A advertência de Lobão
Em tempos de denúncias para todos os gostos, em que se corre o risco de jogar todos os políticos na vala comum da corrupção, é sempre bom reiterar que só ganha com a sensação de ladroagem generalizada aqueles que, sem nenhum apreço pela democracia, pretendem se apresentar como impolutos salvadores da pátria. Logo, separar o joio do trigo – isto é, defender a punição exemplar dos políticos corruptos, mas não permitir a desmoralização da atividade política – é dever de todos os que se preocupam com o futuro da democracia no País. Contudo, infelizmente, infiltrou-se entre os advogados dessa nobre causa um punhado de políticos que, com contas a acertar com a Justiça, pretendem apenas confundir a opinião pública, passando-se por vítimas de perseguição.
Em geral são mui conhecidos personagens da política degenerada, herdeira do coronelismo patrimonialista, que a tanto custo se tenta extirpar da vida nacional. Nenhum deles está interessado em outra coisa que não seja salvar a própria pele.
É o caso do senador Edison Lobão (PMDB-MA), que, em entrevista recente ao Estado, se queixou duramente da Lava Jato. O parlamentar é alvo de dois inquéritos ligados à operação, tendo sido citado como beneficiário de propinas no escândalo da Petrobrás e nas obras de Angra 3 e Belo Monte, quando era ministro de Minas e Energia no governo de Dilma Rousseff. Mesmo com esse histórico, Lobão foi eleito presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a mais importante do Senado, responsável, entre outras funções, por avaliar a constitucionalidade de projetos. É certo que ninguém é culpado até prova em contrário, mas, em se tratando de um cargo de tamanha responsabilidade política e ética, seria de esperar que o Senado escolhesse alguém sem a folha corrida de Lobão.
Mas os arranjos de coxia se sobrepuseram aos interesses do País e aos imperativos morais, razão pela qual Lobão não apenas preside a CCJ, como se julga à vontade para denunciar a suposta generalização das acusações da Lava Jato contra políticos. “Virou um inquérito universal”, disse o senador. “Em que isso vai resultar? Não sei. Não acho que (a Lava Jato) tenha que ser extinta, mas conduzir ao ponto que estamos chegando, da criminalização da vida pública, é o que nos envia para a tirania.” O senador disse que o Congresso está tentando “corrigir essas distorções”, mas “a imprensa não aceita, nem a opinião pública”. Assim, lamentou, “estamos destinados ao calvário, à destruição”.
Para Lobão, é injusto que “nós, que somos investigados e delatados, vivemos esse estado de constrangimento”, enquanto o delator está “livre por aí” e “passa a ser uma figura importante”. A lamúria do senador, segundo a qual “todo dia aparecem denúncias, e os meios de comunicação batem impiedosamente em todos os políticos, tendo sido objeto de denúncias ou não”, terminou com uma ameaça ao País: “Daqui a pouco os políticos não suportam mais”. Assim, espertamente, o senador quer fazer acreditar que suas preocupações são as mesmas daqueles que, sendo honestos, ou por serem verdadeiros democratas, defendem que a Lava Jato prossiga em seu trabalho com destemor, mas dentro da lei, sem ceder aos holofotes nem permitir que sirva de instrumento para atacar indistintamente todos os políticos.
É claro que gente como Lobão – que orbita governos de qualquer matriz ideológica e exerce a política como faziam os coronéis – não está nem um pouco interessada em melhorar a qualidade da democracia e das instituições. Antes pelo contrário: sempre que se nota algum avanço, em especial agora, quando se pretende levar maus políticos ao banco dos réus, urde-se alguma manobra para sabotar esses esforços, sob a malandra justificativa de que é preciso conter os exageros da Lava Jato.
Que exageros existem não há dúvida, e mais de uma vez alertamos, neste espaço, para algumas atitudes precipitadas e por vezes autoritárias de membros da Lava Jato. Mas, enquanto aqui a intenção da crítica é contribuir para o aperfeiçoamento de tão importante ofensiva contra a corrupção, a parlapatice de Lobão tem apenas um objetivo: dar a senha para sabotar, no Congresso, a Lava Jato. (O Estado de S.Paulo)
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