Conceitos iniciais (1.1-2)
Conforme expusemos detalhadamente na introdução de 1Pedro (veja aqui), a carta se dirige a judeus crentes que viviam na dispersão (diáspora). Em duas passagens ele distingue claramente esses judeus crentes dos gentios (1Pedro 2.12; 4.3). A seguir, lemos os primeiros dois versículos:
“Pedro, apóstolo de Jesus Cristo, aos eleitos de Deus, peregrinos dispersos [grego, diaspora] no Ponto, na Galácia, na Capadócia, na província da Ásia e na Bitínia, escolhidos de acordo com o pré-conhecimento de Deus Pai, pela obra santificadora do Espírito, para a obediência a Jesus Cristo e a aspersão do seu sangue: Graça e paz lhes sejam multiplicadas.”
O conceito de “pré-conhecimento” aparece também em Deuteronômio 31.21 e em Romanos 8.29-30. O texto não declara que tenham sido predestinados por seleção, mas que foram selecionados segundo o pré-conhecimento de Deus. É diferente. Deus viu desde a eternidade a conversão deles e então já determinou que seriam salvos em função do ato redentor de Jesus.
A consciência de ser eleito constitui um grande consolo em tempos de sofrimento, perseguição ou tribulação. Saber que não se está entregue ao destino ou ao acaso, mas que se foi eleito para um objetivo grandioso e uma causa definida. No mundo, os crentes são corpos estranhos ou estrangeiros, mas para Deus são eleitos. Às vezes sentimos que estamos na “diáspora”, abandonados, isolados e excluídos. Mas a promessa de ter sido eleito pelo Pai para o seu reino é um forte encorajamento para não desanimarmos. É como se o Senhor falasse conosco no meio do nosso sofrimento e nos dissesse: “Você me pertence!”.
Aqueles judeus crentes também não integram mais apenas o povo da antiga aliança, que, segundo os versículos 10-12, recebeu profecias referentes ao Messias vindouro e vivia na expectativa desse tempo. Eles pertencem àqueles para quem aquele tempo se cumpriu. O Messias os transferiu do seu estado anterior sujeito à lei para um estado completamente novo.
Jesus realizou algo melhor. Ele promoveu os crentes para a posição pessoal de filhos que ele adquiriu para o seu povo “de acordo com o pré-conhecimento de Deus Pai”.
A consciência de ser eleito constitui um grande consolo em tempos de sofrimento, perseguição ou tribulação.
Afinal, Pedro escreve para judeus crentes na diáspora, não ao povo de Israel como tal, mas a indivíduos que passaram por uma conversão pessoal a Jesus. Para eles, Deus se tornou Pai. Há um aspecto muito especial no fato de Pedro iniciar sua carta dessa maneira. Embora Israel conhecesse sua posição de filho como povo, o israelita individual não podia chamar Deus de seu Pai. Agora, porém, Jesus lhes conquistou essa posição.
“Pela obra santificadora do Espírito.” Cada um deles tinha passado pela santificação (separação) no Espírito Santo. Eles não estavam mais separados por estatutos e cerimônias que deveriam ser cumpridos, mas experimentavam aquilo que Jesus expusera a Nicodemos: “Digo a verdade: Ninguém pode entrar no Reino de Deus se não nascer da água e do Espírito. O que nasce da carne é carne, mas o que nasce do Espírito é espírito” (João 3.5-6).
Eles tinham então nascido de novo por meio do Espírito Santo, tendo-se tornado filhos de Deus e com isso separados (santificados), conforme Pedro explica nos versículos 3-4.
“Para obediência a Jesus Cristo e a aspersão do seu sangue.” Por que a obediência é citada antes da aspersão com o sangue de Jesus? Porque essa é a sequência da ação do Espírito Santo. O Espírito Santo impele a Jesus e gera obediência na fé, proporcionando então o novo nascimento, mencionado a seguir no versículo 3. Esses judeus, a quem a carta era dirigida, realizaram o passo de obediência da aspersão do Antigo Testamento por meio do sacrifício de animais para a aspersão com o sangue de Jesus, o que os purificou inteiramente. Decidiram-se pelo Messias, por seu sacrifício e sua obra redentora e assumiram para si sua salvação. Portanto, a sequência é:
- o Espírito Santo impele a Jesus (separa);
- passa-se à obediência pela fé (conversão);
- o sangue de Jesus passa a atuar (perdão); e
- a pessoa nasce de novo (novo nascimento).
“Graça e paz lhes sejam multiplicadas.” Pela graça eles foram salvos por meio de uma ação conjunta da Trindade divina:
- eleitos pelo Pai;
- santificados pelo Espírito;
- aspergidos com o sangue de Jesus.
O resultado é paz (shalom); antes de tudo, paz com Deus, mas também paz na própria alma.
Pedro lhes deseja que essa graça e a paz dela resultante sejam multiplicadas para eles, que continuem a acompanhá-los e os firmem cada vez mais no Senhor. Eles não deverão mais recorrer àquilo que passou, mas preservar o novo e progredir nele. Um bom médico não lembrará continuamente ao paciente seu estilo de vida mórbido – disso se terá falado detalhadamente antes do tratamento, mas então segue um novo caminho terapêutico, e um bom médico tratará de apenas fazer o paciente avançar nele, encorajando-o nesse sentido.
Somente a graça com que sua vida espiritual começou pode levar você adiante, e só assim a paz se tornará permanente em seu coração.
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