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Texto do Pr. Sérgio – PG do dia 29/05/2022

A FOME DOE…A FOME MATA!

Lembro com exatidão o dia em que retornava de mais uma “semana teológica” promovida pelo seminário em que estudava. Naquele seminário havíamos debatido veementemente temas teológicos e doutrinas defendidas pela nossa comunidade de fé. Durante algumas horas naquela noite, nos esforçamos para destruir qualquer oposição ou pensamento contrário ao que nós, com unhas e dentes, defendiámos. E não estávamos dispostos a ceder um milímetro que fosse em nosso posicionamento. A nossa posição era inarredável e inegociável. E orgulhosamente eu pensava, enquanto voltava pra casa: “esse posicionamento é a razão da nossa fé. E nós vencemos o debate de forma brilhante. Magnificamente vencemos. Oh glória!”
Quando desço do ônibus empanturrado de orgulho, me deparo com uma cena que partiu o meu coração: uma criança, dentro de uma lixeira de um restaurante, literalmente, brigando e disputando com os ratos alimentos que haviam sido jogados dentro daquela lixeira. Vencendo um pouco da minha fobia por ratos, me aproximei e a uma certa distância, testei convencer aquela criança a abandonar aquela lixeira. A sua resposta à minha tentativa partiu ainda mais meu coração: “a minha barriga está doendo muito. Estou com muita fome.” Ali eu não conseguia mais parar de chorar. Chorava sentindo a dor daquela criança e chorava envergonhado diante de Deus, por ser tão ensimesmado pensando na minha vitória no debate teológico. Lembro que precisei ser consolado pela Márcia quando cheguei em casa, porque eu não conseguia parar de chorar pensando naquele menino dentro da lixeira.
Quantas vezes nos preocupamos tanto com questões periféricas ao evangelho enquanto há pessoas que se confundem com ratos dentro de lixeiras. Mas, nós achamos que isso não é um problema nosso. Nós temos outras coisas nas quais pensar e delas não abrimos mão e intolerantemente fechamos os olhos para a dor do outro. Talvez porque ele não faça parte do nosso gueto.
Olhando para o ministério de Jesus, eu vejo a encarnação do próprio Deus não dando tanta importância às coisas pelas quais eu mato e morro, mas andando com pecadores, conversando com mulheres samaritanas de vida moral duvidosa, etc. Um Deus que, em Cristo se mistura à escória da sociedade para trazer vida e libertação. Ele se misturava tanto com o povo mais comum, que Judas , quando o traiu, precisou sinalizar com um beijo para os soldados romanos quem era ele. Justamente por que ele não era tão evidente.
A minha oração, é pra que a minha intolerância não me torne insuportavelmente insensível à dor de uma criança que sente o seu estômago doer por causa da fome; que a minha intolerância não feche os meus olhos a tantas outras dores e braços estendidos de gente já por demais sofrida; que a minha intolerância não tape os meus ouvidos ao clamor dos desvalidos, gente cansada de tanto sofrer. Que a minha percepção me alerte para o fato de que há muito mais além do meu gueto eclesiástico. (Sérgio Lima, escravo de Cristo por causa da Cruz, sem qualquer titularidade ou prestígio, apenas um escravo. Escravo alforriado, mas escravo).

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