Carlos Lula diz que o MA caminha para atingir níveis considerados controlados do Covid-19 e fala sobre possível candidatura
“Foi preciso então unir três coisas: calma, respeito à ciência e muita vontade de trabalhar”
A pandemia do novo coronavírus colocou à prova os sistemas de saúde e a capacidade de gerenciamento de crise dos seus gestores. Por um lado, os escândalos de superfaturamento, a ausência de direcionamento nacional, as trocas de comando e as faltas constantes de insumos permearam a cena de um Brasil com grande dificuldade em dar respostas à emergência sanitária. De outro, muitos estados brasileiros já sentem o alívio por terem sobrevivido à pior fase da pandemia, com baixo índice de mortalidade e controle do contágio.
Diante de um ano atípico para todos os cenários, o Maranhão trilhou um caminho proeminente, tornando-se referência para os demais estados. O reconhecimento, primeiramente, chegou com a escolha unânime do secretário de Estado da Saúde, Carlos Lula, para presidência do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS). O desempenho no enfrentamento da pandemia também atraiu a Organização Pan Americana da Saúde, que enviou uma comissão para conhecer de perto as ações desenvolvidas pelo Governo Estadual, na última semana.
O secretário Carlos Lula concedeu uma entrevista exclusiva ao blog do John Cutrim fazendo reflexões sobre a pandemia, o exemplo do Maranhão e as expectativas de futuro. Sobre a circulação do nome do gestor estadual em diversas pesquisas eleitorais, ele afirma que “se ser candidato significar trabalhar pelas pessoas e trabalhar em prol de um projeto político coerente e de justiça social, sim coloquem meu nome nessa lista”, anunciou.
O Maranhão sobreviveu à pandemia. Como foi possível?
Carlos Lula – Não conjugaria desta forma, no passado. Eu diria que o Maranhão tem sobrevivido bem, até aqui, à pandemia do coronavírus. As respostas que demos e as escolhas que fizemos se mostraram eficazes se você compara com outros estados. E sim, de fato, ao olhar para os meses que enfrentamos, parecem termos passados alguns anos, tamanho o nível de pressão, estresse e contingências que presenciamos. Todos os cenários e analistas apontavam para um colapso completo do sistema de saúde do estado em poucas semanas. Foi preciso então unir três coisas: calma, respeito à ciência e muita vontade de trabalhar. Com a calma, nunca nos desesperamos, o que tornaria tudo mais difícil. A tripulação não pode nunca deixar de acreditar no piloto e tivemos condições de conduzir esse grande avião a ares mais tranquilos; acreditamos na ciência e em nossos profissionais e sabíamos que poderíamos ter excelentes resultados; e a vontade de trabalhar nunca faltou a uma equipe muito aguerrida. Isso vai desde o governador Flávio Dino, que participava de reuniões diárias do gabinete de crise, até o funcionário da ponta, passando por mim e minha equipe. Muitos adoeceram, outros tantos saíram de casa, passamos a trabalhar quase 16 horas por dia, sem fim de semana. Mas conseguimos entregar 13 hospitais em 12 semanas; fizemos os primeiros centros de testagem do país; abrimos dezenas de leitos de UTI; fomos o primeiro estado a decretar o lockdown. Temos uma das menores taxas de letalidade do país, somos o único estado do país com taxa de transmissão menor que 1 há 75 dias. Não foi pouca coisa. Tudo isso permitiu que olhassem para o estado, alguns com enorme incredulidade, e se perguntassem: o que vocês fizeram aí no Maranhão? É com muito orgulho que vejo hoje a Organização Pan-Americana da Saúde vir ao estado não para nos criticar, mas para dizer que tiramos água das pedras. Isso nos anima.
Embora a Secretaria de Estado da Saúde tenha feito bastante, parece que os municípios pouco se envolveram no enfrentamento da pandemia, com raras exceções. Como o senhor avalia o desempenho das prefeituras?
Carlos Lula – Infelizmente, as crises colocam em evidência nossas forças e nossas fraquezas. Não fosse o SUS, teríamos tido a barbárie no país. Seriam muito mais de 120 mil mortos. Mas se esse sistema, com todos esses defeitos, nos rendeu esses resultados, há pontos de fraqueza que restaram evidenciados: a debilidade de nossa atenção básica, a fragilidade de nosso sistema de vigilância. Não conseguimos fazer rastreamento de contato no país e praticamente 75% dos recursos para a COVID que a União repassou foram para os municípios. É, de fato, uma contradição. Mas conhecer nossas fraquezas é um grande passo para superá-las e crescer. Conseguimos mostrar, até aqui, que é o investimento público e o fortalecimento de políticas públicas que garante a vida das pessoas, principalmente dos mais vulneráveis. Ainda assim, um gargalo que o SUS demonstrou ter é a atenção primária. Poucos foram os casos de sucesso no enfrentamento da pandemia. Aliás, pouco se falou de atenção primária no enfrentamento do novo coronavírus. Um erro, dentre tantos que cometemos no país.
Ser instituído presidente do Conselho Nacional dos Secretários de Saúde colocou os olhos do país sobre o senhor. Que papel o Maranhão passou a ocupar a partir daquele momento?
Carlos Lula – Os olhos não se voltaram para mim, mas para o estado. O CONASS existe desde 1982 e pela primeira vez um maranhense ocupa sua presidência. Tínhamos pouca relevância nesse debate nacional da saúde, mas as realizações dos últimos anos do Governo Flávio Dino trouxeram luzes ao trabalho aqui desenvolvido. Fizemos a maior rede hospitalar de nossa história. Hospitais de verdade, com capacidade de atender e melhorar a vida das pessoas. Se pensarmos que até 2014 a rede estadual de saúde só possuía leitos de UTI em São Luís e Presidente Dutra e agora o temos em Santa Luzia do Paruá, Pinheiro, Lago da Pedra, Pedreiras, Imperatriz, Bacabal, Santa Inês, Chapadinha, Caxias, Timon, Coroatá, Itapecuru, Balsas, Barreirinhas e Itapecuru-Mirim. Num período de enormes e sucessivas crises financeiras, o Brasil tem fechado leitos. Nós, no caminho inverso, abrindo e expandindo nossa rede assistencial. Então não é só a contraposição no plano político nacional, mas demonstrar, na prática, que é possível melhorar a vida das pessoas. Acredito que, com a presidência do CONASS, damos um recado importante para a sociedade: boas gestões fazem sim a diferença. Não é possível mais tolerar um gestor público, ainda mais na área da saúde, que seja insensível às angústias da população. O reconhecimento veio em meu nome, óbvio, mas eu divido ele diariamente com todos da minha equipe que ajudam a fortalecer o SUS no Maranhão.
Passada a pior fase da pandemia, qual é a maior preocupação do secretário Carlos Lula hoje?
Carlos Lula – A preocupação do dia é a de todo brasileiro: a imensa crise econômica decorrente da pandemia. O Brasil enfrentou muito mal a doença e conseguiu estabelecer junto à crise sanitária, uma crise política que piorou imensamente a crise econômica. Foram três Ministros da Saúde, a saída dos Ministros da Educação e da Justiça, a instabilidade do Ministério da Economia, uma guerra surreal contra o Supremo Tribunal Federal e o Judiciário. Tudo isso não tinha como render bons resultados, por óbvio. O resultado é a recessão estabelecida e interrogações sobre o que será o ano que vem. O SUS disponibilizou 21 mil leitos de UTI para a COVID-19. Doze mil habilitados pelo Ministério da Saúde. Não haverá recursos para isso ano que vem? Simplesmente colocaremos os leitos de UTI criados no almoxarifado das Secretarias? O Governo Federal se mantém silente em relação a isso. Mas é preciso falar de financiamento do SUS. Não para o futuro, mas já nas próximas semanas. Tudo o que foi feito pode ser simplesmente cancelado pelo Governo Federal se não for sinalizado algum tipo de auxílio.
Com a proximidade da conclusão da era Flávio Dino à frente do Governo do Maranhão, embora o senhor não seja político e nunca ter se filiado, o seu nome apareceu em diversas pesquisas eleitorais. Existe alguma possibilidade em sair candidato?
Carlos Lula – Existe um legado a ser defendido no Maranhão. Nunca tivemos tantas obras, tanto investimento em educação, saúde e segurança pública. Uma comparação de qualquer área do Governo nos últimos anos com anos anteriores é até desleal, tamanha a distância de resultados. Isso tudo enfrentando impeachment, sucessivas crises econômicas e políticas, zika vírus, o novo coronavírus. De repente, há quem muito rapidamente se esqueça ou não reconheça todo o trabalho já feito no Governo Flávio Dino. Tenho visto muita coisa estranha nessa eleição municipal. Uma pena. A busca pelo poder por si só obscurece o homem. Temos princípios, trajetórias, conquistas sociais e políticas que temos de defender. No fim das contas existe um projeto político diferente do que se via no estado há muitas décadas. Vale a pena se juntar com quem representa exatamente o oposto do que defendemos? Com quem representa o que há de mais antigo e obscuro na política? Desde Maquiavel sabemos que o político virtuoso, o prudente, é o que se antecipa e não deixa margem para a fortuna, o acaso. O grande líder tem sucesso porque vai ao encontro do que a situação e o tempo pedem. Ele sabe o momento oportuno de agir, e o de não fazer nada. Temos um grande líder no Governo do Estado. E se for para defender esse legado e não permitirmos retrocessos, serei sim candidato. Mas não em defesa de um projeto pessoal. A sociedade deu uma resposta muito clara em relação aos projetos tradicionais que tomaram de conta do debate político, mas essa ânsia por renovação não pode ser preenchida com uma classe política que negue as nossas instituições, que afronte a nossa democracia. Se ser candidato significar trabalhar pelas pessoas e trabalhar em prol de um projeto político coerente e de justiça social, sim coloquem meu nome nessa lista. Caso contrário, vou contribuir com a população maranhense de outras formas.
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