Projeto do governo revela impactos e erros técnicos da Via Expressa que a propaganda oficial esconde
Aldionor Salgado*
O debate sobre a Via Expressa não chegou à população. Melhor dizendo, a população está entorpecida pela propaganda oficial que dá à obra o desenho que lhe interessa e a utilidade que lhe convém. O certo para o Governo do Estado é que a Via Expressa é fato consumado. Em exatos 7.370 metros de extensão, serão jogados mais de R$ 105 milhões, e se constituirá em um presente à cidade que ano que vem celebra 400 anos de fundação. Não trará impacto ambiental negativo algum. Nem comunidades densamente habitadas serão removidas, muito menos demolidos sítios arqueológicos. A estadualização da Via Expressa, graça da dócil maioria da Assembleia Legislativa do Estado, subtrai do Município o disciplinamento do uso do solo urbano e outras prerrogativas que protegeriam a cidade do insaciável desejo destruidor de obras de fachada e cosméticas como a anunciada Via Expressa.
O debate precisa chegar à população. Excetuando-se as audiências públicas convocadas pela Câmara Municipal de São Luís e Assembleia Legislativa, praticamente inexiste discussão sobre o empreendimento que, com certeza, provocará previsíveis danos. É lamentável, porém, que movimentos sociais, em especial os identificados com as causas ambientais, sociais e humanas, permaneçam indiferentes, alimentando preconceitos contra gestões tucanas, como a que atualmente administra São Luís.
Felizmente, começam a ser produzidas informações que se contrapõem à propaganda oficial. Recebemos de um grupo de técnicos das mais diversas especialidades, um relatório que contribui para se entender o que a propaganda encobre. O documento foi elaborado a partir do único projeto apresentado pelo governo do Estado e que está reproduzido na propaganda oficial.
O projeto do governo do Estado para receber a Certidão de Uso e Ocupação do Solo foi protocolado no dia 17 de julho, conforme afirmam autoridades municipais. Alguns aspectos que devem ser levados em conta.
De shopping a shopping – A Via Expressa interligaria a Avenida Carlos Cunha (na altura do Shopping Jaracati) à Avenida Daniel de La Touche (onde está sendo construído um novo shopping e em cima da Vila Maruim). Nas extremidades, seriam construídos encaixes (elevados).
Extensão exata – A exata extensão da Via seria de 7.370 metros e não os aproximados 10 quilômetros anunciados, que incluiriam recuperação asfáltica de bairros próximos.
Prazo de implantação – A propaganda anuncia para setembro de 2012 a inauguração da obra, mas o próprio projeto do governo do Estado prevê o prazo de cinco anos para sua conclusão. Seria realizada em três etapas. A primeira, compreendendo o trecho entre a Avenida Carlos Cunha e Cohafuma, teria 18 meses. A segunda etapa, que prevê o trecho Cohafuma-Recanto do Vinhais deveria ser executada em 24 meses. A etapa final, prevista para 18 meses, compreenderia o trecho Recanto do Vinhais-Avenida Daniel de La Touche. A construção dos encaixes (elevados) nas avenidas Carlos Cunha e Daniel de La Touche ocorriam nesta última etapa.
Ciclovias – A propaganda garante ciclovias, mas no projeto não seguem as normas e manuais. As ciclovias previstas no projeto não seguem as normas e manuais. Serão situadas entre a via de automóveis e calçadas de pedestres, constituindo-se um perigo. Além do mais, não está prevista a construção de ciclovias entre a Via Expressa e os bairros cortados por ela. Não haveria, portanto, ciclovia com acesso aos bairros.
Comunidades ameaçadas – A propaganda minimiza impactos ambientais e remanejamento de populações. Porém, o projeto omite que o encaixe da Via Expressa na Avenida Daniel de La Touche irá provocar a desapropriação e remoção de número elevado de residências da Vila Maruim.
A Via passaria pelo Vinhais Velho, área de sítio arqueológico e onde está situada a centenária Igreja de São João Batista, tombada pelo Decreto Estadual 9.652/84.
Impactos ambientais – O projeto de manejo ambiental não contém informações suficientes sobre os impactos ambientais. Com relação à proteção à fauna, por exemplo, não há um comentário sequer sobre o resgate e monitoramento da fauna. Em obras como esta, é obrigatório o manejo das espécies locais.
Na Avenida Carlos Cunha está prevista a intervenção sobre lagoa natural e vegetação típica. O projeto não apresenta alternativa a um provável aterro hidráulico, o que provocaria graves danos ambientais.
Parte da Via insere-se na “Zona de Reserva Florestal-Sítio Santa Eulália”, classificada como área protegida pelo Plano Diretor de São Luís, sendo área de uso sustentável. O projeto omite esse dado.
Alguns aspectos do tráfego – A propaganda apresenta significativas melhorias do trânsito.
Com base no projeto da Via Expressa, os benefícios anunciados são de baixo impacto no trânsito da cidade, visto que esses benefícios são mais localizados do que sistêmicos.
O projeto está orçado em R$ 105 milhões. O custo/benefício no tráfego da Avenida Jerônimo de Albuquerque é baixo considerando o investimento. Intervenções na Avenida Luís Eduardo Magalhães (no Cohafuma), no começo da Avenida Antares (Recanto do Vinhais) e com a ampliação da ponte do Caratatíua (sentido Ipase-Alemanha) teriam impactos semelhantes com custos bem menores.
Os elevados das avenidas Carlos Cunha e Daniel de La Touche seriam construídos somente na terceira e última etapa. Ou seja, durante um período de, pelo menos, quatro anos, as interseções com essas duas avenidas seriam feitas com a construção de ramais, o que provocará mais um ponto de congestionamento e de trânsito lento, piorando a atual situação.
Espera-se que entidades da sociedade civil e o poder público provoquem a discussão ampla sobre o assunto merece. Cada esfera governamental tem prerrogativas e responsabilidades. É inadmissível, portanto, que a força de sobreponha à lei, que a arrogância mutile o bom senso e que a cidade e sua população paguem um preço tal alto para atender a caprichos de quem não se habitua a sobreviver em espaço efetivamente democrático.
*Jornalista
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