Em meio às denúncias em ministério, Flávio Dino aponta os megaeventos como uma chance de reposicionar a imagem do país
Denise Rothenburg e Alana Rizzo no Correio Braziliense
Com a imagem do turismo brasileiro desgastada em duas frentes, o presidente da Embratur, Flávio Dino, trabalha dobrado. Primeiro, tenta por meio de uma auditoria em todos em convênios e mudança de procedimentos, tirar a pecha de uma área corrupta do ponto de vista administrativo. Em segundo lugar, acabar com a ideia de que o país aceita o turismo sexual. Ele esteve inclusive com o ministro da Justiça, Eduardo Cardozo, para pedir à Polícia Federal que passe a monitorar as empresas promotoras desse tipo de turismo, disfarçado de aventura ecológica ou pescaria, como ocorreu recentemente no Amazonas. “Isso é crime e crime é com a polícia. Nossa propaganda não fala mais na beleza do nosso povo”, afirma.
Nesta entrevista ao Correio, ele conta que está empenhado em buscar o que considera sua principal missão: convencer a sociedade brasileira de que a maior batalha da Copa é a da imagem que o país deixará ao mundo. “Temos hoje a imagem de um país festeiro e acolhedor. Se conseguirmos agregar a isso a imagem de eficiência e competência, estaremos cumprindo o maior legado da Copa para a nossa e para, pelo menos, duas gerações. Essa é a nossa batalha”, diz. A seguir os principais pontos da entrevista.
Correio: A operação da PF no Ministério do Turismo e as denúncias afetaram também o trabalho da Embratur?
Flávio Dino: Não houve nada relacionado à Embratur. Evidente que houve um questionamento do modelo e a minha preocupação principal nesse momento é mostrar que uma coisa são as irregularidades que devem ser apuradas, investigadas e combatidas, sobretudo nessas parcerias público-privadas. Outra coisa é o modelo da política pública de turismo. Se tem coisas erradas, devem ser corrigidas. Portanto, determinei uma auditoria aqui na Embratur para apuração. Isso está em curso e termina em 30 dias. O que a gente precisa aperfeiçoar? Primeiro, como essas entidades são selecionadas. Baixei uma portaria para que sejam selecionadas exclusivamente por chamamento público, que é uma espécie de licitação com outro nome, porque o aspecto fundamental é o mesmo: a publicidade e um critério objetivo de seleção para fazer convênios.
No caso da Operação Voucher ficou muito claro que há um novo modelo de fraude baseado em ONGs, que não são mais fantasmas, têm sede e são regularizadas, mas fraudam os contratos.
Por isso, falei de duas coisas que precisam ser melhor reguladas. Uma é a seleção. A segunda é justamente essa: acompanhamento, monitoramento e controle. As fraudes estão em dois âmbitos: na má seleção, de entidades que não têm capacidade de executar o convênio ou, às vezes, nem existem mesmo; e está também nessa necessidade de haver uma prestação de contas mais aperfeiçoada.
O senhor tem braços para isso? O que mais se ouve nos ministérios é que não há gente para controle, para fiscalização…
É um fato. Pedi a colaboração da CGU (Controladoria-Geral da União) e, ao mesmo tempo, estou num movimento no governo para que haja nomeação dos nossos funcionários para recompor as equipes. Temos um concurso já homologado para 84 pessoas. Em termos de servidores efetivos isso vai triplicar o contingente atual da Embratur, uma vez que temos só 40 concursados.
O chamamento público não esbarra ainda nas emendas parlamentares, que já vêm voltadas para determinados institutos, como foi o caso da emenda da deputada Fátima Pelaes?
O Poder Executivo não é obrigado a seguir essa indicação. Qual é a prerrogativa do parlamentar? Alocar o recurso para uma determinada ação ou programa, vinculado a um estado. Disso, o Poder Executivo não pode fugir. Mas ele não é obrigado a dizer se quem vai executar é a entidade x ou y, ou seja, não há incompatibilidade entre emenda parlamentar e chamamento público.
Isso pode causar uma certa indignação dos parlamentares que direcionam as suas emendas?
Acredito que não. É mais uma questão de conversar. A função principal das emendas, que deve ser preservada, é garantir uma alocação de recursos mais democrática, levando em conta a grandeza do Brasil, a sua pluralidade. O que fugir disso, o que visar exatamente a realização de um negócio ilegal, obviamente deve ser combatido por todos, inclusive pelo parlamento.
Qual o orçamento que o senhor tem para tocar esses projetos?
Nas atividades fins da Embratur, temos R$ 180 milhões, de promoção internacional, que é dividida em três mercados: o europeu, o latino-americano e o norte-americano. Há uma rubrica nova, outros mercados, como Oriente Médio e Ásia. Mas as ações principais são concentradas nos três primeiros.
Como está o combate ao turismo sexual no Brasil?
Temos uma distinção: consideramos que sequer isso pode ser classificado como turismo. Isso é crime e, portanto, o nosso tratamento deve ser levando em conta esse conceito. Como não é turismo, é crime, logo, é um assunto de repressão. Da nossa parte, há uma preocupação de dissociar o Brasil dessa imagem, de destino de exploração de mulheres, crianças e adolescentes. Nossa propaganda hoje não tem qualquer tipo de conotação e de apelo para essa dimensão, da beleza do nosso povo.
O senhor tem conversado com o ministro da Justiça ou a ministra Maria do Rosário sobre esse assunto?
Almocei essa semana com o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça). Um dos assuntos foi esse. A Polícia Federal terá orientação específica para monitoramento de empresas brasileiras que atuam nesse setor. No caso da Embratur, o que é crime encaminhamos para a Polícia. Na parte de promoção, deixamos claro que o Brasil não é um destino amigável para esse tipo de conduta.
Por que é tão difícil combater essa ideia e esse crime?
Durante muito tempo, era essa a imagem do Brasil no mundo, de o país da festa, do congraçamento sem fronteiras. A gente lida com a imagem dos outros sobre o Brasil. Os megaeventos são importantes em si mesmos, porque geram empregos e renda. O mais importante é qual a imagem que ficará do Brasil depois dos megaeventos? Nós, Embratur, imaginamos que o nosso objetivo é consolidar essas marcas que o país já conhece, de natureza exuberante, de um povo cordial, amável. Mas, sobretudo, um país eficiente, moderno, competente e realizador. Só durante a Copa, de telespectadores acumulados, serão 26 bilhões de pessoas durante os 30 dias do evento. Com efeito internet, rádio, TV jornal, se a gente falar de 200 bilhões de notícias sobre o Brasil não é absurdo.
Não há temor sobre um caos aéreo, com atraso nas obras em aeroportos?
Tenho absoluta certeza de que não será o caos. E não só de expectativa, de torcida. É científica. O Brasil faz grandes eventos com grande sucesso. Temos que calibrar as expectativas. O legado de imagem, que está para adiante, é uma disputa que valerá por 20, 30, 40 anos. É essa disputa que tenho enfatizado como a principal e deve ser incorporada por toda a sociedade brasileira.
Há pouco tempo, a Argentina recebia mais turistas que o Brasil. Por que não conseguimos atrair estrangeiros por seus resorts?
Primeiro, a localização geográfica. A teoria mostra que o turismo é intrarregional. Cerca de 80% do turismo europeu é feito por nativos. No Caribe, é movimentado por Estados Unidos e Canadá, grandes emissivos. A América do Sul sempre atravessou turbulência política, dificuldades econômicas e uma péssima distribuição de riqueza. Além disso, há as barreiras naturais: A Floreta Amazônica e a Cordilheira dos Andes. Ou seja, o turismo intrarregional na América do Sul nunca foi muito forte. O relatório da Organização Mundial do Turismo, divulgado ontem, mostra que o continente no qual mais cresceu o turismo no mundo foi a América do Sul. Temos problemas de qualificação, de serviços, de produtos. Tudo isso é um desafio permanente. Em 2011, vamos chegar a 5,5 milhões de turistas estrangeiros e US$ 6,5 bilhões de divisas oriundas do turismo. São os melhores números do Brasil, mas aquém do que exportaremos.
E a questão do visto?
Preocupa muito. É uma barreira burocrática, que o próprio trade turístico norte-americano questiona o Departamento de Estado, tendo em vista a importância do Brasil no mercado de lá. A tendência é: ou eliminar ou facilitar. O visto, além de uma barreira burocrática, é uma barreira econômica, porque é caro, custa US$ 130.
E a questão da segurança pública?
Fazemos uma pesquisa com estrangeiros saindo do Brasil. A segurança não figura entre as cinco maiores preocupações. A primeira reclamação é a sinalização turística. Se olharmos Brasília, capital da República, não tem nem uma placa em inglês. A gente não nota, mas eles notam. A segunda, rodovias. Tem ainda idioma e aeroportos.
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