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Por que o fascínio com o tirano Fidel?

Por Helio Gurovitz –  Não, Fidel Castro não foi um personagem complexo, polêmico, controverso ou qualquer outro eufemismo que se escolha para absolvê-lo. Fidel era simples. Foi, tão-somente, um tirano sanguinário, o ditador mais longevo na história da América Latina.

Seu governo foi responsável, somando apenas os registros comprovados pelo projeto Cuba Archive, por no mínimo 7.062 mortes até o final de 2014, dentre as quais 3.116 execuções por pelotão de fuzilamento, 1.166 assassinatos extrajudiciais e 1.010 mortes em tentativas de fuga da ilha.

É um número pequeno perto das estimativas de organizações de defesa dos direitos humanos, que falam em no mínimo 15 mil assassinados pelo regime castrista. Na América Latina, a ditadura sanguinária mais próxima do regime de Fidel em Cuba foi o Chile de Pinochet, onde os registros oficiais falam em 3.065 mortos – embora o governo tenha reconhecido mais de 40 mil.

Isso não inclui a censura à imprensa, a perseguição aos homossexuais, a crueldade com os balseiros, a tortura nas prisões, a proibição da internet e o empobrecimento da população – forçada a trabalhar num regime econômico fechado, estatista e dependente da boa vontade de aliados de ocasião, primeiro União Soviética, depois Venezuela. Um país fechado pela “ditadura científica administrada por uns talebans de guayaberas”, na definição precisa do jornalista cubano Raúl Castañeda, preso, depois exilado pelo regime cubano.

Como entender, então, a profusão de obituários que têm pululado nas últimas horas, cheios de loas a Fidel – ou, no mínimo, de um relativismo moral absurdo, ao apontar para conquistas cubanas na educação, na saúde ou na redução da desigualdade? Por que tantos artistas, políticos e intelectuais relativizam uma tirania sanguinária em nome de “conquistas sociais”?

Não dá para reduzir a mortalidade infantil em regime de liberdade, como fizeram tantos outros países, inclusive o Brasil? Acaso um governo está autorizado a instituir o paredón só porque erradicou o analfabetismo? Ora, de tal argumento deriva, logicamente, uma justificativa até do genocídio – tanto a Alemanha nazista quanto a União Soviética stalinista eram sociedades “igualitárias”, sem analfabetos.

A única explicação plausível para o fascínio renitente com Fidel está num fóssil da Guerra Fria, sobre o qual se assenta até hoje a disputa política na América Latina. Se algo, além da busca pelo poder a todo custo, definia a ideologia de Fidel, foi a oposição visceral aos Estados Unidos. Ele não aprovou nem mesmo o restabelecimento recente de relações, promovido por seu irmão, Raúl Castro, e pelo presidente Barack Obama.

É curioso, pois Fidel conhecia bem o país, quase foi profissional de beisebol lá, adorava Coca-cola e lançou mão de um jornalista célebre do New York Times, Herbert Matthews, para projetar a imagem de sua guerrilha pelo mundo, antes de tomar o poder do ditador Fulgêncio Batista em no réveillon de 1959. Visitou os Estados Unidos depois da revolução e posou de moderno para o então vice-presidente, Richard Nixon (na foto acima, do cubano Alberto Korda, Fidel visita o zoológico do Bronx em 1959).

Mas persistia, apesar de tudo, a dor-de-cotovelo. Aquela mesma que desperta um ódio inexplicável em tantos habitantes dos países ao sul do Rio Grande. Eles deram certo, nós não. Eles são ricos, nós não. Eles são poderosos, nós não. Eles têm a bomba atômica, nós não. Pura inveja. Mas Cuba, a pequena Cuba, ah, a Cuba de Fidel, esse paiseco a cento e poucos quilômetros de Miami, Cuba lhes dará uma lição…

Pois é o anti-americanismo tosco, nada mais, que move a simpatia de tanta gente por Fidel. Não apenas líderes como o finado Hugo Chávez ou o nosso Luiz Inácio Lula da Silva. Mas escritores como Gabriel García-Márquez, cantores como Chico Buarque, jornalistas como Fernando Morais, atores, professores universitários, cientistas – todos de indiscutível excelência em suas áreas de atuação, todos seduzidos pela lábia carismática do tirano cubano.

Em termos econômicos ou mesmo sociais, Cuba é um exemplo patético. Em termos políticos, tudo o que se espera agora é o fim da ditadura. Cubanos precisam viver num regime de liberdades plenas, democracia, com eleições, imprensa livre e economia de mercado. Nunca é tarde para começar. O povo cubano, culturalmente tão próximo de nós, só tem a ganhar. Precisará agora da ajuda de todos – sobretudo dos Estados Unidos.

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