Encontro em tempo efêmero e fugaz

LUIZ THADEU NUNES E SILVA
Engenheiro Agrônomo, escritor e globetrotter. Autor do livro “Das muletas fiz asas”.
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Há tempo não o via. Nunca mais tivera notícias dele. Tomou um chá de sumiço; até pensei que tivesse partido para outra. Sentado no fundo do amplo salão da Cafeteira, o vi entrar. Por uns segundos fiquei sem reconhecê-lo, mas bastou se aproximar que imediatamente vi quem era. Levantei da cadeira, para que me olhasse, fiz sinal com a mão. Ele não me reconheceu, em princípio. Se aproximou, e surpreso, abriu um discreto sorriso. Fiz um gesto para ele sentar, mas antes lhe dei um demorado abraço.
– Quanto tempo não te vejo, disse-lhe, com o intuito de corrigir o longo tempo.
– Também não te via há anos. Vejo sempre tuas entrevistas na TV.
– Obrigado.
– Vi que sofrestes um acidente, que andas de muletas.
– Sim, fez na última sexta-feira vinte e dois anos.
– Muito tempo, mesmo.
João foi nosso vizinho, morava na rua de trás de nossa casa. Fomos próximos quando adolescentes. Jogamos bola juntos, na rua, com traves improvisadas com as velhas “chinelas japonesas”. Hoje, as cults Havaianas, que emolduram pé de gente pelo mundo.
Namoramos duas irmãs, filhas de d. Helena e seu Ernesto. Frequentávamos as mesmas festas do bairro. Tempo de música romântica, dançar agarradinho, com luz negra no teto. Época de tomar ponche, Rum Montilla com Coca-Cola. João, como trabalhava com o pai, tinha uma Vespa, que fazia sucesso com as moças. Lembro que adulteramos as carteiras de identidade, acrescentando dois anos para assistir “Império dos sentidos”, do diretor japonês Nagisa Oshima, no Cine Rox. Isso, em 1978.
Quanta coisas vividas juntos. Nós ali, a rebobinar nossas memórias, passando em revista pessoas, fatos e situações que se perderam no passado.
Perguntei se continuava casado.
– Marta partiu há dez anos. Levaram-na as mãos do tempo — fiquei órfão pela segunda vez. O vazio deixado pela perda de Marta ainda dói.
Pedimos um café. Lembramos dos cafés que tomávamos na padaria de seu Geraldo.
– Café com leite, pão com manteiga na chapa. Lembra do refresco de maracujá?
– Claro, o melhor refresco que já tomei.
– O café era torrado na nossa frente, e tinha aroma de café. Disse-me ele.
Perguntou-me quantos filhos tinha.
– Dois: Rodrigo e Frederico. Mostrei fotografias de Heitor, meu neto, que está completando meio ano de idade nesta semana.
– Tenho três filhos: João, Maurício e Helena, todos me deram netos.
Mostrou-me fotografias, inclusive de Marta, sorridente ao seu lado.
Sentados ali, parecia que tempo tinha nos devolvidos momentos únicos e especiais que compartilhamos no passado. Há um momento, efêmero e fugaz, onde o passado e o presente se encontram em um abraço silencioso. O encontro, com sua magia intangível, devolve-nos momentos indeléveis. É nesse intervalo encantado, entre o que passou e o que virá, que a vida revela seus segredos mais profundos, resgatando memórias escondidas.
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