Daniel Lima – Ai dos que chamam ao mal bem e ao bem, mal…
Ai dos que chamam ao mal bem e ao bem, mal…
Poucos contextos são mais passionais do que a política e a fé. Basta observar as discussões sobre o documentário Democracia em Vertigem. Há comentários exaltando este como o filme mais honesto deste século e outros acusando-o de ser mais uma farsa da esquerda. O mais curioso é a intensidade e as frases manipulativas que ambos os lados usam. Se eu fosse crer apenas nos argumentos apresentados em cada artigo, certamente ficaria convencido tanto de uma posição como da outra. No final, fico confuso com dados lançados com tanta certeza e tão frontalmente opostos.
Nestas últimas semanas temos assistido mais um debate intenso em torno do programa lançado pelo Ministério da Saúde e pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos combatendo a gravidez juvenil. A campanha se baseia no tema “Adolescência primeiro, gravidez depois”. Mesmo antes de ser lançada, a campanha foi combatida por várias organizações. A principal acusação é contra a possível promoção da abstinência sexual durante a adolescência. Os proponentes se defendem declarando que todos os métodos contraceptivos continuarão a ser promovidos, mas que entendem que uma campanha contra a sexualização infantil também tem seu lugar neste esforço.
Eu tirei um tempo para examinar as acusações contra a campanha. Li vários artigos, das opiniões mais diversas. A única base razoável que encontrei para as críticas é de que programas assim não funcionam. Os que criticam o programa indicam casos em que projetos semelhantes não tiveram qualquer impacto sobre o problema; os que defendem a campanha indicam casos em que programas exatamente assim têm trazido resultados significativos.
O que mais me chocou é uma ideia subjacente que, ao invés de promover responsabilidade, parece ser profundamente fatalista. Em alguns artigos o eixo da argumentação parece ser que é impossível para um adolescente não se envolver em atividade sexual. Os argumentos de que o Brasil é um dos países com maior índice de gravidez infantil (casos com meninas de 10, 11 e 12 anos) parecem ser minimizados ou considerados inevitáveis. É como se músicas que promovem sexo com “as novinhas” não existissem ou fossem algo natural, fruto da liberdade de expressão. A conclusão é: já que os adolescentes (e pré-adolescentes) vão continuar na prática sexual, devemos pelo menos cuidar para evitar a gravidez.
Jesus disse: “E conhecerão a verdade, e a verdade os libertará”.
Então a atividade sexual de crianças pré-púberes é normal ou inevitável? Então a melhor opção é instruí-los em métodos contraceptivos? Desistimos de lutar por um padrão, que além de moral é também de saúde pública? Ignoramos os inúmeros estudos que afirmam que a atividade sexual nesta faixa é prejudicial, especialmente para as meninas, já que seus parceiros masculinos são em geral adultos? Será que uma posição ideológica e contra qualquer ação deste governo se sobrepõe ao bem-estar destas milhares de meninas? Estes não são casos isolados. Uma pesquisa da BBC aponta que entre 2005 e 2015 houve mais de 300 mil partos de meninas entre 10 e 14 anos.
No momento em que uma sociedade se nega a chamar o mal de mal e o bem de bem, existe pouca esperança para seu futuro. Na verdade, Isaías 5.20 descreve esta situação com um grave alerta:
“Ai dos que chamam ao mal bem e ao bem, mal, que fazem das trevas luz e da luz, trevas, do amargo, doce e do doce, amargo!”
A atividade sexual de pré-adolescentes de 10 a 14 anos é um mal em nossa sociedade. É um mal que precisa ser atacado e deve ser combatido – não apenas medicado. É um mal que atinge em sua maciça maioria meninas vulneráveis em questões de educação, poder aquisitivo e amparo familiar. Enquanto não chamarmos o mal de mal, vamos ficar contemporizando, vamos ficar medicando um problema que é basicamente moral. Várias instituições apontam para o fato de que a maioria das meninas que engravidam nesta faixa etária foram submetidas a estupro ou abuso sexual. Como podem estas mesmas organizações criticar uma campanha que, além de fornecer preservativos e informar sobre métodos contraceptivos, busca adiar o início da atividade sexual?
Não faço ideia se esta campanha terá resultados concretos. Pessoalmente espero que sim. Se for a única ação, seu resultado certamente será mínimo. No entanto, devo dizer que devemos afirmar a verdade, mesmo que não traga resultados imediatos tão palpáveis. Se sonhamos com uma cultura mais protetora de suas crianças e adolescentes vulneráveis, precisamos cultivar a verdade. A verdade é que a pré-adolescência não é uma etapa para iniciar a atividade sexual. A verdade é que a atividade sexual traz consigo responsabilidades. Esperar que uma adolescente tenha, em nossos dias, o equilíbrio emocional, econômico e profissional para cuidar de um recém-nascido é tolice. Some-se a isso a realidade de que os pais destas crianças, além de adultos, em geral não participam dos cuidados das mesmas.
Mais uma vez, as palavras de Jesus nos trazem luz ao debate: “E conhecerão a verdade, e a verdade os libertará” (João 8.32).
Minha oração é que esta campanha alerte a população para a irresponsabilidade com que temos tratado desta questão. Oro para que se levante uma geração neste país onde responsabilidade seja um valor maior que o prazer. Uma sociedade onde meninas pré-adolescentes possam amadurecer com todas as oportunidades que puderem ter.
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