Muito além do tríplex: o que mais pesa contra o ex-presidente Lula na Justiça
Condenado em segunda instância a 12 anos e um mês de prisão no processo da Operação Lava Jato que trata do tríplex do Guarujá, decisão que deve levá-lo à prisão e pode deixá-lo de fora das eleições de outubro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) responde por quatro tipos de crime em outros seis processos na Justiça: corrupção passiva, lavagem de dinheiro, organização criminosa e tráfico de influência. Contabilizadas todas as ações, o petista é acusado de receber cerca de 40 milhões de reais em propina, pessoalmente ou em seu benefício.
Além destes processos, nos quais o ex-presidente é réu e será levado a julgamento, há duas denúncias da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra ele ainda sem decisão dos juízes responsáveis. Entenda abaixo do que trata cada uma das ações:
Tríplex do Guarujá (Lula foi condenado)
Nesta ação penal, que trata do tríplex no Guarujá, que, segundo a acusação, foi doado e reformado pela OAS, Lula foi condenado em primeira e segunda instâncias pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Em julho de 2017, Sergio Moro sentenciou o petista a nove anos e seis meses de prisão, pena que passou a 12 anos e um mês de prisão após o julgamento na segunda instância, a 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), em 20 de janeiro de 2018. Com a decisão unânime dos desembargadores João Pedro Gebran Neto, Leandro Paulsen e Victor dos Santos Laus, membros do colegiado, Lula fica inelegível, com base na Lei da Ficha Limpa, e deve ser preso.
O Ministério Público Federal acusa o ex-presidente de ser o “chefe” do esquema de corrupção montado na Petrobras e de participar, em parceria com a OAS, do desvio de mais de 87 milhões de reais dos cofres da estatal. De acordo com a denúncia, o petista recebeu 3,7 milhões de reais em vantagens indevidas pagas pela empreiteira, divididas entre o tríplex e o custeio do armazenamento do acervo presidencial de Lula pela empreiteira. Lula foi absolvido no caso do acervo e condenado no do imóvel no litoral paulista, que, reformado, passou a valer 2,2 milhões de reais.
Imóveis comprados pela Odebrecht (Lula é réu)
Também sob responsabilidade de Sergio Moro, este processo tem Lula entre os acusados pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro por supostamente ter recebido propinas de 13 milhões de reais da Odebrecht.
Parte do dinheiro – 12,4 milhões de reais -, sustentam os procuradores, teria sido gasto na compra de um prédio que abrigaria o Instituto Lula em São Paulo – a sede da entidade, no entanto, foi construída em outro endereço. Mais 504.000 reais teriam sido usados na compra da cobertura vizinha à de Lula no edifício Hill House, em São Bernardo do Campo (SP). As duas aquisições teriam sido feitas por laranjas: no caso do imóvel na capital paulista, o empresário Demerval Gusmão e a sua DAG Construtora; no caso da cobertura do ABC paulista, Glaucos da Costamarques, primo do pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula. O petista nega todas as acusações.
Além de Lula, serão julgados nessa ação penal Gusmão, Costamarques, o empreiteiro Marcelo Odebrecht, o ex-presidente da Odebrecht Realizações Imobiliárias Paulo Baqueiro de Melo, o ex-ministro Antonio Palocci e seu ex-assessor Branislav Kontic, e o advogado Roberto Teixeira, compadre e advogado do ex-presidente.
O processo que trata da suposta propina da Odebrecht é o próximo envolvendo o ex-presidente a ter um desfecho na Justiça. Já foram ouvidas testemunhas de acusação, de defesa e os réus, incluindo o ex-presidente. As fases seguintes são as de alegações finais de defesa e acusação e, enfim, a sentença, condenando ou absolvendo os réus.
Sítio em Atibaia reformado por empreiteiras (Lula é réu)
Ainda na Lava Jato do Paraná, Moro aceitou outra denúncia que a força-tarefa da Lava Jato contra Lula. O ex-presidente é acusado dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso envolvendo obras no sítio Santa Bárbara, em Atibaia (SP), frequentado pelo petista e sua família e reformado pelas empreiteiras Odebrecht, Schahin e OAS.
De acordo com os procuradores, o ex-presidente foi beneficiado ilicitamente com cerca de 1 milhão de reais nas reformas, que incluíram a construção de anexos e benfeitorias no sítio, como a instalação de uma cozinha de alto padrão. Odebrecht e OAS teriam arcado com 870.000 reais das obras e a Schahin, por meio de José Carlos Bumlai, teria pago 150.500 reais. O pecuarista também é réu pelo crime de lavagem de dinheiro.
O dinheiro teria sido retirado, no caso da Odebrecht, de propinas de 128 milhões de reais em quatro contratos com a Petrobras: dois para construção da refinaria Abreu e Lima (RNEST), em Pernambuco, e dois do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj); no caso da OAS, o dinheiro teria sido contabilizado em vantagens indevidas de 27 milhões de reais pagas sobre três contratos: de construção e montagem dos gasodutos Pilar-Ipojuca e Urucu-Coari e da construção do Novo Centro de Pesquisas da Petrobras (Novo Cenpes), no Rio.
Também são réus no processo os empreiteiros José Adelmário Pinheiro Filho, conhecido como Léo Pinheiro, Marcelo Odebrecht e Emílio Odebrecht, o ex-executivo da OAS Agenor Franklin Magalhães Medeiros, os ex-executivos da Odebrecht Alexandrino Alencar, Carlos Armando Guedes Paschoal e Emyr Diniz Costa Júnior, o ex-engenheiro da OAS Paulo Roberto Valente Gordilho, o ex-assessor especial da Presidência Rogério Aurélio Pimentel, o advogado Roberto Teixeira e Fernando Bittar. Este processo está na fase de oitivas de testemunhas.
A compra do silêncio de Nestor Cerveró (Lula é réu)
Lula é réu em três ações penais na Justiça Federal em Brasília. A primeira delas foi aberta em julho de 2016 pelo juiz Ricardo Soares Leite, que aceitou denúncia do MPF contra o petista pelo crime de obstrução de Justiça por supostamente ter orquestrado as ações que tentaram comprar o silêncio do ex-diretor da área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró.
A acusação de que o ex-presidente havia atuado para impedir um acordo de delação premiada de Cerveró tinha sido feita pelo ex-senador Delcídio do Amaral(ex-PT). Em setembro de 2017, contudo, o MPF, que representa a acusação no processo, pediu a absolvição de Lula e do banqueiro André Esteves. Para o procurador Ivan Cláudio Marx, Delcídio mentiu “sobre fatos que levaram à abertura da ação penal contra sete pessoas”.
Na alegação enviada ao juiz, o procurador refez a forma como ocorreu o fato que gerou a denúncia: o pagamento de 250.000 reais para que Cerveró não firmasse acordo de delação premiada ou, caso fizesse, protegesse Delcídio. Ele concluiu que não há provas de que Lula e Esteves participaram dos supostos crimes. “Ao contrário do que afirmou Delcídio – tanto na colaboração quanto no depoimento dado à Justiça -, o pretendido silêncio de Cerveró, que à época cumpria prisão preventiva, não foi encomendado ou interessava a Lula, mas sim ao próprio senador”, disse o MPF.
Favorecimento à Odebrecht no BNDES (Lula é réu)
Em ação penal que corre na Justiça Federal em Brasília a partir da Operação Janus, o juiz federal Vallisney de Souza Oliveira abriu ação penal contra Lula pela suposta prática dos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro, organização criminosa e tráfico de influência.
O petista é acusado pelo MPF de atuar como lobista da Odebrecht em países da América Latina e da África, onde a empresa tem projetos bilionários financiados pelo BNDES. Formalmente, a empreiteira contratava o ex-presidente para dar palestras nesses países, pelas quais Lula recebeu 7,6 milhões de reais da Odebrecht por meio de sua empresa, a L.I.L.S., e em doações ao Instituto Lula. Outro pagamento ilícito da empreiteira em benefício do ex-presidente teria sido de 7 milhões de reais na contratação da Exergia Brasil, de Taiguara Rodrigues, sobrinho de Lula, para atuar em uma obra em Angola.
São réus nesse processo, além de Lula e Taiguara, o empreiteiro Marcelo Odebrecht, José Emmanuel de Deus Camano Ramos, Pedro Henrique de Paula Pinto Schettino, Maurizio Ponde Bastianelli, Javier Chuman Rojas, Marcus Fábio Souza Azevedo, Eduardo Alexandre de Athayde Badin, Gustavo Teixeira Belitardo e José Mário de Madureira Correia.
Em fevereiro de 2018, o processo aberto contra Lula a partir da Operação Janus foi redistribuído e saiu das mãos do juiz Vallisney Oliveira. A responsável pela ação passou a ser a juíza federal substituta Pollyanna Kelly Maciel Medeiros Martins Alves.
Caças suecos e venda de Medida Provisória (Lula é réu)
Além de Lava Jato e da Janus, Lula é réu em duas ações penais abertas a partir da Operação Zelotes. O juiz Vallisney de Souza Oliveira aceitou denúncia do MPF contra o petista pelos crimes de tráfico de influência, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Os investigadores apuraram que Lula, seu filho Luís Cláudio Lula da Silva e os consultores Mauro Marcondes e Cristina Mautoni participaram de negociações irregulares no contrato de compra de 36 caças Gripen, da empresa sueca Saab, e de uma Medida Provisória para prorrogação de incentivos fiscais para montadoras de veículos. Segundo o MPF, Luís Cláudio recebeu 2,5 milhões de reais da empresa dos consultores por serviços que eram fictícios.
Assim como no caso da Operação Janus, esta ação penal também foi redistribuída em fevereiro e não será julgada por Vallisney Oliveira, mas pelo juiz Marcus Vinícius Reis Bastos.
Propina para viabilizar Medida Provisória (Lula é réu)
O outro processo contra Lula no âmbito da Zelotes foi aberto em 19 de setembro de 2017 pelo juiz federal Vallisney Oliveira. Os MPF diz que o petista e o ex-ministro Gilberto Carvalho (PT) cometeram crime de corrupção passiva ao pedirem 6 milhões de reais em propinas para viabilizar a elaboração e a edição da Medida Provisória (MP) 471/09, que prorrogou por cinco anos benefícios tributários às empresas do setor automobilístico.
A acusação remete a crimes que teriam sido cometidos em 2009, quando Lula era presidente. De acordo com os procuradores da República Frederico Paiva e Hebert Mesquita, a elaboração da MP envolveu promessas de pagamentos de vantagens indevidas a intermediários do esquema e a políticos. O MPF diz que Lula e Carvalho tinham 10 milhões de reais em propinas para facilitar a aprovação da Medida Provisória, mas a quantia teria sido reduzida para 6 milhões de reais posteriormente.
Outras cinco pessoas foram colocadas no banco dos réus por corrupção ativa: os empresários Carlos Alberto de Oliveira Andrade (Grupo Caoa) e Paulo Arantes Ferraz (MMC – Mitsubishi), o ex-conselheiro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) José Ricardo da Silva, o lobista Alexandre Paes dos Santos e o executivo Mauro Marcondes Machado.
Formação de organização criminosa no PT (Lula foi denunciado)
A Procuradoria-Geral da República (PGR) ofereceu ao Supremo Tribunal Federal (STF), em setembro de 2017, uma denúncia por formação de organização criminosa contra Lula e a ex-presidente Dilma Rousseff, além de outras lideranças petistas. A acusação tem como foco supostos crimes que teriam sido praticados na Petrobras no período entre 2002 e 2016. Segundo o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, os denunciados “integraram e estruturaram uma organização criminosa” que cometeu “uma miríade de delitos, em especial contra a administração pública em geral”.
Também foram denunciados a atual presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann(PR), os ex-ministros Antonio Palocci, Guido Mantega, Edinho Silva e Paulo Bernardo, além do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, preso na Lava Jato.
Segundo Janot, o esquema desenvolvido pelo grupo chega a 1 bilhão e 485 milhões de reais, além de ter contribuído para que o PP desviasse 391 milhões, o PMDB do Senado, 864 milhões, e o PMDB da Câmara, 350 milhões. A denúncia ainda não foi analisada pela Segunda Turma do STF, à qual cabe abrir processos da Lava Jato na Corte.
Obstrução à Justiça no governo Dilma (Lula foi denunciado)
Rodrigo Janot também denunciou Lula e Dilma, em setembro de 2017, pelo crime de obstrução à Justiça. No entendimento do MPF, a nomeação do petista como ministro da Casa Civil, em março de 2016, teve o objetivo de blindá-lo com o foro privilegiado e dificultar as investigações da Lava Jato. O ex-ministro Aloizio Mercadante também foi denunciado.
As acusações foram apresentadas ao STF, mas o ministro Luiz Edson Fachin, relator da operação no STF, decidiu enviá-la à primeira instância, na Justiça Federal de Brasília.
Com a nomeação para ministro, Dilma tentava resolver duas questões: melhorar a articulação política de seu governo, que estava em crise — dois meses depois, ela seria afastada do cargo –, e, tão importante quanto, garantir foro privilegiado a Lula, que duas semanas antes havia sido alvo de uma condução coercitiva determinada por Sergio Moro.
Uma liminar do ministro Gilmar Mendes, do STF, no entanto, suspendeu a posse de Lula, por entender que a nomeação teve o objetivo de retirar a competência de Moro e levar os processos contra o petista para o Supremo. O ex-presidente nunca chegou a ocupar efetivamente o cargo de ministro. (Veja)
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