Flávio Dino fala em restrição de horários, novo decreto sobre acesso a armas e regular clubes de tiro
Escolhido pelo presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, para comandar o ministério da Justiça e Segurança Pública, o senador eleito Flávio Dino (PSB-MA) diz ao GLOBO que está trabalhando em uma proposta para regular os clubes de tiro, com fixação de horário e controle de frequentadores. Dino ainda afirma que recebeu a missão de Lula de se aproximar de policiais e que colocará na mira de investigações quem confundir função pública armada com politização. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Acesso a armas
“Ainda em dezembro, por volta do dia 27, vou apresentar ao presidente a minuta do decreto. É claro que ele vai estudar com a Casa Civil, com a AGU (Advocacia-Geral da União) e com a sua assessoria. Caberá a ele decidir. Vou apresentar uma proposta de novo decreto para não ficar um vazio normativo. Não basta revogar o entulho autoritário e desvairado que foi editado nessa área. Na nossa visão, deve ser também colocada no lugar uma nova regulamentação. São normas para o futuro, pondo fim ao ‘liberou geral’, sobretudo ao que se refere a armas de uso restrito. São regras de funcionamento dos clubes de tiro e normas sobre o arsenal existente como, por exemplo, encurtando prazos de registros de arma. As linhas gerais do decreto passarão por esses três eixos.”
Clubes de tiro
“É preciso que haja regulação. Um clube de tiro tem que ter fiscalização, porque é uma atividade de altíssimo risco. Uma coisa é a regulação sanitária de alguém que vende fruta, que é feita para que o produto não chegue estragado à população. Há também regulação para farmácias. Os clubes de tiro têm que ser regulados, com uma regulação firme e clara: fixar horários, cadastro público de quem frequenta, colocar fim ao funcionamento 24 horas, porque isso não faz sentido e é perigoso para a sociedade.”
Missão dada por Lula
“A primeira prioridade é a segurança pública. O presidente me orientou: ‘Flávio, cuide da segurança pública e se aproxime das polícias’. A segunda grande prioridade é a questão de consumidor e cidadania, de modo geral. E a terceira é o diálogo com Congresso, Judiciário e Ministério Público.”
Mudanças na PRF
“O primeiro passo é encontrar um bom dirigente, com perfil similar ao do doutor Andrei (Rodrigues), futuro diretor-geral da PF, ou seja, alguém que tenha experiência, trajetória e que, portanto, tenha autoridade moral na instituição. Quero concluir esse processo de escolha até o dia 20 deste mês. Tem uma lista de pelo menos seis possíveis candidatos. Do ponto de vista programático, da gestão, a principal questão é fazer que a PRF volte à sua missão precípua, que é garantir a segurança viária. Avaliamos que a PRF foi indevidamente utilizada para funções que não têm amparo constitucional.”
Politização de policiais
“Vamos separar o joio do trigo. Temos que ter uma agenda de trabalho forte, com itens que hoje são prioridade, como Amazônia, a questão ambiental e crimes digitais, áreas em que vamos posicionar a direção da PF. Acho que não teremos problema de sublevação tanto na PF quanto na PRF. Se alguém eventualmente seguir confundindo função pública armada com ideologização e com politização, essa pessoa está cometendo uma infração à lei. Quem não se enquadrar naquilo que a lei manda terá o tratamento que a lei manda. É muito simples. Esse é o caminho certo a todas as pessoas, principalmente com uma corporação armada que precisa, visceralmente, de conceitos como hierarquia e disciplina. Se não, essa instituição degenera.”
Investigação de Bolsonaro
“Não vai haver orientação nem para favorecimento, tampouco para perseguição. Justiça é uma necessidade e não se confunde com vingança e perseguição. A PF estará a serviço da Justiça, e a orientação é a aplicação da lei. Não pode ter proteção, fraude, conivência e condescendência. Por outro lado, não vai haver nenhum tipo de delírio persecutório, inclusive contra a família Bolsonaro. A PF não pode ser instrumento de espetáculo e linchamento midiático. Policial deve agir com sobriedade, isenção e discrição. Se ele tem intuito de ficar sob holofote, deve ir para atividade política ou para atividade artística.”
Indicações para o STF
“A partir de 1º de janeiro, serei assessor do presidente, o dono das decisões. Estarei próximo para ajudar e para sugerir, de acordo com a vontade do presidente Lula. Conheço bastante a comunidade jurídica, tenho 32 anos de atuação profissional nos três Poderes, conheço bastante gente e, por isso, claro, vou opinar, sim. Mas a decisão é do presidente Lula. Vejo muito positivamente o fato de vermos tantos nomes bons com meses de antecedência. Não acredito que haverá grandes surpresas em relação a isso. O lado positivo é que há ótimos nomes. Cristiano Zanin (advogado de Lula) é um excelente nome e há outros possíveis.”
Relação com o Judiciário
“Houve um marco histórico de virada de página que foi a visita do presidente Lula ao Supremo, ocasião na qual se mostrou que há uma fidelidade aos dois atributos que a Constituição fixa como definidores da relação entre os Poderes: independência e harmonia. Independência, porque cada um tem que respeitar o papel do outro. Harmonia, porque todos devem remar na mesma direção. É em torno dessa agenda que pretendo trabalhar. Já visitei nos últimos dias quatro ministros do Supremo e vou seguir visitando para tratar de informações importantes que dizem respeito às políticas públicas. Nada sobre julgamento do Supremo.”
Orçamento secreto
“O Supremo começou o julgamento, mas acho que não vai se concluir na próxima semana. De modo geral, penso que o ideal é que o Congresso, em primeiro lugar, e, eventualmente, o próprio Supremo encontrem uma forma de pôr fim a essa anomalia de sigilo quanto à aplicação de verbas públicas. O Congresso deveria buscar isso com urgência. Se o Congresso não caminhar nessa direção, evidentemente, haverá conclusão do julgamento do Supremo, e os ajustes necessários deverão ser feitos.”
Destino do Coaf
“O Coaf (órgão de combate à lavagem de dinheiro) não deve ficar no Banco Central (BC) por uma questão simples: o BC é uma autarquia independente. O Coaf está subtraído da gestão do Poder Executivo no que se refere às suas decisões. O Coaf não pode ficar no BC. Tanto pode voltar para Justiça quanto ficar na Fazenda. Essa mudança será feita, e o arbitramento caberá ao presidente.”
Acordos de leniência
“A legislação não está entre as prioridades, mas pode haver discussão. Um exemplo: a empresa celebra acordo de leniência e reconhece que deve um R$ 1 bilhão aos cofres públicos. Esses recursos, a meu ver, poderiam ser pagos em dinheiro, mas também em serviços. É uma possibilidade.” (O Globo)
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