CORONEL CARLOS FURTADO
Presidente da Academia de Letras dos Militares Estaduais do Brasil e do Distrito Federal (Almebras), presidente da Academia Maranhense de Ciências, Letras e Artes Militares (Amclam) e vice-presidente da Federação das Academias de Letras do Maranhão (Falma).

Sem permear o mérito histórico em que a Academia de Platão[1] inaugurou uma época de estudos e discussão de ideias, em que os acadêmicos passaram a aprender e a buscar o conhecimento verdadeiro e a praticar a política de forma iluminada na antiguidade, aquele modelo perpetuou-se até o século XVII, quando foi seguida por outras Academias e designaram, no Ocidente, instituições vocacionadas para o ensino, a cultura, a ciência, nomeadamente, as artísticas, literárias, científicas e filosóficas etc.

Foi a fundação da Academia Francesa[2], considerada paradigmática, que inspirou e influenciou a criação da Academia Brasileira de Letras (ABL)[3] e outras, especificamente, as literárias, que, desde as suas origens, vêm desempenhando papel crucial na construção e consolidação de uma identidade nacional e valorização da cultura local. No Brasil, o Ceará foi vanguardista na criação de sua academia de letras local (1894), logo depois veio a fundação da ABL (1897), o que motivou a criação de diversas academias de abrangência estadual, e todas elas contribuíram, de forma significativa, com seus destacados papéis na:

• Preservação da língua e da cultura: as academias literárias têm um papel fundamental na defesa da língua portuguesa e na valorização da cultura nacional. Ao promover a produção literária e a discussão sobre temas relevantes, elas vêm contribuindo para a construção de uma identidade cultural própria.
• Formação de uma elite intelectual: as academias costumam reunir os principais intelectuais, promovendo a troca de ideias e o debate sobre temas relevantes para a sociedade. Dessa forma, elas também contribuem para a formação de uma elite intelectual comprometida com o desenvolvimento do país.
• Criação de um cânone literário: ao selecionar e divulgar as obras de determinados autores, as academias têm contribuído para a formação de um cânone literário nacional, estabelecendo os parâmetros do que pode ser considerado como literatura de qualidade.
• Promoção do nacionalismo: muitas academias literárias surgiram em um contexto de fortalecimento do sentimento nacionalista. Ao valorizar a cultura nacional e a língua portuguesa, elas, em conjunto, contribuem para a construção de uma identidade nacional.

A criação de academias literárias no Maranhão é um legado que perdura, pois, se verificarmos o epíteto de “Atenas Brasileira”[4], atribuído a São Luís no final do século XVIII e consolidado no século XIX, perceberemos que ele refletiu a intensa atividade cultural e intelectual que se desenvolveu na cidade.

O surgimento e a consolidação das academias de letras no Maranhão encontram como precursoras a Oficina dos Novos e a Renascença Literária no final do século XIX. No início do século XX, a fundação da Academia Maranhense de Letras (AML)[5] representou um papel fundamental na afirmação da identidade cultural e intelectual do estado, ao valorizar a produção literária local e promoção da discussão sobre temas relevantes para a sociedade maranhense, que, além de contribuir para a construção de um atavismo cultural, fortaleceu os laços entre os intelectuais do estado, todos imbuídos no aprimoramento da sociedade.

É um espaço privilegiado para a troca de ideias, discussão de temas relevantes e a produção de obras literárias de qualidade. Ao congregar os principais mestres da literatura, as cabeças pensantes da época, a AML contribuiu significativamente para o florescimento e a consolidação da arte literária no estado, e essa tradição vem sendo perpetuada.

A AML, como exemplo emblemático da importância das academias literárias para a cultura maranhense, ao longo de sua história, tem se dedicado à preservação da memória literária do estado, à promoção da leitura e à valorização da língua portuguesa. A instituição também tem sido um importante espaço de debate sobre temas relevantes para a cultura e a sociedade maranhense.

A fundação de novas academias proliferou ao longo do século XX e, com maior força, neste século XXI, o que representa um fenômeno importante para o fortalecimento da cultura literária em nosso estado. Essas instituições desempenham um papel fundamental na preservação da memória cultural, na promoção da leitura e na formação de novos talentos literários.

Mas qual é a relevância das academias literárias atualmente? Em um mundo cada vez mais globalizado e marcado pela cultura digital, elas continuam a desempenhar um papel fundamental no fomento à criatividade de escritores ao surgimento de novos leitores. Ao valorizar a palavra escrita e o diálogo entre os intelectuais, essas instituições contribuem para a formação de uma sociedade mais justa e democrática.

O fortalecimento da língua portuguesa é uma das principais funções das academias literárias, ao defenderem a pureza e o prestígio do vernáculo. Os acadêmicos se dedicam à produção de obras literárias de qualidade, à organização de concursos literários e à promoção de debates sobre a língua e a literatura. Dessa forma, as academias têm contribuído para o fortalecimento da língua portuguesa no Maranhão e para a afirmação do estado como um polo cultural de destaque no Brasil.

Outro aspecto significativamente importante é o desenvolvimento de talentos literários, ao oferecerem um espaço para a discussão e a troca de ideias, estímulo à produção literária e contribuir para a formação de novos escritores. Além disso, as academias organizam concursos literários e premiações, o que incentiva a criação de obras de qualidade e reconhece o talento de anônimos.

Entretanto vários desafios e limitações foram enfrentados no passado, como a acusação de elitismo e de defesa de uma visão conservadora da cultura, nem sempre refletindo a diversidade cultural do país, privilegiando os interesses das elites.

Outrossim, em um mundo globalizado e marcado pela diversidade cultural, as academias literárias continuam a desempenhar um papel importante ao promoverem a leitura, a escrita e o debate sobre temas relevantes, assim elas contribuem para a formação de cidadãos mais críticos e conscientes. No entanto, para se manterem relevantes, as academias precisam se adaptar aos novos tempos, utilizando as tecnologias digitais e buscando novas formas de interação com o público e continuar a buscar o apoio dos entes públicos, um dos papéis do Estado.

Destarte, concluímos que as academias literárias, como a ABL, AML e suas congêneres e as mistas que se seguiram, foram e continuam sendo espaços importantes para a produção e a difusão do conhecimento. Ao promoverem a cultura, a língua portuguesa e a valorização dos talentos, essas instituições vêm dando sua contribuição para a construção de uma identidade cultural forte e vibrante, e seu legado é um patrimônio que deve ser preservado e valorizado pelas futuras gerações.

1 Fundada aproximadamente em 384/383 a.C. nos jardins localizados no subúrbio de Atenas. Configura-se como a primeira academia de que se tem conhecimento e considerada a primeira universidade do mundo.

2 “Académie Française” foi fundada por Richelieu em 29 de janeiro de 1635, sob o reinado de Luís XIII de França.

3 A Academia Brasileira de Letras (ABL) é uma instituição cultural inaugurada em 20 de julho de 1897 e sediada no Rio de Janeiro, cujo objetivo é o cultivo da língua e da literatura nacional.

4 Fazia referência à antiga Atenas, berço da civilização grega clássica e um centro de cultura, filosofia e conhecimento, arquitetado pela sociedade letrada maranhense na primeira metade do século XIX como sinônimo de superioridade linguística e intelectual.

5 É a entidade literária máxima do Estado brasileiro do Maranhão, fundada em 10 de agosto de 1908.