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As saídas temporárias e sua importância na Execução Penal

SEBASTIAO UCHOA*

A contenção da conduta criminosa no homem trilhou por várias fases e etapas na História da humanidade desde em que o homem passou a se entender como animal que externa condutas indesejáveis e ditas delitivas dentro de seu convívio em diversos agregados socais.

Os romanos já haviam dito que onde está o homem, está o crime, e neste, a sociedade. Assim, o crime é um fenômeno social eminentemente humano e social.

Na realidade, a humanidade passou por vários momentos para tentar conter os ímpetos criminosos no homem, desde o atingir seu corpo físico com penas deveras cruéis e degradantes, onde o seu corpo era alvo de objeto do direito penal, até sair da fase escura para a fase da luz quando a alma passou a ser a principal fonte de controle ao crime no homem, já que este é o único animal humano que pode cometer mentalmente delitos.

O Brasil adotou há muito tempo o sistema progressivo de cumprimento de pena diante de um especial tratamento penitenciário com vista a se aferir por meio de méritos comportamentais individual e dentro das sociedades fechadas (penitenciárias), quando do efetivo cumprimento de reprimenda penais por parte de um sentenciado, conforme a modalidade de regime lhe aplicado inicialmente.

Tal sistema começa por um regime mais rigoroso até atingir o mais brando, ou seja, adotado pela quantidade de pena recebida, os regimes fechado, semi-aberto e aberto. Contudo, é, no regime semi-aberto, que os sentenciados, após cumprir os chamados requisitos objetivos e subjetivos, passam a ser beneficiados pelas chamadas saídas temporárias em que outra grande finalidade não se tem senão em aferir, pedagogicamente,  a capacidade de autocontrole do sentenciado a refletir os efeitos da pena já cumprida e o seu desejo de voltar à sociedade em definitivo, quando de seu retorno às unidades penais de custódia pós “livres” estiverem quando nos períodos liberados a ficarem junto a seus familiares em tais saídas temporárias, sobretudo com vista a cumprirem o restante da pena devida.

No fundo, existe uma série de mal-entendidos com relação às saídas temporárias previstas no modelo de Execução Penal brasileiro, muitas vezes por absoluta ignorância dos meios de comunicação e da própria sociedade que dista da compreensão da função pedagógica inerentes aos porquês das saídas temporárias como grande instrumento legal de análise subjetiva e objetiva no que diz respeito a oportunizar ao sentenciado para que este demonstre sua real intenção para com a reinserção social por meio de autocontrole no retorno à carceragem sem quaisquer buscas policiais afins, dentre outras atitudes promissoras à total reintegração social do homem que esteve em conflito com a lei.

O que mais cai no imaginário social é a forma deturpada de difusão sobre o instituto da saída temporária como metodologia de análise na Execução Penal em nosso país, quiçá pela confusão que se faz ao longo do que se prever a Lei de Execução Penal brasileira que segue as diretrizes das normas constitucionais garantidoras correlatas ao respeito à dignidade da pessoa humana para com o chamado tratamento penitenciário reinserido, já que o crime é fenômeno social eminentemente humano em todas as acepções com as próprias condutas delitivas cometidas pelos sentenciados, numa vedação de vingança social pelo ordenamento jurídico brasileiro desde o primórdio das primeiras Constituições federais em nosso país, na esteira das civilizações mais avançadas no planeta Terra quanto ao trato das questões penais.

Se há falha no controle das saídas temporárias ou em suas concessões, onde demonstrada sua ineficiência ante o altíssimo grau de reincidência criminal no Brasil nesses últimos anos, nada impede de se reavaliar para se criar outros requisitos rigorosos às concessões, onde possam não somente ajudar nas novas autorizações para as saídas temporárias, quiçá com outros critérios, mas sempre com valorização delas no processo de reinserção social dos apenados como metodologia eficaz para se conter o crime no homem, durante o seu cumprimento de pena, especialmente.

Agora, atribuir às saídas temporárias condição de vilã das reincidências criminais sem compreender todo o processo pedagógico acima, é grotescamente, tentar reproduzir a lei do talião no país, cujas consequências nefastas, somente a sociedade colherá no por vir os efeitos deletérios maiores.

Assim, criar dificuldades para obtenção de mérito penal aos apenados que preencham novos requisitos, de forma psicologicamente viável em sistema de méritos, bem como de aumentar dificuldade para obtenção, constituirá algo mais importante do que extinguir as saídas temporárias no sistema de execução penal no país.

É possível até se pensar num grande desserviço prestado ao Estado brasileiro, caso se vingue a pretensão de erradicação do instituto das saídas temporárias na legislação brasileira, conforme processo legislativo modificativo em andamento no Congresso Nacional.

O Brasil precisa quebrar mitos ou ondas de reflexões superficiais que tanto alienam e partem para responsabilizar o suposto afrouxamento da ainda falida Execução Penal como sendo o único responsável pelo crescente aumento da criminalidade em nossa sociedade, quando inúmeras outras causas se têm, além do mero revanchismo alienante apregoados pelos insufladores de plantão em nossas mídias sociais como um todo. A própria definição de crime ontologicamente, vai muito além do conceito do mero pragmatismo legal.

A saudosa escritora Lya Luft em “Pensar é Transgredir a Ordem do Superficial”, já tivera vaticinado o quando é preciso romper com a tal forma de pensamento em vários aspectos em nossas vidas, a fim de enxergarmos melhor, no caso em espécie, o quanto as saídas temporárias tem importância na Execução Penal no país, e passarmos a ver com olhares transversalizados onde aprenderemos que as coisas estão além do disse-me-disse dos intelectuais de superficialidades de plantão que tanto induzem as massas a reagirem pela emoção, matando a razão para com a compreensão melhor de um todo tão complexo em tempos atuais em nosso sofrido país.

*Advogado do Escritório Uchoa & Coqueiro, delegado de Polícia aposentado e ex-secretário de Justiça e Administração Penitenciária do Maranhão.

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