Pavio curto: ameaças à vista!

RUY PALHANO
Psiquiatra, Membro da Academia Maranhense de Medicina e Doutor Honoris Causa – Ciências da Saúde – EBWU (Flórida EUA).
Frequentemente, somos surpreendidos por notícias da grande imprensa, ou mesmo em conversas entre amigos, sobre pessoas que “perdem a cabeça”, explodem fácil e que se envolvem, constantemente, em brigas e desentendimentos em diferentes lugares. No trânsito, em casa e no trabalho, é muito comum verificarmos relatos destes comportamentos. Além, certamente, de poderem ocorrer em outras circunstâncias. Nestas ocasiões, podem ocorrer agressões físicas, insultos verbais e ameaças.
As alegações para isto são inúmeras, muito embora, na maioria das vezes, não sejam suficientes para justificar tais reações, devido às desproporcionalidades das reações desprendidas no trânsito, às vezes, só porque, alguém triscou em seu carro, passou-lhe a frente, ou cruzou uma a faixa sem dar sinal, ou por demorar no sinal fechado, já é um motivo suficiente para a pessoa explodir gritar e se agitar com uma raiva descomunal etc. Na rua, se você bate em alguém, acidentalmente, ou o olha pedindo-lhe desculpas, há os que reagem de forma descontrolada, te insulta, te desafia, te instiga para briga ou já te agredi sem qualquer explicação.
Essas reações, sem propósitos e destituídas de qualquer racionalidade, são consideradas como uma espécie de explosão emocional ou reação explosiva, incontrolável, momentânea, repentina, na qual a pessoa exposta a isso se torna cega, não aceita que ninguém para acalmá-la, está disposta a uma briga e se alguém interferir pode ser pior, pois se enfurecem mais ainda e passam a agir totalmente sob a inspiração da raiva.
A impressão de que se tem, vendo a pessoa nessas condições é que ela “está possuída por uma raiva incomum, completamente descontrolada”, apresentando uma reação inteiramente anormal, inusitada e inexplicável. Essas mesmas pessoas podem, em outras circunstâncias, apresentar comportamentos completamente diferentes do descrito acima, totalmente oposto ao verificado nessas ocasiões especiais.
Em casa, no trabalho ou entre amigos, seu comportamento pode ser totalmente oposto ao verificado nessas reações explosivas. Devido a essa forma particular de reação, tais pessoas são conhecidas, vulgarmente, como “pavio curto”. Essas perdem, quase sempre, o domínio da situação; se tornam incapazes de se autocontrolarem, esbanjam raiva, explodem fácil, se tornam incontroláveis.
Do ponto de vista comportamental e psicopatológico, várias condições médicas e psicossociais podem determinar comportamentos impulsivo-agressivos. Uma delas, quiçá, a mais frequente, é o stress da vida moderna. Os dias atuais são quase sempre agitados, controversos e desafiadores, têm tirado o sossego de muita gente.
Cheios de compromissos e obrigações, o tempo se torna curto e corrido. Por isso, muitos perdem a calma, a serenidade e a tranquilidade, passam a se irritar facilmente, tornando o dia enfadonho e cansativo, para muitos “o dia a dia vira um inferno”.
O trabalho, ambiente que deveria ser de tranquilidade e prazer, se torna, cada vez mais, inseguro e cansativo, transformando-se em algo enfadonho e ameaçador. Para piorar, as empresas públicas e privadas estabeleceram o famigerado cumprimento de metas, um conjunto de propósitos que os trabalhadores têm que alcançar no final da jornada de serviço, de qualquer forma; e, por isso, muitos desses trabalhadores se encontram, permanentemente, sob uma pressão violenta. Já sai de casa, na expectativa de ter que cumprir as tais metas, sob a rígida pressão dos chefes, e se não as atingir, passa a ser um problema.
Essa constante pressão e cobranças geram, cada vez mais, desafios, que em excesso fazem muito mal para a saúde geral e principalmente a mental, tornando-as ansiosas, inseguras e temerosas, vulnerabilizando as a comportamentos desajustados, como as reações impulsivas e violentas.
Os conflitos psicológicos, econômicos, familiares ou sociais, que muitos passam, também são situações predisponentes a comportamentos idiopáticos. São condições, que exercem enorme influência negativa na expressão dessas reações, sobretudo, se essas pessoas vivem sob constante ameaça desses conflitos.
Privações financeiras, laborais, sociais, desemprego irrealizações pessoais, separações conjugais também influenciam esses comportamentos explosivos-impulsivos. Soma-se a isso a marginalidade social, a violência urbana, as privações de bens de consumo, de escola, de saúde e de outros insumos ou serviços essenciais à saúde à educação, à segurança coletiva e ao bem-estar geral dos cidadãos.
Uso de álcool e de outras drogas podem também predispor pessoas a apresentarem reações explosivas inconsequentes, imprevisíveis. Uma situação, por demais conhecida, é a embriaguez patológica. Que nada mais é, que uma reação inusitada, com súbita alteração da personalidade, de forma inesperada, circunscrita ao uso e baixas doses de álcool, ou em circunstâncias de uso crônico. Nessas circunstâncias, a pessoa se torna incontrolavelmente violenta, descontrolada, destilando ódio por todos os lados, contra pessoas, animais ou objetos. Passado esse momento, a pessoa pode até não se lembrar nitidamente sobre o que aconteceu.
O Transtorno Explosivo Intermitente é outra condição psiquiátrica importante para explicar essas reações explosivas. Esses pacientes reagem de forma impulsivo-agressiva em determinados episódios, destrutivamente, na direção de pessoas, animais, objetos ou propriedades, tendo como destaque em suas reações a desproporcionalidade afetivo-emocional à qualquer provocação ou estressor psicossocial desencadeante.
É uma reação em curto-circuito, impulsiva-agressiva, as quais não são premeditadas, tornando-os, verdadeiro homens-bomba ambulantes, que podem reagir explosivamente, de forma inexplicável em circunstâncias diversas. Esses podem, também, posteriormente ao episódio, sentirem-se com remorso, arrependidos ou mesmo embaraço, pelo comportamento que tivera sem um fato plausível que o possa explicá-lo. Isso pode acarretar graves problemas nas relações pessoais, sociais e familiares, pois elas passam a ser consideradas como violentas, tornando-se isolado socialmente.
Outras condições médicas, como Transtorno da Personalidade Antissocial, Transtorno da Personalidade Borderline, Transtorno Psicótico, Episódio Maníaco, Transtorno Bipolar, Transtorno da Conduta, Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade e Demências etc., podem apresentar esses comportamentos.
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