Município de João Lisboa é condenado a reduzir carga horária de servidora que tem filha com Síndrome de Down
O Poder Judiciário de João Lisboa, através da 1ª Vara, julgou procedente o pedido de uma servidora municipal no sentido de reduzir em 50% a carga horária de trabalho para que ela possa ter mais tempo com a filha, portadora de Síndrome de Down. A sentença foi proferida pelo juiz Glender Malheiros, titular da unidade judicial. No documento, ele determina que o Município proceda à redução da carga horária de 20 horas para 10 horas semanais, sem redução na remuneração e sem obrigação de compensação de horário a partir da intimação da sentença.
O caso em questão trata-se de ação com pedido de antecipação de tutela em face do Município de João Lisboa, na qual a parte autora, servidora pública municipal, pleiteou redução da jornada de trabalho em 50% por ser genitora de filha portadora de Síndrome de Down e cardiopatia. No pedido, ela argumentou ser professora municipal, no setor de educação infantil, com carga horária de 20 horas semanais, conforme comprovou com documentos anexos ao processo.
Narrou que no dia 27 de novembro de 2021, nasceu sua filha B. C. M., que foi diagnosticada com Síndrome de Down e cardiopatia congênita, conforme relatório médico em anexo. A criança necessita de acompanhamento multidisciplinar para o desenvolvimento cognitivo. O acompanhamento que foi aconselhado por laudo médico consiste em apoio para reabilitação com equipe multidisciplinar, formada por Psiquiatra, Fisioterapeuta, Fonoaudióloga, Psicóloga e Serviço social, e em todas as atividades, destacou que a presença da mãe é imprescindível para o bom desenvolvimento da criança.
Por tais motivos a autora solicitou em 25 de fevereiro deste ano a redução de sua carga horária sem redução de seus vencimentos, o pedido foi indeferido em razão de não haver previsão legal para tanto. Daí, resolveu entrar na Justiça. Citado, o réu deixou escoar o prazo para contestação, o qual, embora tenha sido lançado de forma equivocada como sendo de 15 dias, foi-lhe efetivamente concedido 30 dias, conforme consta no processo. s expedientes desse processo. “No caso, a matéria comporta julgamento antecipado do mérito (…) A norma prescrita em artigo do Novo Código de Processo Civil permite ao juiz julgar antecipadamente o mérito em casos de revelia”, observou o magistrado.
E prosseguiu: “A insurgência da autora tem por fundamento tão somente a ausência de previsão legal no Estatuto dos Servidores Municipais de diminuição de carga horária em 50% para tratamento de saúde de familiares (…) Ocorre que, a inexistência de dispositivo específico acerca da redução da jornada laboral de servidor com filho portador de necessidades especiais não pode constituir óbice ao exercício do direito em questão, sobretudo porque o interesse ora tutelado, seja da criança ou adolescente ou da pessoa com deficiência, é expressamente protegido pela Constituição Federal e, inclusive, respaldado pela Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência”.
O juiz entendeu que, ante a omissão verificada na legislação municipal, impende seja aplicado no caso concreto o tratamento diferenciado que requer a situação narrada nos autos como forma de materialização do princípio da igualdade material assentado na Constituição Federal. “É evidente que o fator invocado pela autora autoriza o tratamento diferenciado em seu favor (…) O legislador pátrio desde a promulgação da Constituição Federal de 1988 vem positivando, sem restrições, a doutrina da proteção integral à criança e do adolescente como um todo”.
CONVENÇÃO INTERNACIONAL
Seguiu explicando na sentença que as crianças portadoras de necessidade (deficientes) receberam atenção especial por parte do Congresso Nacional Brasileiro, quando este aprovou, por meio do Decreto Legislativo nº 186, de 09 de julho de 2008, a ‘Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência’ e seu ‘Protocolo Facultativo’, assinados em Nova York, em 20 de março de 2007.
“A Convenção citada tem o propósito de promover, proteger e assegurar o exercício pleno e equitativo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais para todas as pessoas com deficiência, bem como a acessibilidade aos meios físico, social, econômico e cultural, à saúde, à educação e à informação e comunicação e promover o respeito pela sua dignidade inerente, sem qualquer tipo de discriminação”, observou.
Por fim, o juiz ressaltou que, diante da omissão do Estatuto dos Servidores Municipais e dos tratados internacionais de direitos humanos que asseguram acessibilidade e dignidade para as pessoas portadoras de necessidades especiais, entende-se que o direito da servidora e da criança merece integração motivo pelo qual deve ser invocada a analogia às normas do Estatuto dos Servidores Públicos Federais que tratam sobre a matéria e asseguram horário especial aos servidores portadores de deficiência física, independente de compensação de horário e de desconto de vencimentos nos termos de artigo da Lei nº 8.112/90.
“Tal direito ao horário especial é extensivo aquele servidor que possui cônjuge, filho ou dependente portador de deficiência física, independente de compensação de horário e do recebimento de remuneração equivalente à jornada integral (…) A manutenção da remuneração da autora, outrossim, justifica-se pela necessidade de assegurar a subsistência da servidora e de sua família, atendendo, desse modo, ao princípio constitucional da dignidade da ‘pessoa humana’ e seus desdobramentos”, finalizou o magistrado, citando decisões semelhantes proferidas por outros tribunais.
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