Marlon Reis: Prescrição ameaça Lava Jato no STF
Jurista, advogado e um dos autores da Lei da Ficha Limpa, o ex-juiz Marlon Reis diz acreditar que o volume de inquéritos abertos pelo ministro Edson Fachin –e as consequentes denúncias que devem ser feitas ao STF (Supremo Tribunal Federal)– serão um desafio inédito para a Corte. Não só pela quantidade de ações, mas pelo risco de prescrição de casos –já que há denúncias em que os crimes ocorreram há mais de uma década. “Esse é o grande problema”, avalia.
Reis acredita que o Judiciário precisará dar uma resposta à sociedade, nem que para isso seja preciso contar com convocação de juízes auxiliares. “Impunidade e morosidade –que são irmãs siamesas– precisam acabar no Brasil”, diz.
Ainda segundo o jurista, a publicidade das investigações é importante para o controle social da Lava Jato. Ele defende que esse é o momento ideal para o país cobrar o fim do foro privilegiado para autoridades –e assim garantir julgamentos mais céleres.
Marlon Reis deixou a carreira no Poder Judiciário e abriu um escritório de advocacia em Brasília. Entre seus clientes está a Rede Sustentabilidade, partido que tem como maior líder a ex-senadora Marina Silva. Segundo o jornal Folha. de S.Paulo, a Rede pode lançar a candidatura de Reis ao Senado pelo Estado do Maranhão no próximo ano.
Veja a entrevista na íntegra:
UOL – O vazamento dos inquéritos após delações da Odebrecht antes da divulgação oficial ameaça a legalidade da ação?
Marlon Reis – Não, de maneira alguma. Esses dados são consistentes em documentos, e muitos deles foram entre entregues junto com a delação. É preciso dizer que a delação não consiste só em um depoimento, pressupõe a entrega de provas à Justiça. Ao contrário, acho que deveria haver mais transparência nas investigações, e isso poderia abrir esse caminho. O ideal é que essas investigações ocorram com acompanhamento público.
E a publicidade pode atrapalhar de alguma forma a investigação?
Creio que não por causa da fase. Se fosse algo anterior às delações, o prejuízo poderia ser grande. Mas em se tratando de uma fase de delações, com entrega de provas, o prejuízo –se houver– será mínimo.
O STF é conhecido por ser lento em apreciar processos, e agora se depara com uma enorme quantidade de casos. Como o senhor acha será o trâmite?
O grande problema é a prescrição. Está mais que demonstrado que é preciso dar fim ao foro privilegiado.
No STF tem processo que tramita há mais de 10 anos e não tem esperança de solução imediatada. Isso precisa ser resolvido, e melhor meio não há que a sociedade continuar pressionando pelo fim do foro privilegiado.
O primeiro grau garante mais velocidade, mas há vários tipos de recursos que impendem a efetividade da punição…
Mas é diferente. A vantagem é que os tribunais já recebem o processo para analisar em grau de recurso e não precisa mais produzir provas: é só analisar se foi correto ou não. É possível julgar, mas rápido. E o juiz do primeiro grau tem mais costume com a realização de audiências e para produzir esse tipo de prova. Ou seja, é mais do cotidiano dele, e faz com que o juiz solucione de forma mais rápida.
O número de inquéritos autorizados pelo ministro Fachin surpreendeu?
O número é grande, mas não chega a surpreender porque há muito tempo se aguardava uma grande delação da Odebrecht. No geral, os nomes também não causam surpresa.
O senhor defende o afastamento de algum chefe de poder ou parlamentar investigado?
Aí vai depender do caso. Aqueles que vierem a criar algum tipo obstáculo ao processo, devem ser imediatamente afastados. Mas deve ser analisado caso a caso. O inquérito em si não é um problema para afastar ninguém, mas com a denúncia recebida, eu venho defendendo há tempo, elaboramos a tese de que réus não podem ocupar presidências no Congresso porque estão na linha de sucessão [da Presidência da República].
O senhor acha que Temer pode ser investigado, já que foi citado?
A meu ver, a Constituição é clara sobre a impossibilidade dessa investigação seguir contra um presidente. Mas isso não o livrará dessas questões: tão logo termine o mandato presidencial, não outro mandato, ele terá de responder. Caso ele seja eleito em 2018 para outo cargo, ele terá que responder assim que deixar a Presidência.
Na lista, temos temos os presidentes do PMDB (Romero Jucá) e PSDB (Aécio Neves) como campeões em inquéritos. Como os partidos ficam nisso tudo?
Os partidos precisam ser mais cobrados, ter mais transparência e democracia interna. Eles ganharam uma liberdade imensa após o término da ditadura porque eram cerceados. Mas agora eles precisam de controle, não o controle antidemocrático daquela época, mas precisa de um controle social.
Acha que vêm mais delações bombásticas ainda?
Tem sim! Basta lembrar personagens como Eduardo Cunha, que já anda ensaiando algumas ameaças. Ele seria capaz de fazer uma delação mais bombástica que essa da Odebrecht.
E a Justiça vai dar conta a tantas denúncias?
Tem que dar, tem que se adaptar. Se necessário, tem que convocar apoio, designar juízes auxiliares; mas a impunidade e morosidade –que são irmãs siamesas– precisam acabar no Brasil.
O senhor acha que esse momento deveria contar com uma participação mais ativa da população?
Em primeiro lugar, as pessoas têm o direito e o dever de responder no voto, ano que vem, a esse graves escândalos. Será dada uma oportunidade muito grande para a sociedade brasileira fazer uma verdadeira faxina nos Poderes Legislativo e Executivo. Por conta disso tudo, a sociedade está novamente fazendo um levante cívico, coletando assinaturas para um projeto de lei de iniciativa popular, o primeiro projeto de lei popular feito de forma eletrônica do mundo. O objetivo dele é justamente atacar o motivo da corrupção: eles desviam verbas para comprar lideranças políticas, e assim garantem a eleição. Então, estamos atacando diretamente o ponto eles querem chegar, que é na compra do apoio politico. Tem toda conexão com o momento do país. (UOL)
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