O cálculo político do PT para Bolsonaro ficar inelegível
Em meio aos desdobramentos dos atentados terroristas em Brasília e da minuta golpista para mudar o resultado das eleições, o Partido dos Trabalhadores tem um prazo em mente para punir Jair Bolsonaro e fazer com que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) impeça o ex-presidente de disputar qualquer eleição pelos próximos oito anos.
A legenda de Lula quer que Bolsonaro seja punido e fique inelegível ainda neste semestre, na esteira da repercussão dos ataques à democracia promovidos pelos apoiadores na sede dos três poderes – e pelo próprio ex-presidente em suas redes sociais, ao postar vídeo com falsas acusações contra o resultado das urnas.
A avaliação entre aliados de Lula é a de que os recentes acontecimentos enfraqueceram Bolsonaro, diminuíram seu capital político e abriram caminho para que ele seja declarado inelegível pelo TSE. Logo, o melhor é condená-lo o quanto antes.
Integrantes do PL não admitem em público, mas fazem uma avaliação semelhante sobre a situação delicada do ex-ocupante do Palácio do Planalto.
Mas há outros motivos que justificam a pressa do PT em condenar Bolsonaro por abuso de poder político, econômico e uso indevido dos meios de comunicação. Ao longo de 2023, o TSE vai passar por uma série de mudanças em sua composição que vão mexer com a correlação de forças dentro da Corte e devem produzir reflexos na arena política.
Não só Lula vai indicar novos ministros ao TSE, como os processos que impactam a sobrevivência política de Bolsonaro mudarão de mãos.
Ao todo, tramitam no TSE 15 ações (as chamadas “aijes”, sigla para ações de investigação judicial eleitoral) que podem afastar Bolsonaro de disputar qualquer eleição pelos próximos oito anos. Todas elas estão sob a relatoria do corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro Benedito Gonçalves, que tem sido considerado “linha dura” por bolsonaristas.
Gonçalves é uma espécie de fiel aliado do presidente do TSE, Alexandre de Moraes, se aliando ao ministro nos principais casos julgados pela Corte. Mas o seu mandato no tribunal termina em 9 de novembro deste ano.
O PT quer que as ações mais potencialmente explosivas para Bolsonaro, como a que investiga um ecossistema de desinformação, sejam julgadas antes de Gonçalves deixar o TSE.
Até aqui, o ministro tem dado ritmo célere aos casos, inclusive já submetendo aos colegas questões preliminares que poderiam levar à anulação dos processos mais à frente. O objetivo é reduzir o espaço de manobra se Bolsonaro quiser apontar alguma questão processual para implodir as investigações.
Em novembro, as Aijes sairão das mãos de Benedito Gonçalves e irão para Raul Araújo, ministro bem mais palatável para os bolsonaristas.
Foi Raul Araújo quem deu a polêmica decisão que proibiu a manifestação política de artistas no Lollapalooza no ano passado, o que foi duramente reprovado pelos colegas. Ele também deu o único voto contra aplicar a multa de R$ 22,9 milhões imposta por Moraes contra o PL, partido de Bolsonaro, após a sigla pedir a anulação de parte dos votos no segundo turno. Araújo considerou o valor exagerado.
Durante a campanha eleitoral, Araújo atendeu a um pedido do PL e determinou que fossem apagados vídeos de Lula chamando Bolsonaro de “genocida”. A maioria do plenário, no entanto, acabou entendendo que Lula poderia usar o adjetivo para atacar a resposta desastrosa do adversário à pandemia.
“Essas ações contra Bolsonaro são robustas por si”, diz um influente petista à equipe da coluna. O temor no PT é se Raul Araújo terá o mesmo empenho que Benedito Gonçalves quando herdar os processos do colega.
Antes da troca na Corregedoria do TSE, o tribunal vai passar por outras duas mudanças em sua composição titular.
O TSE é um tribunal híbrido, formado por 3 ministros oriundos do Supremo Tribunal Federal (STF), dois do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e outros dois advogados. A mesma proporção é obedecida na composição de ministros substitutos, chamados para julgar casos quando os efetivos se declaram impedidos ou se ausentam das sessões, por exemplo.
Em maio, chegam ao fim os mandatos de Sérgio Banhos e de Carlos Horbach, dois integrantes titulares do TSE da cota dos juristas. Horbach ainda pode ganhar mais dois anos no tribunal. Banhos, por outro lado, já foi reconduzido.
Ou seja, Lula terá duas vagas de ministros titulares para preencher, mas o “processo seletivo” do TSE limita as escolhas do presidente.
O presidente da República vai escolher os nomes do TSE a partir de uma lista tríplice votada e definida pelo STF, que faz uma espécie de triagem.
Pela tradição do TSE, os ministros titulares da cota dos juristas são reconduzidos – e os substitutos são efetivados e se tornam titulares quando abre uma vaga. Dessa forma, a ministra Maria Claudia Bucchianeri poderia deixar o “banco de reservas” ainda no primeiro semestre.
Bucchianeri chegou ao TSE por indicação de Bolsonaro, com o apoio do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) e de lideranças do Centrão. Em 2018, a ministra atuou como advogada da campanha de Lula à Presidência da República. O petista teve o registro barrado por estar enquadrado na Lei da Ficha Limpa após as condenações impostas pela Lava Jato, que seriam anuladas três anos depois.
Em casos de propaganda julgados no ano passado, Bucchianeri defendeu o direito de Lula chamar Bolsonaro de “genocida”, mas irritou petistas ao dar uma decisão que mantinha no ar postagens do então presidente da República que associavam o PT ao PCC.
As postagens tinham como referência reportagens jornalísticas, mas a decisão acabou derrubada pelo plenário.
Dentro do TSE, a avaliação é a de que os recentes acontecimentos fortaleceram Moraes e sua ofensiva contra extremistas. Em meio a todas essas mudanças, o magistrado continua à frente do tribunal até junho de 2024, para o pavor dos bolsonaristas. (O Globo)
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