações envolvendo acidentes nesse setor. Segundo o Ministério Público do Trabalho no Maranhão (MPT-MA), a subnotificação de casos ainda é um desafio e dificulta a formulação de políticas públicas eficazes para prevenção.
Na Justiça do Trabalho do Maranhão (TJ/MA), o número de ações relacionadas a acidentes de trabalho aumentou 32,78% em 2023, em comparação com o ano anterior. Esse cenário também se repete em nível nacional. No Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15), o número de processos sobre acidentes de trabalho cresceu 15% entre 2023 e 2024, passando de 11.571 para 13.306 registros.
“Muitos trabalhadores não têm conhecimento sobre seus direitos. É fundamental que eles busquem orientação jurídica caso percebam que a empresa está tentando omitir o acidente”, reforçou Clayrtha Gonçalves. Para ela, é necessário ampliar a fiscalização e fortalecer campanhas de conscientização. “É urgente responsabilizar empregadores que omitem acidentes e envolver os sindicatos nessa demanda”, explicou a docente da Estácio.
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