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Patativa

Patativa, em 2017, na sua festa de 80 anos. Foto: Daniel Moraes.

Em outubro de 2017, quando eu ainda batia ponto na redação do jornal O Imparcial, um colega me deu a dica: “Tá chegando o aniversário da Patativa. Tu podia fazer uma entrevista com ela.” Gostei da sugestão. Peguei o telefone – o fixo, como os antigos faziam – e disquei o número da sambista. Do outro lado da linha, Patativa, que nunca tinha ouvido falar deste repórter, foi de uma generosidade tocante. Não só topou a conversa, como também me convidou para a sua festa de aniversário. “Vem quinta-feira, que é meu aniversário, aí tu aproveita e toma um negocinho.” No dia marcado, o carro do jornal me levou ao seu endereço da rua Castelinho, na Vila Embratel. Eram os 80 anos de Patativa, cantora e compositora de sambas (mas não só) inesquecíveis, que morreu na semana passada, aos 87 anos de idade.

Naquele outubro de 2017, tive o privilégio de passar o dia na casa de Patativa. Entrevista, mesmo, não consegui. Ocupada com o papel de anfitriã, e de guardiã do mocotó que a sua filha Vanda servia sem medo aos convidados, Patativa não queria perder tempo respondendo às minhas perguntas. “Eu não confio em nenhum de vocês dessa raça de jornalista. Todos vêm aqui, indagam tudo sobre minha vida, querem saber até em que posição eu gosto de trepar, se eu rebolo, e depois não trazem nenhum jornal pra mim”, ela disparou em dado momento.

É claro que não era bem assim.

Apesar da resistência em parar para me responder, Patativa parecia satisfeita com a minha presença; e certamente estava feliz com o reconhecimento – tardio, é verdade – que o seu trabalho artístico vinha recebendo da imprensa desde o lançamento do seu primeiro disco (Ninguém é melhor do que eu), em 2014, quando já tinha 77 anos de idade. Na parede da sala, disputando o pequeno espaço com objetos de decoração, três recortes de jornal emoldurados, contendo matérias sobre ela, estavam orgulhosamente expostos.

Mesmo assim, não insisti com a entrevista. Cheguei à conclusão de que o mais interessante seria escrever sobre o que vi e ouvi no aniversário de 80 anos da sambista maranhense. A partir daí, passei a me comportar como mais um convidado (o que, de fato, eu era). Tomei cerveja, o “grelo da nega” (uma bebida preparada por Patativa que lembra muito o sabor de uma caipirinha); aceitei sem pudor os pratos de mocotó e feijoada que Vanda me oferecia, cantei junto as músicas da aniversariante que iam sendo tocadas, uma atrás da outra, na roda de samba que se formou no quintal da casa.

Entre um gole e outro, conseguia extrair algumas tiradas de Patativa, como uma sobre a noite em que ela saiu com quatro troféus debaixo do braço do Prêmio Universidade FM, em 2014. “Eu doida pra tomar uma dose de Campari, que colocaram pra mim perto da cadeira onde eu estava sentada, e não paravam de me chamar no palco. Ficavam toda hora me dando prêmio, mas eu queria saber mesmo era se ia ganhar algum envelope com dinheiro.” Esses registros, e tudo mais o que pude observar, me ajudaram a compor o texto que foi publicado no dia 9 de outubro de 2017, com o título: “80 anos de Patativa: a diva do samba”.

Exceto pela personagem central, a reportagem tem pouco valor. O espaço limitado da página de jornal e a minha inexperiência culminaram em um texto difuso, meio sem pé nem cabeça, que nem de longe faz jus à grandeza de Patativa – mas que fiz questão de levar para ela depois de publicado, como eu havia prometido durante a festa. Gosto de pensar que, por algum tempo, ele também decorou a parede da sua sala.

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