Novo marqueteiro do PT quer discurso menos ‘queixoso’
LUIZ MAKLOUF CARVALHO – O ESTADO DE S. PAULO
“O Lula é o Cassius Clay da caatinga.” “E venceria para presidente da República se a eleição fosse hoje.” As frases são do marqueteiro do PT, Edson Barbosa, o Edinho, dono da Link Propaganda. Desde dezembro, ele está de volta ao marketing do partido, de onde saiu há oito anos. Seu trabalho – seis vídeos de propaganda partidária – está sendo exibido, este mês, nas televisões e redes sociais. “Essa campanha de agora é uma mistura de ‘baixem os vidros’ (do carro – pedido do papa Francisco em sua visita ao Brasil, em 2013) com ‘hay que endurecerse pero sin perder la ternura jamás’, ou seja, o papa Francisco com Che Guevara”, afirmou o marqueteiro ao Estado em demorada entrevista por telefone na tarde da terça-feira passada.
Barbosa já tem um diagnóstico do que precisa ser feito para o PT melhorar sua imagem: “Tem que tratar a imprensa e as demais ferramentas de comunicação com mais qualidade, ver a questão da política e da economia de uma forma mais inteligente e parar essa onda estúpida de reclamações queixosas”, disse.
“Tomei um susto quando o Rui Falcão (presidente do PT) me convidou para voltar, e aceitei”, contou. O “susto” se explica: depois que saiu do PT, ou foi saído, nunca se sabe, Barbosa foi o marqueteiro fiel do governador Eduardo Campos, o quase concorrente de Dilma Rousseff se o acidente de avião não o tivesse levado. Barbosa nem sequer cogitava uma nova aproximação.
Falcão bateu em outras portas, é verdade, mas acabou optando pela dele: “Ô, Barbosinha, tem jeito? Como é que se comunica com a sociedade diante de uma pancadaria dessa?”, perguntou, no primeiro encontro, depois de relatar singularidades da atual crise que PT e Lula atravessam, com investigações em andamento nas operações Lava Jato e Zelotes e no Ministério Público de São Paulo. Barbosa achou que tinha jeito – e topou o trabalho que Falcão ofereceu. Barbosa substitui o concorrente João Santana, cordial adversário.
Por que Santana não renovou o contrato, se era, há anos, o marqueteiro preferencial, consagrado com a reeleição de Lula (2006) e as duas de Dilma Rousseff (2010 e 2014)? “Não perguntei”, disse Barbosa. “Essas coisas sempre têm a versão número 1, a versão número 2 e a versão verdadeira, que nem sempre se descobre qual é.” João Santana respondeu, por sua assessoria, que “o marketing do PT está em excelentes mãos”. Rui Falcão, por sua assessoria, não respondeu.
O trabalho que cabe ao dono da Link, pelo contrato, é essa meia dúzia de inserções publicitárias que está na TV e, principalmente, o programa de dez minutos que o partido exibirá no próximo dia 23.
Metáfora. Depois que assumiu, Barbosa já teve uma demorada conversa com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mais ouviu do que falou. Ao comentar essa conversa é que o marqueteiro saiu-se com a metáfora de uma histórica e inesquecível luta de boxe.
“Achei o presidente sereno e tranquilo, muito Cassius Clay contra George Foreman, na luta do Zaire. Respirando, esperando o momento, entendendo que o processo precisa rodar, muito consciente de que não existe materialidade de práticas ilícitas nas investigações contra ele. Até comentei: ‘Ô, presidente, achei que ia encontrá-lo mais preocupado’. Ele disse: ‘Estou chateado, né, velho, família, filhos, amigos…’. O Lula é o Cassius Clay da caatinga. Está muito chateado, é claro, porque é incômodo você tomar tanta porrada”.
No ringue africano, Clay, ou Mohammad Ali, ganhou a luta no oitavo round, por nocaute, depois de muito apanhar.
Você não acha que o Lula devia falar e esclarecer as denúncias – e não ficar com esse discurso do Rui Falcão, “coitadinho do presidente” etc. etc.? “Eu estou chegando agora, não devo ficar dando muito palpite”, responde o marqueteiro. “Tem uma turma muito experiente que está junto com o Lula. Agora é que eu comecei a conversar com eles, mas sempre com muito cuidado. A sensação que eu tenho é a de que houve um erro de avaliação, como se eles achassem que o poder de desgaste não fosse tão forte como começou a se tornar. Quando você tem um erro de avaliação, não é fácil encontrar um ponto e recompor a correção do movimento.”
Teclando o iPhone da baiana Irará, sua terra natal, Barbosa mandou para oEstado, na mesma terça-feira gorda, a pedido, os seis vídeos – ou comerciais, como os chama – que já foram ao ar. Cinco nas TVs abertas e nas redes sociais. E um outro, só para os militantes, que o receberam por e-mail.
Os comerciais falam em “grandeza para vencer os desafios e ampliar as conquistas”, dizem que “o povo sabe o caminho” e que “a hora não é de defender as bandeiras que nos separam, mas a de reunir forças para defender o Brasil”. Em um deles, Rui Falcão diz que “Lula está morando no coração do nosso povo”.
São textos de Rui Falcão ou de Edinho Barbosa? “Tudo é Rui Falcão”, responde Barbosinha. “Nem conheço Edinho”, brinca. E depois fala sério: “Eu estou muito integrado, o Rui escreve muito bem, eu me comporto como um juntador de letrinhas”.
Não achou muito piegas e fora de hora frases como “Lula mora no coração do povo”? “A verdadeira história é feita de bolero, samba-canção e hip hop”, respondeu o marqueteiro. “Tem que ter de tudo um pouco. Tudo é o momento, a verdade da coisa. Se não for de verdade, imprime falsidade”, rimou. “E o momento é muito difícil. Há uma percepção de incredulidade, e, ao mesmo tempo, uma confusão mental muito grande não apenas nos protagonistas do PT, mas uma confusão muito grande em tudo. Tudo está muito confuso. Dr. Eduardo Azeredo (ex-governador de Minas Gerais pelo PSDB) condenado a 20 anos de cana? Como é que pode? Dr. (Fernando) Capez (presidente da Assembleia de SP e deputado pelo PSDB) suspeito de trambicar a merenda dos meninos? Que p*** é essa?”.
O marqueteiro explicou a mensagem que deseja passar em seus comerciais para o PT: “É uma conversa no sentido de os caras ajustarem a política. O tiroteio foi muito excessivo, está tudo muito excessivo, e a racionalidade das coisas exige que todo mundo baixe a bola. Se essa turma do PT tiver realmente maturidade, capacidade política de articulação, pode se dar aí para a presidente Dilma três anos de estabilidade, e então lidar com eleições qualificadas em 2018”.
Barbosa não conta nada sobre o que vai ao ar no programa do dia 23, mas dá uma ideia do que lhe vai pela alma (se for realmente verdade que os marqueteiros a tem): “O que é essencial, neste instante, é uma conversa do PT consigo próprio. É isso que está no ar. Todos os vídeos novos falam disso. Mesmo o do Rui, em que ele defende o presidente Lula de uma forma assertiva, tudo é com esse espírito. Não dá para desrespeitar tudo o que as pessoas pensam daquilo que de melhor se construiu”.
Depois do programa do dia 23, o PT fará, no dia 27, sua festa de aniversário, no Rio de Janeiro, com reunião do diretório nacional. “É fundamental, neste momento, que eles unifiquem a casa, harmonizem as relações externas, tenham humildade pra olhar um no olho do outro e ver qual é a responsabilidade daqui para a frente”, disse Barbosa. “Como é que pode falar alguma coisa para os outros partidos, para o País, para o governo, sem ter essa harmonização?”.
Em um de seus comerciais, Barbosa mostra um balé de bandeiras e panos, de cores variadas. A vermelha, cor característica do partido, só aparece em uma bandeira, sem maior destaque na contradança. O marqueteiro comenta: “O vermelho é apenas uma cor, no meio de tantas outras. Uma coisa monocromática é muito chata, sempre foi”. E se empolga: “O PT é o partido das cores. A sociedade é o partido das cores. O Brasil é o partido das cores”. Fez uma pausa, chamou de volta a retórica, e complementou: “É o momento de se pensar no Brasil, as pessoas e a sociedade estão muito distantes de uma reflexão mais profunda, estão muito mais ligadas nesse confronto maluco, nessa espuma de chope que a mídia permite o povo acessar”.
Resultados. A campanha do marqueteiro começou no dia 2, com a mensagem de Rui Falcão aos militantes. Na terça do carnaval, passados sete dias, ele já tinha uma avaliação dos resultados. “Nas pesquisas que eu tenho, o efeito é muito positivo. Produziu raivas incontidas entre os opositores. E fez a dona Maria, as pessoas em geral, voltarem a ter interesse em abrir os ouvidos, em escutar a versão do PT. Mas é claro que não é possível imaginar que meia dúzia de comerciais vão mudar um azedume como esse que está aí.”
A segunda frase inusitada – sobre a vitória de Lula, se a eleição presidencial fosse hoje – surgiu no fim dos 45 minutos da conversa. Barbosa disse, primeiro, voltando a comentar o encontro com o Cassius Clay da caatinga, que não o sentiu “muito preocupado” com a eleição de 2018. “Ele está mais preocupado é com o País, com a governabilidade, com a estabilidade do estado de direito democrático”, perorou. “Se tivesse eleição hoje, o Lula ganharia, total. Seria muito mais fácil do que em 2018. Seria uma porrada só, não tinha nem discussão.”
Mas as pesquisas não estão dizendo o contrário? “Nada”, respondeu. “Pesquisa em cima do que não existe não vale nada. É prestidigitação. Parou-se o País numa maluquice esquizofrênica, como se fosse uma Câmara de Vereadores comandada por Eduardo Cunha (presidente da Câmara dos Deputados), num contrassenso total.”
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