Quando pecado chama pecado em nossas vidas
Esta semana ouvi no rádio uma notícia sobre a prisão de uma tesoureira de certa cidade pequena (cerca de 50 mil habitantes) no interior de São Paulo. Esta notícia em si já não nos causa mais surpresa. O que me surpreendeu é que foi descoberto que ela desviou nove milhões de reais da prefeitura. Na hora eu achei que havia ouvido errado, mas fui verificar e realmente a quantia do desvio é de nove milhões. Comecei a pensar: o que leva uma pessoa a não apenas desviar dinheiro, mas chegar a esta quantia (para mim) astronômica?
Eu entendo a ganância e luto para que esta não se instale em meu coração. Entendo pessoas que abrem mão de princípios e começam a tomar posse do que não lhes pertence. Talvez movidos por um senso de terem sido injustiçados, talvez por uma necessidade, talvez por ver tanta impunidade, o fato é que pessoas desviam dinheiro com muita frequência. Não estou justificando! Estou apenas reconhecendo que nosso coração pecaminoso pode, sim, nos levar a cometer pecados muito semelhantes. No entanto, permaneço surpreso com a quantia desviada de uma pequena cidade. Isso traz à tona a pergunta: como é que ela chegou a roubar tanto?
Podemos pensar que pecar é liberdade, mas na realidade é escravidão. Esta escravidão começou a vários passos atrás.
Quem começa roubando dez reais de troco passa a se aproveitar de outras situações e eventualmente pode adulterar notas e recibos, fazer “acordos” lucrativos… talvez chegando ou passando dos nove milhões ou mais. A questão é de princípio e tolerância. No momento que abro mão de um princípio (vou pegar o que não me pertence), minha tolerância vai sendo expandida gradativamente.
Este processo não se aplica apenas aos incrédulos e aos criminosos mais terríveis. Na verdade, você e eu passamos pelo mesmo processo. Na hora que abrimos mão de um princípio nunca sabemos até que ponto vamos chegar. O que limita a extensão de nosso pecado é unicamente a oportunidade.
A história do adultério de Davi com Bate-Seba é talvez a melhor ilustração deste processo na vida de uma pessoa. O relato está no capítulo 11 de 2Samuel. Nesta passagem vemos, passo a passo, a progressão do pecado de Davi:
- Desobediência passiva – “Na primavera, época em que os reis saíam para a guerra, Davi enviou para a batalha Joabe com seus oficiais e todo o exército de Israel; e eles derrotaram os amonitas e cercaram Rabá. Mas Davi permaneceu em Jerusalém” (verso 1). Na época em que os reis saíam para a guerra, Davi permaneceu em Jerusalém. Por que ele ficou? Não por ser um pacifista – ele inclusive enviou seu general e seus guerreiros para a guerra. Com muita frequência o pecado começa quando deixamos de fazer algo que é esperado de nós. Evitamos nossas responsabilidades, o que significa desobediência, e eu creio que este passo já abre uma porta para o pecado.
- Indolência – “Uma tarde Davi levantou-se da cama e foi passear pelo terraço do palácio” (verso 2a). Além de evitar suas responsabilidades, Davi se entregou a uma vida de descanso e conforto. Não há nada errado em deitar-se de tarde, mas era a época das guerras. Davi já havia evitado a batalha e ainda por cima deitava-se de tarde e levantava-se para passear. É impressionante que, quando não cumprimos o que devemos, podemos até imaginar que vamos aproveitar o tempo de forma produtiva, mas com frequência nos dedicamos à inatividade. Dedicamo-nos à busca do prazer e do conforto.
- Dar espaço ao pecado – “Do terraço viu uma mulher muito bonita tomando banho, e mandou alguém procurar saber quem era” (versos 2b e 3a). em sua busca por conforto e prazer, ele viu uma bela mulher tomando banho. Não sabemos se a atitude de Bate-Seba era adequada ou não, mas sabemos que Davi viu a mulher e ao invés de desviar seu olhar ele percebeu que a mulher era muito bonita. Sua mente não parou aí, pois já estava propensa ao pecado – ele perguntou quem era ela. Quando estamos caminhando em desobediência (e, lembre-se: não existe desobediência inocente), nosso coração está aberto aos truques do pecado. Assim, quando nossos olhos (ou ouvidos) são atraídos por algo que não nos pertence, damos um passo a mais e passamos a cobiçar aquilo.
- Pecado concretizado – “Davi mandou que a trouxessem e se deitou com ela” (verso 4a). Neste ponto o pecado já foi concretizado. Qualquer desculpa ou justificativa é abandonada e Davi faz o que sabe estar errado. Nesse momento, quando já demos vários passos anteriores, temos a sensação de que o pecado é mais forte do que nós. Jesus afirma que aquele que vive pecando é “escravo do pecado” (João 8.34). Podemos pensar que pecar é liberdade, mas na realidade é escravidão. Esta escravidão começou a vários passos atrás. Quando um filho de Deus caminha continuamente em desobediência, suas defesas contra o pecado – que é a comunhão com o Espírito – vão sendo enfraquecidas; no fim, quando o pecado em si se apresenta, encontra o cristão fraco demais para resistir…
- Tentar ocultar o pecado – Os versos 6-13 descrevem Davi usando de artimanhas com o marido de Bate-Seba para que este tivesse relações com sua esposa e assim seu pecado ficasse oculto. É impressionante que, uma vez que o pecado está para ser descoberto, a primeira reação de muitos de nós é ocultar e negar ele. É como se, por meio da mentira, pudéssemos enganar o próprio Deus. Esta ocultação tem dois efeitos na vida do cristão: (1) o faz viver com a mentira, que é sempre oriunda do Diabo; e (2) faz com que a escravidão do pecado continue, pois o problema não foi tratado.
- Envolver-se em outros pecados – Quando tudo falha, Davi escreve ao general: “Ponha Urias na linha de frente e deixe-o onde o combate estiver mais violento, para que seja ferido e morra” (verso 15). Não sabemos o que o Senhor teria feito se Davi tivesse se arrependido. O que sabemos é que ele, tendo falhado em ocultar seu pecado, comete outro. Esta história ilustra de forma muito clara o processo do pecado na vida do cristão. Se não confessarmos os nossos pecados continuaremos escravizados, e o Diabo nos levará a cometer mais e mais pecados. A libertação vem pela verdade e não pelo engano (1João 1.9; João 8.31-32)
No papel de irmão em Cristo, deixe-me exortá-lo(a) de que não somos tão diferentes da funcionária pública da história acima. Na verdade, Davi, que foi chamado “homem segundo o coração de Deus”, deixou-se levar e envolveu-se não só em adultério, mas também em assassinato. Deus o perdoou diante de seu arrependimento, mas ele ainda sofreu as consequências. Oro para que você e eu não tenhamos de sofrer as consequências, que não envergonhemos o nome do Senhor; pelo contrário: andemos como sábios e cuidemos para não cair. Que nossa vida seja como um suave aroma de louvor ao nosso Deus!
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