Disputas regionais travam federações a menos de três meses do prazo final
Com dois meses e meio até o prazo final para o registro para o registro no Tribunal Superior Eleitoral, partidos ainda patinam no debate sobre as federações, uma das principais novidades das eleições deste ano. Diferenças regionais, como disputas para indicar candidatos a governador e divergência sobre apoio na corrida presidencial se tornaram obstáculos para que as alianças sejam fechadas tanto entre legendas de esquerda quanto de centro.
Um dos casos que está “travado” é a eventual aliança entre PT e PSB, que ainda discutem quem terá o direito de indicar o candidato ao governo de São Paulo, Pernambuco e mais quatro Estados. As discordâncias também acontecem em outros grupos que querem se aliar, como PSDB e Cidadania, e até entre membros do mesmo partido, caso do PV.
Diferentemente das coligações – proibidas nas eleições proporcionais já em 2020 -, as federações vão muito além da disputa eleitoral: criam uma “fusão” temporária entre as siglas envolvidas, que precisam permanecer unidas por pelo menos quatro anos. De acordo com o calendário do TSE, partidos e federações que tenham o desejo de participar das eleições de 2022 precisam estar registrados até 2 de abril deste ano, seis meses antes do primeiro turno da eleição presidencial. O apoio às candidaturas ao Planalto, contudo, tem mais tempo para ser discutido, até 15 de agosto.
O presidente do Cidadania, Roberto Freire, afirmou que as conversas com o PSDB, que começaram ainda no ano passado, estão avançando e que o tema será debatido nas próximas reuniões do diretório e executiva nacionais da sigla. “Estive com Bruno Araújo (presidente do PSDB) e os nossos respectivos secretários-gerais estão analisando todos os Estados, suas convergências e seus problemas”, disse ao Estadão. “Há boa perspectiva, mas nada ainda definido.”
O principal entrave está na Paraíba, onde o PSDB faz oposição a João Azevedo, único governador filiado ao Cidadania e que concorrerá à reeleição. Em dezembro, os tucanos aprovaram a pré-candidatura de Pedro Cunha Lima ao governo estadual, deputado federal e filho do ex-senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB).
Questionado sobre a discordância entre as duas legendas no Estado, o presidente nacional do PSDB afirmou que a federação “é possível”, mas deixou claro que os debates precisam ser aprofundados. “Os partidos estão iniciando as conversas”, disse.
O senador Alessandro Vieira, pré-candidato do Cidadania à Presidência, afirmou desconhecer o debate sobre a federação: “Não existe nenhuma discussão interna sobre isso. É preciso estabelecer critérios”. Um dos efeitos da formalização do grupo seria o apoio do partido ao PSDB, que apresentou o nome do governador de São Paulo, João Doria, ao Palácio do Planalto, e a consequente retirada de Vieira do páreo.
Apesar dos pontos de divergências, a união seria vantajosa para os dois partidos no Congresso. Os tucanos têm perdido representação na Câmara. Com 29 deputados federais eleitos em 2018, a legenda costumava formar uma bancada de 50 a 60 nas legislaturas anteriores. Já o Cidadania elegeu apenas 8 deputados na última eleição.
A exemplo das coligações, a federação obriga que os partidos atuem em conjunto no período eleitoral, inclusive somando os votos para conquistar mais vagas na Câmara e nas assembleias. A nova regra foi aprovada pelo Congresso em setembro do ano passado e é vista como uma espécie de “bote salva vidas” de partidos pequenos ameaçados de extinção.
Com a criação da cláusula de desempenho, que determina uma votação mínima para os partidos terem acesso ao fundo eleitoral e tempo de propaganda de rádio e televisão, e o fim da coligação para as eleições proporcionais, legendas como Rede, PCdoB, PSOL, PV e Cidadania viram na federação uma maneira de garantir a sobrevivência. Na eleição de 2022, para atingir a cláusula de desempenho, as siglas terão que eleger pelo menos 11 deputados federais.
Já PT, PSB e PSDB, que não estão ameaçados de ficar sem o fundo e o tempo de propaganda, usam as alianças com outros partidos como forma de ampliar as bancadas no Congresso.
Mudança
Em relação ao PV, que elegeu apenas quatros deputados em 2018, o partido tem procurado se distanciar do centro e da centro-direita e agora age por uma aproximação com a esquerda. Em 2014, a sigla declarou apoio a Aécio Neves (PSDB) contra Dilma Rousseff (PT) no segundo turno da eleição presidencial, mas agora anunciou apoio a Lula para 2022.
Tradicional aliado do PSDB em São Paulo, tendo inclusive assumido a Secretaria do Meio Ambiente em gestões tucanas no governo estadual, o presidente nacional do PV, José Luiz Penna, justificou a mudança de posição. “O PSDB hoje é outra coisa. Nunca tivemos essa aliança automática. Na última vez nós tivemos candidato ao governo (de São Paulo). Sempre preservamos a nossa identidade”, afirmou.
O apoio ao PT, no entanto, não é unanimidade no PV. O ex-deputado Eduardo Jorge, que foi candidato a presidente pela sigla em 2014, se manifestou nas redes sociais contra a formação da aliança e anunciou que vai tentar fazer a legenda mudar de ideia até a convenção que definirá a posição presidencial, prevista para acontecer entre julho e agosto.
Penna descarta uma mudança de posição e diz que há maioria para aliança com o PT. “Ninguém vai radicalizar por questões de aliança. Na verdade, a vontade da maioria se impõe e o minoritário acompanha naturalmente”, disse.
Além do PT, a sigla também discute uma federação que inclua PSB e PCdoB. “Nosso interesse é fazer uma frente democrática para tirar essas ameaças autoritárias que ocupam o poder hoje. Estamos trabalhando em uma frente ampla para conseguirmos esse intento, que é retomar a vida democrática do Brasil fortificando suas instituições”, afirmou Penna.
Chapa Lula e Alckmin
O impasse entre PT e PSB para formar uma federação tem refletido também na discussão da chapa presidencial. O partido socialista tenta atrair o ex-tucano Geraldo Alckmin para que ele seja candidato a vice do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). No entanto, o PSB tem colocado como condição para isso o apoio do PT à sigla nas eleições estaduais de São Paulo, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Pernambuco, Acre e Espírito Santo.
O principal empecilho na aliança está em São Paulo, onde o PT tem sinalizado que não abre mão de concorrer com o ex-prefeito Fernando Haddad e o PSB quer lançar o ex-governador Márcio França. No Rio Grande do Sul, o PSB tem o ex-deputado federal Beto Albuquerque como pré-candidato ao governo estadual, enquanto os petistas já aprovaram o nome do deputado estadual Edegar Pretto.
Em Pernambuco, Estado onde as duas legendas são tradicionalmente aliadas, o PT indicou o senador Humberto Costa como pré-candidato ao governo. Apesar disso, o parlamentar deixa claro que pode abrir mão da disputa caso uma aliança com o PSB se demonstre mais viável. “É uma candidatura para o grupo de partidos que compõem a frente popular, não é uma candidatura que a gente queira que seja meramente do PT”, afirmou.
O PSB tinha o ex-prefeito de Recife Geraldo Júlio como principal aposta para a sucessão do governador Paulo Câmara (PSB-PE), mas ele tem dito que não quer participar da eleição. Entre os nomes apontados para concorrer pela legenda estão os deputados Tadeu Alencar e Danilo Cabral, que já foram líderes da sigla na Câmara.
Alencar afirmou que a eleição de Pernambuco não será obstáculo para a formação da federação e defendeu a união como estratégia para reduzir a dependência de Lula do Centrão caso ele seja eleito. “Eu tenho uma visão positiva da federação, inclusive para criar um bloco político que faça que um eventual governo progressista tenha uma base parlamentar que diminua a dependência das forças que não querem mudar o Brasil, que estão sempre no entorno de qualquer governo”, afirmou.
No Rio, apesar dos acenos constantes de Lula à pré-candidatura de Marcelo Freixo (PSB) ao governo, há também empecilhos. O presidente da Assembleia Legislativa, André Ceciliano (PT-RJ), quer ser candidato ao Senado, algo que esbarra na intenção do deputado federal Alessandro Molon (PSB-RJ), que almeja o mesmo cargo. O Estadão
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