PEC da Polícia Técnico-científica: necessidade nacional ou mero capricho funcional?
Recentemente foi aprovada, pela Comissão de Justiça do Congresso Nacional, a fim de se submeter aos plenários da Câmara e do Senado, a PEC nº 76/2019, que visa criar mais um órgão policial no artigo 144 da Constituição Federal, ou seja, a chamada Polícia Técnico-Científica, onde, dentre bordões diversos apresentados pela categoria dos peritos criminais, firmam-se, aqui e acolá, que a criação da Polícia Técnico-Científica é fazer “Justiça à Ciência”, pois passará a ter “autonomias funcionais”, como se a Perícia Criminal no país já não integrasse a um órgão de órgão de investigação criminal respectivo (Polícias Civis), bem como não tivesse autonomia técnica-científica e operacional sem quaisquer ingerências em suas atividades, sobretudo nos últimos 25 anos.
Um dos sustentos da mencionada pretensão, reitera-se, tratam-se, segundo argumentos dos servidores peritos criminais, da necessidade de se ter autonomia e evitar “ingerências externas” em suas atividades, dentre outras sustentações que saltam aos olhos de quem não compreende mesmo como deverão se compor o funcionamento de um órgão integrante da Segurança Pública à luz da necessária e imprescindível hierarquia e disciplina afins.
A situação é tão delicada que, caso se crie mais uma Polícia, a sensação que se apresenta é que se criará mais espaços a outras pretensões do mesmo fim por meio de diversos órgãos integrantes das forças de segurança prevista no artigo 144 da Constituição Federal, vulnerabilizando o já deficitário, por falta de estruturas, sistema de segurança pública deste continente chamado Brasil. Assim, retirar a Perícia Criminal dos órgãos das Polícias Judiciárias sejam das estaduais ou federais, sob tais argumentos, omitem-se o que mais a fundo pretendem os citados profissionais da segurança pública em nosso país, quais sejam, isonomias com outras categorias funcionais dentro dos quadros da corporação de Polícias Judiciárias no Brasil, especialmente, o de Delegados de Polícia, por excelência.
É de se registrar que no ano de 2009, foi editada a lei federal nº 12.030/2009 que garante à atividade da perícia oficial (exercida pelos órgãos: Institutos de Criminalística, Médico Legal e alguns de Identificações integrantes hoje às Polícias Civis), a completa autonomia técnica-funcional, sem que haja interferências de quaisquer autoridades interna ou externamente, garantindo-lhes no exercício de suas funções a isenção, responsabilidade, impessoalidade e imparcialidades em todas as acepções jurídicas disciplinadoras da matéria.
Além da legislação acima, todas as alterações do Código de Processo Penal, nesses últimos tempos, no campo da Perícia Criminal (Oficial), quando as infrações penais deixam vestígios direto ou indireto, sofreram grandes e imprescindíveis atualizações em conteúdos de profundas proteções aos interesses da Justiça no campo das provas materiais e até imateriais.
Se os citados órgãos periciais sofrem por falta de estruturas físicas e humanas, não são diferentes dos demais órgãos que compõem a Atividade de Polícia Judiciária dos estados, quando, por absoluta falta de recursos financeiros, mediante históricos cortes orçamentários governamentais, fazem milagres diante das inúmeras demandas em operações de investigações policiais no universo dos crimes que avassalam todo o país.
Na realidade, o país precisa é mais de integração do e nos órgãos que compõem a Segurança Pública e não mais divisões com criações de novas Polícias, cujas consequências, só fazem crescer o crime organizado e as afrontas individuais às leis penais na sociedade brasileira em tempos hodiernos.
Sabe-se que alguns estados da Federação, preferiram, por lei estadual, criarem na estrutura da Secretaria de Segurança Pública, a chamada Polícia Científica, ainda que sem assento na Constituição Federal, outros, em sua maioria, permaneceram dentro da estrutura da Polícia Civil os sub-órgãos acima descritos, com diversos investimentos direcionados a estes em detrimentos aos demais órgãos operacionais das Policias Judiciárias em todo o país nessas últimas décadas. E, claro, que importantes, sobremaneira.
A sensação que se dar é que a relutância em não quererem ficar subordinado às Chefias da Polícia Civil, ou deixarem de integrar às corporações das polícias judiciárias estaduais e federal, está mais relacionada com a busca de supostas isonomias salariais com a carreira de Delegados de Polícia mesmo sabendo que estes não podem acumular cargos públicos, salvo de magistério, bem como tem sua carga horária completamente diferente em razão das peculiaridades da chamada dedicação exclusiva. O que não se aplica à carreira da categoria dos peritos criminais, que além de poderem acumular cargos técnicos públicos, possuem a elasticidade de carga horária completamente diversa das demais carreiras policiais, dentre outras peculiaridades, especificamente.
Isso não se conclui que não mereçam ser valorizados com bons salários e boas condições de trabalho, inegavelmente. Por conseguinte, na valorização funcional das carreiras policiais, inclui-se a carreira dos peritos criminais, perpassa nesse ponto para todos, mas em condições efetivas de trabalho, grau de responsabilidade e cobranças afins, em respeito à sociedade como destinatária maior dos serviços públicos à luz do que preceitua o bom Direito administrativo nacional.
Na atual realidade, o Brasil vem sofrendo de auto afirmação institucional se não institucionais com a crescente “onda” de pretensões em criações de mais órgãos policiais, quando deveria primar pela estruturação dos já existentes com aprimoramento das condições técnicas às questões salariais, especialmente com o aumento da qualificação profissional, motivações em caráter permanente e aumento do sentimento de pertencimento, sem necessidades de disputas internas ou autoafirmações, sob argumentos tão fragilizadores e ultrapassados que não têm mais guaridas para quem se atualiza para com um real e efetivo enfrentamento à criminalidade, dentro de uma perspectivas criminológica transversalizada e de forma integrada, deverasmente.
Diante dos trilemas acima declinados, fica-se a indagação se a criação de mais uma Polícia no país, a chamada Polícia Técnica Científica se trata de necessidade nacional ou mero capricho funcional? Parece-me mais um comportamento não republicano que coletivo propriamente dito. A presente pontuação pode estar equivocada, mas, desde que venham com fundados elementos de convicções não superficiais, obviamente. Isto é, aceita-se a contraposição, considerando grandes experiências profissionais no trato respeitoso com os valorosos profissionais da perícia oficial ao longo da carreira realizada, enquanto na ativa esteve este emissor ao longo dos 34 anos de efetivos serviços prestados ao Sistema de Segurança Pública em nosso país.
As entidades de classes Adepol do Brasil – Associação dos Delegados de Polícia do Brasil, Fendepol – Federação Nacional dos Delegados de Polícia Civi, Fenappi – Federação Nacional dos Peritos Papiloscópicos, Feneme – Federação Nacional das Entidades Militares Estaduais, emitiram Nota Técnica acerca da inviabilidade da criação de mais uma nova Polícia no rol do artigo 144 da Constituição Federal, com conteúdos, bastantes razoáveis e convencíveis, onde bem apontam que apenas uma reorganização administrativa com previsão de recursos orçamentários específicos com vista a reaparelhar os órgãos periciais do Brasil, bem responderia mais que 95% das necessidades afins, sem precisar onerar mais e mais a Administração Pública dos estados da Federação que já sofrem com os cortes orçamentários plurianuais em todas as acepções.
É chegada a hora de decidirem em definitivo a problemática acima, especialmente pelos governos estaduais por meio de suas Secretarias de Segurança Pública e posicionamento das Chefias de Polícia Civil em todo o pais, mediante o ” chamamento do feito à ordem”, ou do contrário arranhaduras desnecessárias e expositivas na relações internas e até externas funcionais serão manchetes de más notícias do contexto no por vir não tão distante, mas tudo, desnecessariamente, já que inúmeras autonomias funcionais, hoje em todo o país, as perícias oficiais adquiriram e são fatos notórios e incontestes, e até irreversíveis com concordâncias das imensas Chefias das Polícias Civis no país.
Vale registrar que no país, mais do que nunca, não há órgão pericial criminal ou oficial, que não seja administrado ou coordenado diretamente pelos próprios peritos oficiais (criminais), mediante entendimento e aceitação do estilo por parte das mais diversas Chefias de Polícia Civil no Brasil, tornou-se lugar comum.
Estamos em tempos em que o país precisa que todos trabalhem de forma consciente, integrada e respeitosa quanto suas peculiaridades funcionais em prol da Justiça e proteção social, com os recursos que se dispõem ou lutem para terem percentagens permanentes em seus planejamento orçamentários destinados a todos os órgãos que compõem o Sistema de Segurança Pública no Brasil. Doravante, o tempo urge e o crime, infelizmente, vem vencendo o Estado brasileiro, nessas últimas décadas de violências urbanas e criminais que aproveitam das fragilidades existentes dos órgãos de prevenção e repressão à criminalidade e até no Sistema de Justiça com um todo, para se tornar vencedor na batalha tão desigual contra a criminalidade que hoje se vive no Brasil, é só não subestimar e cada um fazer a sua parte, mas de forma integrada e respeitosa, visceral e unidamente, sobretudo.
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