Com ajuda de bolsonaristas, Queiroz veio ao Rio ao menos 3 vezes para ver o filho jogar no Sampaio do RJ
O Globo – Desde dezembro de 2018, quando saiu de cena e passou a ter uma vida quase clandestina, Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), não teve apenas Atibaia, no interior de São Paulo, como um de seus esconderijos. Além do sítio do advogado Frederick Wassef, Queiroz veio ao menos três vezes ao Rio no ano passado auxiliado por um esquema que envolvia outros políticos bolsonaristas. Ele esteve duas vezes em Saquarema, na Região dos Lagos, e uma na capital entre maio e setembro para ver o filho mais novo, Felipe, defender o Sampaio Corrêa no Campeonato Carioca Sub-20.
Queiroz foi preso na Operação Anjo na última quinta-feira e as investigações do Ministério Público do Rio (MP-RJ) mostraram seus cuidados para não ser localizado. A mulher dele, Márcia Oliveira de Aguiar, também teve a prisão preventiva decretada, mas está foragida. No pedido de prisão, os promotores afirmam que Wassef, o “Anjo”, como era chamado por Queiroz, funcionava como um superior hierárquico a quem ele obedecia. A investigação também identificou uma estrutura para as escapadas de Queiroz ao Rio.
No pedido de prisão, são citadas mensagens entre Márcia e uma pessoa identificada em seu telefone como “Motta amigo”. Em julho de 2019, Queiroz enviou um áudio, do celular dela, para “Motta amigo”: “A gente vai ter que desligar o telefone, daqui a pouco a gente vai entrar na nossa área”. O GLOBO apurou que, mais que um amigo, o radialista Márcio Motta, que foi presidente do PSL local, era o homem que levava Queiroz de Atibaia para Saquarema quando ele vinha ver o filho mais novo, Felipe, jogar.
— Conheço o Queiroz há 16 anos. Nossa amizade nasceu desde que ele acompanhava o Flávio Bolsonaro em entrevistas no estúdio. É um cara do bem. O que estão fazendo com ele é um extremo absurdo — diz Motta, ao admitir que ajudou Queiroz no período em que ele esteve escondido a ir para Saquarema.
— Estive de fato com ele algumas vezes (em Atibaia), não me lembro quantas. Mantive o tempo todo contato com ele.
Nas conversas com Motta, Queiroz lamentou por exemplo a morte do ex-capitão do Bope Adriano Nóbrega em fevereiro na Bahia:
— “Perdi um amigo, estou triste”, ele me falou.
Motta gravou uma live com Flávio há um mês na qual o senador o chamou de “amigo” e disse que “a gente já se conhece há muito tempo”.
Futebol
Na tentativa de localizar Queiroz, Saquarema entrou no radar dos investigadores a partir de maio do ano passado, depois que o filho dele deu entrada nos documentos para tirar sua habilitação. O MP recebeu informações de que um carro em nome de Márcia Aguiar, mãe de Felipe, foi levado para o jovem na cidade. Nos primeiros monitoramentos, como no Dia das Mães, Queiroz não foi visto.
Em agosto, O GLOBO também recebeu informações de que Felipe Queiroz estava jogando nas categorias de base do Sampaio Corrêa. O clube é comandado pelo deputado federal Lourival Gomes (PSL-RJ), dono de supermercados e lojas de construção na região.
Felipe tinha entrado para o time em maio, e morava no alojamento do clube. Em 24 de agosto, a reportagem acompanhou a vitória do time de Felipe por 6 a 0 contra o AD Itaboraí. Nesse jogo, Queiroz não esteve e Felipe ficou no banco de reservas.
O ex-PM, porém, acompanhou outros jogos conforme admitiu esta semana Ronan Gomes, filho do deputado federal Lourival Gomes.
— Ele (Queiroz) veio em um ou dois jogos aqui e um no Rio — contou Ronan, ao dizer que foi Queiroz quem o abordou para falar que “tinha um filho jogador” e pedir para que ele fizesse um teste na época em que ocorreram as filiações do PSL na cidade, em 2018.
O filho do deputado Lourival contesta a informação de que pessoas próximas a seu pai ajudavam a abrigar Queiroz nessas viagens.
— Ele só vinha ver os jogos e ia embora. Só se ficou em pousada — disse Ronan. — Ele morava em São Paulo? Essa informação (de abrigar) não procede não— afirmou Ronan, confrontado com a distância de mais de 500km entre Atibaia e Saquarema, mas dizendo não saber onde Queiroz ficava.
Já o deputado Lourival Gomes negou relações com Queiroz e disse ignorar que o filho do ex-assessor estava no time. Ele lembra que ficou no PSL após o racha com a dissidência que apoiou a criação do Aliança pelo Brasil. O parlamentar tentou negar o fato de ter feito campanha na rua com Flávio e Queiroz em 2018.
— Não, de maneira nenhuma (fez campanha com Flávio). Eu já era suplente. Tive 17 mil votos — disse ele, que foi eleito pelo quociente eleitoral, depois da expressiva votação do PSL.
Confrontado com as imagens de uma agenda, disse que esteve com vários políticos:
—Fiz campanha com todo mundo. Ele (Flávio) não pediu voto para mim, nem nada. Eu arrumei meus votos.
Márcio Motta conta história diferente. Diz que, até então, Queiroz “era uma pessoa requisitada”, mas as acusações afastaram as pessoas, incluindo Lourival Gomes.
— O próprio deputado Lourival Gomes afastou o filho do Queiroz do time, deixando o rapaz abalado. Enquanto puder, eu serei o ombro amigo. Embora as pessoas repetissem o jargão “cadê o Queiroz?”, ele não era um foragido da Justiça.
Além dessas idas a Saquarema, o MP também localizou mensagens no celular de Márcia que mostram menções a vindas de Queiroz ao Rio para falar com acusados de integrar milícias. O MP achou no celular de Márcia um áudio, de 14 de dezembro do ano passado, encaminhado por ela a Queiroz.
Os investigadores contam que o autor do áudio “pedia ajuda para Queiroz telefonar para milicianos em seu favor após ter sido ameaçado por ‘meninos’ do grupo que domina a região do Itanhangá”. Queiroz se recusa a telefonar, por medo de ser localizado e diz para Márcia responder ao homem que “eu posso ir quando estiver aí pessoalmente”.
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