Especialistas não descartam falha elétrica na queda de avião
Após 2h55 de voo e a 15 mil pés (4,7 mil metros), na madrugada desta terça-feira, a aeronave Avro RJ85 da empresa LaMia, que levava o time da Chapecoense para Medellín, deixou de transmitir sua posição, sumiu do mapa. A ausência de informações com o avião ainda no ar chamou a atenção de especialistas, assim como o fato de que os destroços do avião, que caiu na madrugada de ontem, na cidade de La Unión, na Colômbia, estavam concentrados em uma pequena área. Além disso, não foi encontrado pelas autoridades locais nenhum sinal de incêndio nem de explosão o que sugere que o avião tinha pouco ou nenhum combustível.
Segundo o jornal colombiano “El Tiempo”, a investigação, conduzida pela Aeronáutica Civil da Colômbia, indica que quatro voos se aproximaram quase ao mesmo tempo do aeroporto de Medellín. A prioridade foi dada a um voo da companhia Viva Colombia, que reportou falta de combustível. Somente depois é que a torre de comando foi informada pela tripulação que o voo da Chapecoense sofria o mesmo problema.
— Lamentavelmente, enquanto não sei a emergência, não posso dar a prioridade que a tripulação necessita — justificou o presidente da Associação dos Aviadores da Colômbia, Jaime Alberto Sierra, referindo-se ao trabalho dos controladores de voo. — Nossa hipótese é que houve falta de combustível.
O general Gustavo Vargas, diretor da Lamia, admitiu que o plano de voo previa parada em Cobija, na Bolívia, ou em Bogotá, em caso de necessidade de reabastecimento. Segundo ele, o piloto Miguel Quiroga, que também era dono da Lamia, não parou nem em Cobija, nem em Bogotá.
— Ele tinha que ver a possibilidade de seguir ou aterrissar em Bogotá. E por essa negação do Brasil (a Anac não autorizou o voo direto de São Paulo a Medellín) complicou um pouco. Mas, pelo visto, se continuou é porque podia — disse Vargas, ao “El Tiempo”, destacando que esse voo já havia sido realizado duas vezes, sem informar se houve reabastecimento.
Segundo dados da fabricante original da aeronave, a empresa British Aerospace, a autonomia de viagem deste aparelho é de 2.963 quilômetros (1.600 milhas náuticas). E a distância aproximada entre as duas cidades é superior, cerca de 2.985 quilômetros (1.612 milhas náuticas), conforme aplicativo Airplane Manager, usado por pilotos para cálculo de percurso. Não foi informado ainda se o avião contava com tanques auxiliares, que podem ter sido acrescentados ao modelo original.
O avião deu duas voltas antes de desaparecer. Esse procedimento, chamado de órbita, é padrão e usado para a espera de autorização de pouso, para a descida em si (em aeroportos menos equipados ou em área de difícil acesso) ou ainda para o piloto ganhar tempo para resolver algum problema detectado. Assim, pane elétrica não é descartada.
FORA DO RADAR
Jorge Barros, piloto da reserva da Força Aérea Brasileira (FAB) e que já trabalhou para o Centro de Investigações e Prevenção de Acidentes (Cenipa), acredita em falha de funcionamento grave, algo raro.
— O avião sumiu ainda no ar. Essa ausência de sinais só ocorre quando há uma batida ou quando ele cai no chão. Ou seja, o avião parou de funcionar a 15 mil pés e os pilotos não puderam fazer nada. Deixaram de ser pilotos e passaram a ser passageiros. E o avião caiu, sem deixar sinal — observa Barros, que explica que é possível planar com falta de combustível. — Existem aviões planadores, sem motor, rebocados na decolagem. Além disso, o avião deve ter caído como paraquedista, queda livre. Quando uma aeronave se acidenta, geralmente cai na horizontal, e vai quicando, deixando pedaços pelo caminho. E não foi o que aconteceu nesse caso.
Outro que levantou a possibilidade de pane elétrica foi o escritor Ivan Sant’Anna, estudioso e autor de livros sobre acidentes aéreos. Para ele, as condições do avião não eram as mais avançadas.
— Era uma aeronave velha, com asa alta e quatro turbinas. Os aparelhos mais novos têm duas turbinas, os motores são mais potentes. Nunca tinha ouvido falar dessa Lamia até os jogadores da Argentina criticarem a mesma aeronave quando voaram para casa, após o jogo contra o Brasil, em Belo Horizonte, no início do mês — lembrou Sant’Anna.
Os aviões Avro RJ 85 deixaram de ser fabricados em 2001. Desde 1983, o modelo foi fabricado com o nome BAe-146 para uso militar e precisava de dois pilotos. Pesado, com problemas de sistema elétrico e hidráulico, saiu de linha.
O exemplar que caiu ontem foi construído em 1999 e tinha quase 18 anos, e passou por diversos donos. Depois do primeiro voo em 26 de abril, foi vendida para a americana Mesaba Airlines. Em 2007, comprada pela irlandesa CityJet. Em 2010, a Cityjet o tirou de circulação. Até que em 2013 foi adquirida pela Lamia — só voou em 2014.
Neste ano, a Lamia encerrou suas operações na Venezuela e investiu na Bolívia, no mercado de frete de times de futebol. Apesar de a frota pertencer à empresa venezuelana, a Lamia se associou a uma incorporadora, de pequeno porte, na Bolívia.
A empresa britânica fabricou 387 aeronaves do modelo BAe, tanto de carga quanto de passageiros. Desses foram 30 acidentes registrados sendo sete deles com vítimas fatais. Ao todo foram 337 mortos nessas ocasiões. (O Globo)
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