Coisas do Brasil (e do Maranhão)
Por Enéas Athanázio
Como sabem aqueles que me honram com a leitura, sou “amarrado” nas coisas brasileiras. Não é por acaso que conheço este país de ponta a ponta e não só as capitais, mas também os ínvios e os grotões onde houvesse algo de interesse. Diante disso, é claro que livros sobre assuntos brasileiros me atraem e desfrutam de minha predileção.
Foi com intenso prazer que terminei de ler “Caminhos do Jordão da Bahia”, de autoria de Filemon Francisco Martins (RG Editores – S. Paulo – 2022), que me foi por ele oferecido. O Autor é meu correspondente de longos anos, ainda que nunca tenhamos nos encontrado, e foi irmão do falecido Mário Ribeiro Martins, laborioso pesquisador literário e meu colega do Ministério Público. Somos, portanto, amigos escritos, como dizia Monteiro Lobato.
Nas páginas deste belo livro o Autor está inteiro e registra em traços largos toda sus experiência de vida, desde o sertão da Bahia até São Paulo e Itanhaém na dura (e vitoriosa) luta pela vida neste país em que a injustiça social se mostra quase invencível para aqueles que só podem contar consigo mesmos. Nesse sentido o livro é quase um memorial, ainda que sem o decorrer costumeiro das obras memorialistas. O Autor escreve com absoluta sinceridade, fato que transborda das palavras,
Tudo tem início em Ipupiara, no sertão baiano, onde a família Martins surge para o mundo. Esse “monstro horripilante e asqueroso” que deu nome ao antigo Jordão de Brotas teria sido visto por Pero de Magalhães Gondavo e a ele se referiram Fernão Cardim e José de Anchieta, além de Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Holanda que o registraram em suas obras. Dali Filemon lançou asas em busca de uma vida melhor contando apenas com seu esforço pessoal.
O Autor é dotado de excelente memória e retrata com detalhes cenas de uma infância já distante. As aventuras da juventude, inclusive andando pelas copas das mangueiras, feito macacos, os incidentes escolares, detalhes de São Paulo, de Itanhaém, a segunda cidade mais velha do país, as viagens, as decepções doloridas que a vida arma, os perfis de muitos amigos e conhecidos, incluindo figuras típicas com quem cruzou. Inesquecível a visita à cidade de Pinheiro, no Maranhão, terra de José Sarney, onde tudo, para qualquer lado, é dele ou da família.
– Aquele edifício a quem pertence?
– É da filha do Sarney.
– E aquela casa de quem é?
– É do filho do Sarney.
– E aquela emissora de rádio?
– É do Sarney.
– E aquele jornal?
– É do genro do Sarney.
– E aquela empresa?
– É da nora do Sarney.
Para completar, uma rádio local repetia sem parar:
– Um empreendimento José Sarney!
Por sorte, concluo eu, as almas eram invisíveis. É bem provável que nelas estivesse escrito: Sou do Sarney!
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