E ficam os (longos) dedos. Coluna Carlos Brickmann
Assim é se lhe parece, diz a deliciosa peça de Luigi Pirandello. Mas a política, território do jogo de sombras, nunca é o que parece.
O poderoso presidente da Câmara, Eduardo Cunha, renunciou ao cargo. Mentiu ao plenário e foi apanhado – o que é quebra de decoro e motivo de cassação. Diz que saiu para que seu processo não mantenha a Câmara paralisada. Mas só saiu porque as chances de perder o mandato cresciam, porque a Procuradoria ameaçava de prisão sua mulher e sua filha, porque é melhor deixar a Presidência do que perder o mandato inteiro, porque é melhor perder os anéis e manter os ágeis dedos em boas condições de uso.
A ex-poderosa presidente afastada, Dilma, em processo de impichamento, trabalha do mesmo jeito: prepara o Programa da Volta, um plano de esquerda para retornar ao poder ao lado de Lula. Mas o laço entre Dilma e Lula era vidro e se quebrou, as chances de a presidente ser desimpichada se reduzem, e que é que ela faria no Governo, se seus aliados mudaram de lado e hoje são Temer desde criancinhas? Voltar-se-iam a ela? Adulá-la-iam – até Meirelles, que era a solução de Lula para a Fazenda?
Lula já não manda na Fazenda, nem no sítio de Atibaia, que diz que não é dele. E essa história de volta é esquisita. Como nos antigos livros, há Moros na costa. O caminho para Atibaia e Guarujá, ou para São Bernardo e o velho sítio Los Fubangos, pode passar por Curitiba.
Melhor não.
O que não parece é
O ex-presidente Lula mudou-se temporariamente para Brasília, no hotel Royal Tulip (que não é dele, eta leitor viciado em pensar maldade!), para comandar a campanha de Dilma contra o impeachment. A equipe de Lula e Dilma inclui personalidades como o senador Roberto Requião, do PMDB do Paraná (e amigo do presidente venezuelano Nicolás Maduro, aquele que vê num passarinho a imagem de seu ídolo Hugo Chávez); o pessoal do PT, do PCdoB (para quem Israel tomou o comando do Governo Temer, com ministros judeus como Raul Jungmann e Sérgio Etchegoyen – ambos, aliás, cristãos), do PSOL, PDT, Frente Povo sem Medo, Frente Brasil Popular.
Mas o objetivo não é ganhar a batalha do impeachment: é mostrar que há disposição de luta. E só. Já está bom demais.
E os papagaios de pirata?
Para ter certeza de que a batalha não é para valer, procure nas fotos da campanha de Dilma os dilmistas de carteirinha. O prefeito paulistano Fernando Haddad; o governador mineiro Fernando Pimentel, amigo de Dilma desde os tempos em que consideravam “companheiros de armas”. O ministro pra qualquer obra Aloízio Mercadante.
As fotos de Dilma, quando as há, estão livres deles. Talvez posem hoje atrás dos ombros de outro personagem bem menos popular do que já foi: Wally, de Onde Está Wally.
O que é …
Um dos articuladores do impeachment foi Paulo Skaf, da Fiesp, que criou os patos infláveis contra a alta dos impostos (“não vou pagar o pato”). Agora o presidente Temer já admite a alta dos impostos para reduzir um pouco o tremendo déficit orçamentário. A CISE, talvez, sobre os combustíveis, que não precisa de aprovação do Congresso. Ou a CPMF, que o pessoal de Dilma tanto defendia.
Problemas? Não: o pessoal de Dilma agora é de Temer. Nem é preciso modificar as ideias de que todos precisam ter múltiplos assessores. Para o Governo, vamos combinar, é mais fácil aumentar impostos do que reduzir despesas. Onde já se viu privar um funcionário de médio escalão de seu carro com motorista?
… mas se disfarça
A campanha “somos contra a alta dos impostos, mas é necessária” já começou: pesquisa patrocinada pela Associação Comercial de São Paulo diz que 77% dos brasileiros acham justo que os mais ricos paguem mais impostos. Aliás, não são bem os mais ricos: são os que têm maiores salários.
As grandes fortunas ficam fora. Rico mesmo é sempre poupado.
Dúvida pertinente
Quem é mais malvado: quem acha que Temer é a cara da Dilma ou quem diz que a Dilma é a cara do Temer?
Assalto triplo
Editorial da Folha de S.Paulo: “O dossiê para a candidatura do Rio continha 1.100 projetos de arquitetura e urbanismo distribuídos em 538 páginas. Foram anexados 130 documentos de garantias que, se empilhados, alcançariam 2,5 metros de altura. Trata-se um monumento representativo do que restará para a cidade após a Olimpíada: mais papel do que legado”.
Tiro ao alvo
A Folha, no editorial, foi desnecessariamente cruel. No balanço de custos e benefícios da ação olímpica oficial, ficará comprovado que tanto papel era não apenas necessário, mas até insuficiente.
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